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Direito e Economia – perspectivas da interdisciplinaridade

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Apresentação em tema: "Direito e Economia – perspectivas da interdisciplinaridade"— Transcrição da apresentação:

1 Direito e Economia – perspectivas da interdisciplinaridade
Maria Tereza Leopardi Mello IE – UFRJ (aula de 02/04/2013)

2 Direito & Economia – o mundo real X o mundo normativo
1. Introdução 2. O mundo normativo do Direito. 3. O mundo sem instituições dos economistas; 4. O que é interdisciplinaridade? existe um objeto próprio da pesquisa em direito-e-economia? 5. Linhas de investigação e abordagens possíveis. Pretendo tentar identificar as diferenças entre as perspectivas jurídica e econômica de análise Objetivos: alimentar o debate, procurando identificar dificuldades de trabalho interdisciplinar – ensino e pesquisa. A partir desse mapeamento + minha experiência, discutir: em que consiste a interdisciplinaridade; Linhas de investigação possíveis Correntes teóricas que tratam da questão (vamos estudar algumas delas...)

3 1. Introdução: a questão da pesquisa interdisciplinar
O que é interdisciplinaridade? Consiste na construção de um objeto de estudo que não pode ser tratado adequadamente com os instrumentos de análise de cada disciplina separadamente. É, portanto, mais do que duas perspectivas paralelas sobre o mesmo assunto. É útil para abordar objetos que não possam ser satisfatoriamente estudados dentro de cada recorte disciplinar, separadamente Disciplinas – perspectivas aplicáveis ao mesmo objeto, que implicam focar mais precisamente um ou outro aspecto do mesmo evento, priorizando ou descartando questões de análise. Disciplinas permitem ganhos de especialização e desenvolvem instrumentos de análise adequados para lidar com as questões que são por ela focalizadas e priorizadas; portanto, os instrumentos de análise são adequados a determinadas funções (e não a outras …) Mas o trabalho interdisciplinar requer que se superem os obstáculos epistemológicos decorrentes dos diferentes níveis de análise ...

4 Em D&E: dificuldades da pesquisa interdisciplinar estão relacionadas principalmente a
diferenças nos planos de análise do Direito e da Economia delimitação do objeto das duas disciplinas

5 Direito e Economia – diferentes planos de análise
- O estudo do direito se preocupa com o significado normativo logicamente correto que deve corresponder ao enunciado verbal da norma, investigando o sentido dos preceitos que se apresentam como uma ordem determinante da conduta, estabelecendo-lhes o sentido lógico-formal e ordenando-os num sistema lógico sem contradições - a ordem jurídica, que se refere ao plano do dever-ser. - Ordem econômica diz respeito ao mundo dos acontecimentos reais, da distribuição de poder efetivo sobre bens e serviços e o modo pelo qual estes se empregam (Weber, 1964:251).

6 ... os diferentes planos de análise ....
Efeitos econômicos e sociais ocorrem no plano real - o plano dos acontecimentos reais das relações econômicas e sociais (Sociologia e Economia) - diferente do plano de análise do dever-ser (Direito).

7 A delimitação do objeto das disciplinas
O objeto da disciplina do Direito se restringe ao âmbito do estudo do mundo normativo, deixando de fora das preocupações jurídicas os acontecimentos do mundo real: Separa o objeto do direito de todos os elementos “não jurídicos”; Enfoque centrado nos problemas colocados pelas relações entre normas de um ordenamento jurídico: Unidade – Sistematicidade – Completude. O objeto da disciplina da Economia tem sido definido mais como método para explicar escolhas (de qualquer tipo ou natureza), com base em pressupostos comportamentais (racionalidade ilimitada, maximização de utilidade) e outros (equilíbrio). Instituições tratadas como variáveis externas. (…) the acceptance by economists of a view of human nature so lacking in content is of a piece with their treatment of institutions which are central to their work... One result has been that the crucial role of the law in determining the activities carried out by the firm and the market has been largely ignored. (Coase, 1988, p. 3-4) Coase aponta a falta de consideração com as instituições como fruto desse divórcio entre a teoria e seu objeto: “O consumidor não é um ser humano, mas um conjunto de preferências. A firma ..., é ... definida como uma curva de custos e uma curva de demanda, e a teoria é ... a lógica da combinação ótima de preços e insumos. As trocas acontecem sem qualquer especificação de seu quadro institucional. Temos consumidores sem humanidade, firmas sem organização e, inclusive, trocas sem mercados.” (Coase, 1988: 03).

8 2. O mundo normativo do Direito
Separa o objeto do direito de todos os elementos “não jurídicos”; Enfoque centrado nos problemas colocados pelas relações entre normas de um ordenamento jurídico: Unidade – Sistematicidade - Completude Obstáculos relacionados à tradição normativista (dominante na formação de advogados), cujas preocupações centrais se cingem à análise de um ordenamento jurídico dotado de unidade, sistematicidade e completude. A formação tradicional de advogados é fortemente influenciada pela teoria kelseniana, que tenta identificar o Direito e o que é propriamente jurídico (o que é específico do Direito enquanto disciplina) separando-o de outras preocupações não jurídicas (embora com elas possa ter relações, mas relações interdisciplinares). O Direito, assim “purificado”, teria então o seu próprio método de análise.

9 2. O mundo normativo do direito - a delimitação do objeto da disciplina do Direito e suas implicações Produção de normas: Quais são as normas de um dt ordenamento jurídico? como as normas “entram” no ordenamento jurídico; quais os requisitos para que uma norma seja qualificada de jurídica; Condições de VALIDADE (HIERARQUIA) Aplicação das normas p/ solução de conflitos concretos e implementação de políticas públicas Interpretação (qual o sentido logicamente correto que deve corresponder a um enunciado normativo; COERÊNCIA entre normas de um mesmo ordenamento; COMPLETUDE do ordenamento (capacidade de dar respostas a todos os conflitos). As preocupações características da análise jurídica: - Os processos pelos quais as normas “entram” no sistema jurídico - quais são as normas de um sistema; - Os processos pelos quais as normas são aplicadas - por outro, qual o sentido logicamente correto que deve corresponder ao enunciado verbal de uma norma, considerada em suas relações com outras normas do sistema.

10 aspectos do mundo real que não são incluídos no âmbito disciplinar, porque não puramente jurídicos: Processo de produção de normas jurídicas Processo de aplicação das normas jurídicas Efeitos da aplicação das normas: - os destinatários se comportam cf. as normas? - há eficácia substantiva? - as normas jurídicas afetam decisões dos agentes econômicos? Análise do processo decisório que leva à criação de normas: interesses contemplados; legitimidade dos detentores do poder normativo, etc.

11 2.1. Premissas Legitimam a obrigatoriedade de obediência ao sistema jurídico por todos os cidadãos submetidos ao poder soberano, sem questionar seu conteúdo - o respeito às normas é um bem em si mesmo, e é isso que caracteriza a racionalidade formal Lei - produto da vontade geral - malgrado todos os problemas colocados pelo sistema representativo, refletiria uma decisão da maioria que, por definição, defini um objetivo de interesse geral/público (Rousseau: a vontade geral não erra...) Legislador racional (adequação de meios a fins) – e também onisciente e onipotente. Onisciente: porque sabe o que é melhor para o interesse público; “o legislador” tem conhecimento suficiente (informação ilimitada?) para poder identificar o que é realmente de interesse público. b) essa premissa embute, no fundo, uma outra: a de que “o legislador” é não apenas racional, racional: porque sabe também, qual o melhor meio para alcançar seus objetivos de interesse público; adequação de meios a fins. Q: é possível definir o que seja um interesse público? Q: é possível/desejável substituir o sistema democrático representativo? ele está em crise? - legislador racional; racionalidade ilimitada? (não se questiona se meios são adequados aos fins a que a lei se propõe) OBS: não se questiona porque se devem cumprir as normas

12 2.2. Relação entre normas de um ordenamento jurídico
UNIDADE - construção escalonada do OJ: normas superiores estabelecem limites - formais e materiais - às inferiores, cuja observância é condição de validade. Respeito à hierarquia garante a unidade do OJ: entre a norma mais superior e a mais inferior há uma cadeia de comandos sucessivos. O sistema/ordenamento – problemas das relações entre normas ... Como as normas entram no OJ? a questão da unidade diz respeito a como são criadas as normas qualificadas de jurídicas: quais os requisitos para que se considerem válidas (e portanto, vigentes) uma determinada norma. Ou: para que se considere que uma determinada norma pertence ao ordenamento. Ordenamento Jurídico - composto de diversas normas feitas por diferentes fontes de poder normativo, com relações de hierarquia entre si. Temos, então: - normas de conduta; - normas de estrutura: regras a serem seguidas para criar novas normas As diferentes fontes de poder normativo estão em relação hierárquica – a inferior é limitada pelo superior; daí a idéia de uma construção escalonada do OJ: A norma inferior “executa” os comandos da sua superior (poder), ao mesmo tempo em que “produz” a norma inferior (poder), de modo que entre a mais inferior e a mais superior de todas possa ser traçado uma linha contínua de comandos ....(é o que garante a unidade) Quando se produzem novas normas, deve-se obedecer a limites formais e materiais: - formais: dizem respeito aos procedimentos a serem seguidos para a produção normativa; - materiais: conteúdo que pode ser regulado por determinada instância de poder. A obediência a tais limites é condição de validade das normas. Nesse sentido, o OJ regula a própria produção normativa. O respeito à hierarquia garante a unidade do ordenamento jurídico (pode-se ligar a norma mais inferior à mais superior, numa cadeia de comandos sucessivos). É por isso que toda análise jurídica constuma começar pelos fundamentos constitucionais ....

13 Relação entre normas ... COERÊNCIA - as normas devem ser compatíveis; antinomias devem ser solucionadas por critérios conhecidos ex ante: - hierárquico; - cronológico; - especialidade. OBS: Condição para certeza jurídica. OJ deve ser sistemático, i. e., as diversas normas devem ser coerentes/compatíveis entre si; não se admitem antinomias (uma situação na qual uma norma não pode ser aplicada sem ferir uma outra norma do sistema). Critérios para solução de antinomias: a) hierárquico: prevalece a norma emanada de instância normativa superior; b) cronológico: norma posterior prevalece sobre a anterior; c) especialidade: norma específica prevalece sobre a mais geral. OBS: a existência de regras claras e não contraditórias é condição para certeza jurídica e estabilidade das relações sociais; logo, antinomias devem ser solucionadas.

14 Relação entre normas ... COMPLETUDE - todos os conflitos precisam de uma resposta judicial; não deve haver lacunas. Critérios para integração de lacunas: - analogia; - eqüidade; - princípios gerais de direito, etc. todos os conflitos devem poder ser resolvidos conforme a ordem jurídica; portanto, não deve haver lacunas no ordenamento. Nenhum conflito pode ser excluído da apreciação pelo Judiciário. Critérios para integração de lacunas: analogia; princípios gerais do Direito etc. OBS: todos os conflitos devem ser dirimidos na forma da lei, i. e., devem ter uma solução jurídica; portanto, lacunas eventualmente existentes devem ser preenchidas

15 2.3. Implicações do normativismo ...
Isolamento do Direito das outras ciências sociais: a cultura jurídico-formalista predominante associa o direito a uma construção racional de normas por um legislador idealizado, do que resulta uma ciência jurídica sem sociedade ao lado de ciências sociais sem direito (Kirat & Serverin, 2000:06). Molda a forma pela qual se colocam – e se priorizam – os problemas de pesquisa; exclui certas preocupações do âmbito de análise disciplinar. aspectos do mundo real ficam necessariamente de fora da análise disciplinar. O problema não está no recorte analítico (que sempre deixa alguma coisa de fora da análise), mas na concepção de que abordagens não jurídicas não importam para o trabalho do jurista e que os fatos sociais estão fora de seu campo “científico”(Faria & Campilongo, 1991:34).

16 A resistência a incorporar a análise de efeitos reais às análises jurídicas – um exemplo
D. Dallari comenta a decisão do STF numa Ação Direta de Constitucionalidade que discutiu a MP que estabelecia medidas para racionamento de energia elétrica, em 2001: “ Outro ponto ... que exigia análise jurídica rigorosa, era a ameaça inconstitucional de suspensão do fornecimento de energia elétrica, caso não atendidas as exigências de redução do consumo Essa ameaça ofende a exigência constitucional de continuidade do serviço ... .” Essas e outras ameaças de afronta à Constituição não teriam sido, cf. o autor, consideradas nos argumentos dos julgadores. “... Um dos ministros argumentou que havia o risco de o povo parar de economizar energia se soubesse que a exigência do governo era inconstitucional. Seu voto foi baseado nesse fundamento, que nada tem de jurídico e não enfrenta a questão da constitucionalidade.” Exemplos de resistência a considerações s/ a realidade ....Dalmo, Declarações de Gilmar Mendes, s/ Uso de algemas; s/ Lei da ficha limpa: declaração de Gilmar Mendes tratou o Legislativo como se fosse o Judiciário (na sua visão): se pode ser adminssível uqe o juiz, quando julgue um caso, não possa se deixar influenciar pelo clamor popular, por outro lado, nada há de errado em o Congresso refletir os desejos da sociedade ... Ex. dos procuradores de órgãos públicos

17 “Outro ministro, também favorável ao desejo do governo, recorreu a uma confusa argumentação, ...., para concluir que a imposição de penalidades ao povo ajudaria a economizar energia. Nada sobre a constitucionalidade. Dallari, D., “Suprema Indecisão”, artigo publicado na Folha de São Paulo, 15/07/2001, p. A-3.

18 ... O normativismo ... Isolamento do direito das outras ciências sociais + Confusão entre prática profissional e atividade acadêmica O trabalho acadêmico não se diferencia muito do modelo de parecer, em que se selecionam argumentos úteis à sustentação de uma tese conveniente para a defesa de uma posição, assumida a priori. (Nobre, 2003) O viés normativista, embora não seja o único, certamente contribui para o isolamento do direito em relação às demais disciplinas das ciências humanas (v. a respeito, Nobre, 2003); há fatores históricos que agravam esse problema no Brasil. Adicionado à peculiar mistura entre prática profissional e pesquisa acadêmica, configuram dois fatores que explicam a pouco desenvolvimento da pesquisa em direito no Brasil, no diagnóstico de M. Nobre

19 A lógica que orienta a elaboração de um parecer não analisa todo material disponível, mas apenas a porção que interessa à tese defendida. “O parecer não procura, no conjunto do material disponível, um padrão de racionalidade e inteligibilidade para, só então, formular uma tese explicativa, o que seria ... o padrão e o objetivo de uma investigação acadêmica no âmbito do direito [A] resposta vem de antemão: está posta previamente à investigação”. (Nobre, 2003:150)

20 Implicações: Ausência de critérios de cientificidade das análises jurídicas; Ausência de referencial analítico para tratar de problemas do mundo real Daí a importância da abordagem interdisciplinar: o Direito não desenvolveu instrumentos adequados para a análise de problemas do mundo real. Por isso, não basta passar a notar a realidade se, ao fazê-lo, o jurista continua usando o referencial analítico jurídico. - Tendência a reproduzir a sua retórica e os argumentos de autoridade em seara alheia. - juristas de formação tradicional não estão capacitados para entender/ “digerir” os conhecimentos de outras matérias não jurídicas. - a falta de trato com os problemas do mundo real é uma lacuna na formação jurídica que não é suprida apenas com boa vontade ou posturas progressistas (v. exemplos – de teses jurídicas policamente engajadas...) - questão metodológica - o método influencia a delimitação do próprio objeto, no sentido de que aspectos do mundo real ficam necessariamente de fora da análise disciplinar. Observar diferença (pode parecer sutil, mas é fundamental): qualquer recorte de uma disciplina delimita o objeto que lhe é próprio e deixa de fora muita coisa: isso não significa que outros aspectos – econômicos, políticos, sociológicos – sejam irrelevantes e tampouco que não se devam conhecê-los. V. crítica à simplificação da teoria pura do direito citada por Eros Grau. O problema é achar que o mundo real não interessa aos operadores do direito ... ou aos juristas “acadêmicos”

21 O que pode ser a pesquisa acadêmica em direito?
Ampliar o conceito de dogmática (Nobre, 2003:151) e buscar entender como ocorre efetivamente a operação do direito, o que engloba: - o entendimento das normas (seu sentido lógico); - o conhecimento dos tipos de ações para defesa dos direitos (questão de direito processual); - a interpretação dominante nos Tribunais (pesquisa empírica de jurisprudência) e na “doutrina” (pesquisa bibliográfica); - outras informações relevantes, como por exemplo, tempo de demora das soluções judiciais, possibilidades de recurso à arbitragem etc. (pesquisa empírica). De modo que os pontos de vista sociológico, histórico, antropológico, filosófico ou político não lhe sejam exteriores (à dogmática), mas sim momentos constitutivos da investigação dogmática Em suma: “o direito” não é só um enunciado normativo, mas todo o sistema de implementação de que resulta um sentido normativo real; Assim, interessa conhecer o processo real de enforcement das normas e o resultado efetivo de sua aplicação Ex. não posso dizer que tal ou qual interpretação é dominante, se não fizer um levantamento exaustivo (científico) da jurisprudência, numa época e local determinados.; Não posso dizer que um direito existe apenas por que ele é enunciado em lei, se, na prática, as dificuldades de implementá-lo são tantas que ele é tido como inexistente. (observar que, na realidade, pode haver graus de eficácia de um direito, coisa que soaria estranha no Direito).

22 3. A economia sem instituições
Instituições vistas como variáveis extra-mercado, que, no máximo, importariam como constrangimentos externos. Falta de entendimento sobre a historicidade da norma (Arida, 2005): o pensamento econômico é capaz de analisar o efeito da norma sobre a vida econômica bem como sua evolução “... como adaptação às vicissitudes da vida econômica ou como resultante da ação de grupos de interesse; não é, no entanto, capaz isoladamente de compreender a evolução da norma quando decorrente de dinâmicas normativas ou internas ao próprio sistema jurídico.” (Arida, 2005: 61). O lado da economia – tb há dificuldades de entendimento de elementos jurídicos..., Apesar da vantagem que os economistas tem de enxergar as leis como sistemas de incentivos e considerar seus efeitos no mundo real. Lacuna do pensamento econômico sobre o Direito, particularmente quando se trata de fundamentar propostas de políticas econômicas (cf. Arida) - historicidade da norma, entendida como o modo de ser da norma no mundo histórico, incluindo não apenas como a norma evoluiu historicamente, mas como poderia vir a evoluir em circunstâncias diferentes: “O pensamento econômico encontra dentro de seu próprio movimento os conceitos que lhe permitem captar o efeito da norma sobre a vida econômica; é também capaz de entender a evolução da norma como adaptação às vicissitudes da vida econômica ou como resultante da ação de grupos de interesse; não é, no entanto, capaz isoladamente de compreender a evolução da norma quando decorrente de dinâmicas normativas ou internas ao próprio sistema jurídico.”

23 A delimitação do objeto da Economia
Economia como teoria das escolhas – um método aplicável a objetos de qualquer natureza. Pressupostos - racionalidade ilimitada, maximização de utilidade, equilíbrio. Instituições tratadas como variáveis externas. Análise econômica dos determinantes das escolhas dos agentes se dá num vácuo institucional. O homo oeconomicus concebido, em princípio, fora de qualquer contexto institucional. … (E)conomists have no subject matter. What has been developed is an approach divorced ... from subject matter. Indeed, since man is not the only animal that chooses, it is to be expected that the same approach can be applied to the rat, cat and octopus, all of whom are no doubt engaged in maximizing their utilities in much the same way as does man. (…) the acceptance by economists of a view of human nature so lacking in content is of a piece with their treatment of institutions which are central to their work... One result has been that the crucial role of the law in determining the activities carried out by the firm and the market has been largely ignored. (Coase, 1988, p. 3-4) Coase aponta a falta de consideração com as instituições como fruto desse divórcio entre a teoria e seu objeto: “O consumidor não é um ser humano, mas um conjunto de preferências. A firma ..., é ... definida como uma curva de custos e uma curva de demanda, e a teoria é ... a lógica da combinação ótima de preços e insumos. As trocas acontecem sem qualquer especificação de seu quadro institucional. Temos consumidores sem humanidade, firmas sem organização e, inclusive, trocas sem mercados.” (Coase, 1988: 03).

24 Coase identifica um divórcio entre a teoria e seu objeto: as unidades cujas decisões os economistas analisam não têm substância: “O consumidor não é um ser humano, mas um conjunto de preferências. A firma ..., é ... definida como uma curva de custos e uma curva de demanda, e a teoria é ... a lógica da combinação ótima de preços e insumos. As trocas acontecem sem qualquer especificação de seu quadro institucional. Temos consumidores sem humanidade, firmas sem organização e, inclusive, trocas sem mercados.” (Coase, 1988: 03). Em suma: firmas e mercados compõem a estrutura institucional do sistema econômico (são parte integrante desse sistema) e, como tal, afetam seu funcionamento. Coase (1988) – crítica à teoria econômica tradicional, que deixa as instituições fora de seu objeto de estudo: firmas e mercados compõem a estrutura institucional do sistema econômico e, como tal, afetam seu funcionamento.

25 Implicações ... Elementos privilegiados pela análise jurídica parecem não ter sentido relevante; Tendência à instrumentalização do Direito; Risco de desprezo pelos princípios democráticos; Uso de conceitos próprios, não necessariamente correspondentes aos jurídicos, ainda que digam respeito aos mesmos temas (problemas de tradução). Instrumentalização – direito seria um instrumento a ser livremente manipulado para a produção de determinados fins – ignorância de princípios e premissas importantes no funcionamento do sistema jurídico (em que o funcionamento de uma peça depende de outra/s) Mesmo quando preocupados com temas do mundo jurídico (como instituições, regulação, organizações, direitos de “propriedade” etc.) os economistas tendem a construir um corpo conceitual próprio que não necessariamente tem correspondência direta e clara com conceitos similares da área jurídica. literatura de direito-e-economia originada em países de Common Law- problemas adicionais, quando as análises se referem a institutos jurídicos que não apresentam correspondência direta com os institutos de nosso sistema jurídico. Chamo a isso problemas de tradução: Tradução do sentido de um termo usado no contexto de uma disciplina (muitas vezes uma linguagem técnica específica), para o contexto de outra; Tradução do sentido de um termo usado no contexto de um tipo de tradição e cultura jurídicas (Common Law) para outro tipo (civil law)..

26 ... Problemas de tradução ... (exemplos)
Regulação – a definição econômica se refere ao conteúdo e sentido da ação do Estado, e não à forma jurídica dessa ação. Numa perspectiva jurídica, a forma importa, e o primeiro esclarecimento a ser feito nesse tema é que não se deve confundir regulação com regulamentação (com a atividade do executivo que regulamenta a execução da lei). Dois exemplos comuns: regulação e “direitos de propriedade” ... Regulaçao: originado na literatura econômica;refere-se a qualquer tipo de intervenção do Estado no mercado, com objetivo de induzir os agentes econômicos a um comportamento gerador de eficiências, pelo qual o Poder Público substitui, em modos e graus variados, a decisão privada que seria condicionada apenas pelas “forças de mercado”, “limitando os graus de liberdade que os agentes econômicos possuem no seu processo de tomada de decisões” (Fiani, 1998). regulação independe da forma jurídica ou do instrumento normativo utilizado para intervir. difere de outras formas de intervenção estatal na atividade econômica como oferta de bens públicos mediante cobrança de taxas (tributos); oferta de bens (“comerciais”) por empresas estatais; formas indiretas de influenciar o comportamento dos agentes privados, mediante políticas de incentivos que usam instrumentos fiscais e creditícios, por exemplo (Chang, 1997).

27 Problemas de tradução ... (exemplos)
Property rights – direitos subjetivos (reais ou obrigacionais) aos quais corresponde um direito de ação. Direitos pessoais e reais têm tratamento jurídico diferenciado, comportando distintos tipos de ação judicial para suas respectivas defesas. Relevância econômica se refere aos efeitos da atribuição de direitos sobre o comportamento dos agentes econômicos e sobre o funcionamento dos mecanismos de mercado. Traduzir diretamente por direitos de propriedade pode provocar a impressão – para um jurista – que se trata de direitos reais Kirat : “... ‘direitos de propriedade’ como direitos subjetivos, socialmente reconhecidos, que se relacionam à fruição de um bem ou de um recurso, e não – necessariamente - à sua apropriação privada, que corresponde à categoria da ‘ownership’: podemos ter um direito a respirar um ar puro (um ‘property right’), mas não somos proprietários do ar que respiramos Para a Economia - importa que os direitos sejam efetivamente atribuídos, e não como se chega a isso (não os procedimentos necessários para se chegar a esse resultado real). Para o Direito: diferença entre direitos reais e pessoais importa: os mecanismos para correção de externalidades enquadram-se entre as regras da responsabilidade por danos, e não da propriedade. Na esfera da responsabilidade civil temos direitos obrigacionais e a ação judicial visa à reparação do prejuízo: a ofensa ao direito reconhecido se resolve em perdas e danos. Na defesa da propriedade (direitos reais) a ação judicial visa precipuamente ao cumprimento de obrigação específica – a restituição da coisa ao proprietário titular do direito ou impedir que terceiros turbem a propriedade (Kirat, 1999:65). Efeitos economicamente relevantes podem existir se (e na medida em que): a clara delimitação do direito e sua atribuição a um sujeito motiva uma conduta por parte de seu titular, no sentido de incentivá-lo a preservar o objeto do direito, tornando seu uso mais eficiente[1]; b) a delimitação facilita as trocas, já que faz diminuir os custos associados ao esforço para definir corretamente os limites do objeto do direito quando transacionado, ao mesmo tempo em que reduz a probabilidade de que diferentes percepções das partes sobre esse objeto levem a impasses na relação contratual; ademais, permite-se que se transacionem múltiplas dimensões de um mesmo bem ou ativo. transferibilidade - condição adicional que lhe dá valor propriamente econômico, já que numa economia de mercado um dos elementos que mais importam na valoração de bens e ativos é o grau de fluidez com que estes podem circular, trocar de titularidade, e portanto a própria liquidez de seus eventuais estoques.

28 4. Há espaço para integrar análise jurídica e econômica?
Sim, desde que se considere a ordem jurídica no seu sentido sociológico (um conjunto de motivações da conduta humana real) Trata-se de saber se e como as normas jurídicas afetam os comportamentos de agentes econômicos: o direito (enunciado normativo + realidade da sua implementação) pode (ou não) constituir uma motivação para a conduta humana real.

29 Ordem Jurídica – sentido jurídico X sentido sociológico
Em suma, notem a especificidade do enfoque jurídico: uma ordem jurídica (um conjunto de preceitos que se apresentam como obrigatórios para a conduta) pode ser estudada (focada) juridicamente ou sociologicamente. Do ponto de vista jurídico, interessa o estudo daquilo que vale como direito: uma norma jurídica que se apresenta como uma formação verbal específica, dotada de um sentido normativo. O estudo do direito se interessa pelo sentido logicamente correto dos preceitos que se apresentam como uma ordem determinante da conduta, ordenando-os num sistema lógico sem contradições (= ordem jurídica; esfera do dever-ser). Do ponto de vista sociológico, a questão diz respeito ao que de fato acontece na sociedade em razão de existir uma probabilidade de que os homens considerem subjetivamente válida uma determinada ordem e orientem sua conduta por ela (validade empírica). (Weber, (Parte II, Capítulo I: La economia y los diversos órdenes, §1.)

30 Pressuposto do estudo interdisciplinar
Superar diferenças de planos de análise (ser e dever-ser): relação entre ordem econômica e ordem jurídica só pode ser detectada se esta última deixar de significar apenas um conjunto de normas corretamente inferidas e for considerada em seu sentido sociológico, como um “complexo de motivações efetivas da atuação humana real” (Weber, 1964:252).

31 Foco da análise interdisciplinar direito-e-economia:
Elucidar a relação entre direito e ação social econômica, questionando se e como os agentes econômicos têm em vista as regras jurídicas em suas decisões Objeto: a ação (econômica) orientada pela representação da existência de uma ordem jurídica legítima (Weber). Nessa perspectiva, (da regra como motivação da conduta) coloca-se em questão o que de fato acontece na sociedade em razão de existir uma probabilidade de que os homens considerem subjetivamente válida uma determinada ordem e orientem sua conduta por ela.

32 Questões relevantes (eficácia)
(i) em que medida as ações do mundo real se devem à existência de normas jurídicas que as orientam; (ii) em que medida a existência de normas jurídicas é condição necessária (e/ou suficiente) para as ações reais, e (iii) se essas normas criam condutas regulares desejadas pelos tomadores da decisão normativa. Em outros termos, trata-se de abordar a questão da eficácia das normas jurídicas, mas numa dimensão substantiva, indagando-se por que, como e em que condições as normas constituem motivo de conduta regular dos agentes econômicos, cotejando os objetivos originariamente desejados pelo legislador com os resultados efetivamente gerados (Faria, 1993:97). Com isso, supera-se a mencionada falta de atenção aos efeitos reais das normas. Admitindo que nem todas as normas conseguem criar as regularidades desejadas (ie,que há limites à eficácia ....) assim como nem todas as regularidades da conduta se devem a normas jurídicas.

33 4.1. Qual o objeto de Direito & Economia?
Numa análise integrada entre Direito e outras ciências sociais (economia, sociologia...), o que importa é não apenas o enunciado normativo como também todo o aparato de sua implementação (enforcement). + Compreender o processo real de implementação das normas jurídicas (enunciado normativo + aplicação); Enfim - Um pouco mais concretamente ... A pesquisa interdisciplinar deve ser capaz de juntar duas perspectivas e, adicionalmente, relacionar uma à outra. Direito não é só norma abstrata, mas todo o aparato envolvido na sua operação – produção, interpretação e aplicação – que, em conjunto, conformam um sistema institucional (no sentido da dogmática ampliada, de Nobre). a pesquisa sobre como realmente ocorre a operação do direito (o enforcement) é parte necessariamente integrante de um problema de pesquisa interdisciplinar. Por outro lado - estabelecer a influência que esse sistema institucional tem no comportamento dos agentes econômicos, Se e como esse conjunto de elementos jurídico-institucionais afeta decisões dos agentes (uma relação causal).

34 A efetividade (a garantia) dos direitos admite graus intermediários entre a total efetividade e a inexistência absoluta, o que só pode ser identificado a partir de investigação empírica. Obs: essa é uma observação típica de uma abordagem sociológica do Direito; também se aproxima do realismo jurídico dos institucionalistas americanos do começo do séc. XX. Nesse ponto, deve-se ter em vista que os direitos (que interessam para a análise econômica) admitem graus variados, de acordo com sua maior ou menor efetividade as garantias jurídicas, p/ a sociologia, são consideradas no mesmo nível - quanto à qualidade e às conseqüências - das causas das regularidades da atuação humana (p.268)

35 Graus de efetividade dos direitos
graus intemediários 1 Ausência de qualquer direito socialmente reconhecido e respeitado – manutenção do poder de disposição sobre bens depende da força e da vigilância constante Proteção efetiva varia conforme: i. reconhecimento social; ii. custos de enforcement (acesso ao judiciário; possibilidade de canais alternativos para solução de conflitos etc.) Direito absolutamente efetivo, com amplo reconhecimento social e procedimentos rápidos e eficazes para garantia.

36 5. Abordagens possíveis O Direito e as relações fundantes da economia capitalista: busca de relações de determinação entre economia e direito (marxistas); direito previsível como precondição para o desenvolvimento do capitalismo (weberianos); instituições como objeto da economia política (os “antigos” institucionalistas).

37 5. Abordagens ... Normas jurídicas e comportamento dos agentes econômicos Efeitos das normas s/ condutas; sistemas de incentivos etc. (Law & Economics; Nova Economia Institucional e demais Institucionalistas); Ordem jurídica como um complexo de motivações para a conduta real (sociologia do Direito, Weber). L&E (Análise econômica do Direito): agentes maximizam satisfações individuais quando tomam quaisquer decisões (mesmo não-mercado); normas jurídicas criam “preços” implícitos para determinados comportamentos. Nova economia institucional (instituições vistas como fruto do próprio processo econômico, e não como elementos exógenos...) Economia capitalista é essencialmente contratual; daí o papel fundamental do tema dos contratos, em geral, enquanto forma de criação de direitos subjetivos. - instituições não só como objeto de análise, mas decorrentes do processo econômico de trocas: Analisa-se como emergem estruturas normativas para regular a vida econômica, estruturas essas que vão além da mera suposição de um ordenamento jurídico estatal tomado como elemento exógeno. Ao enfocar como certas características do processo econômico engendram mecanismos institucionais para mediar as relações entre agentes e postular que tais mecanismos passam a regular as condutas das partes, instituições são tratadas como elementos que atuam decisivamente na forma como o processo econômico é organizado e gerido (na organização da produção e na circulação da riqueza); Isso permite entender, por exemplo, certas decisões dos agentes econômicos que não fariam sentido – i.e., não seriam racionalmente explicáveis – em outro contexto.

38 5. Abordagens possíveis .... Considerações sobre efeitos X considerações de princípio
Princípios constitucionais - conceitos vagos e ambíguos que admitem diferentes interpretações - todas igualmente aceitáveis do ponto de vista jurídico; não são tão ‘técnicas’ como se apresentam, às vezes. [i.e., não há critérios jurídicos pelos quais se possa decidir pela superioridade ou maior correção de uma ou outra] A análise de efeitos não poderia servir de critério interpretativo? Exemplo: o uso de algemas fere o princípio da dignidade da pessoa humana?

39 efeitos X princípios O que legitima um princípio?
Um princípio jurídico não deve tomado como um fim em si mesmo. Haveria um pressuposto implícito de que sua observância vai provocar um efeito positivo para a sociedade... Sob esse prisma, então, é cabível uma discussão sobre os efeitos que se buscam atingir com a observância de determinados princípios. Mas atençaõ: a crítica ao positivismo e à sua incapacidade de dar respostas às questões sociais não pode ser substituída por uma principiologia sem critério... Positivismo visto como um paradigma insuficiente para explicar a realidade. Questão da normatividade dos princípios ....

40 Os princípios jurídicos e os efeitos potenciais de decisões judiciais
Diferenciar situações: Efeitos limitados às partes Efeitos além das partes: Casos recorrentes/ ações repetitivas (precedente) Efeitos de incentivo ou desincentivo a determinados comportamentos. Microjustiça X macrojustiça “Preocupado com a solução dos casos concretos – ... microjustiça -, o juiz fatalmente ignora outras necessidades relevantes e a imposição ... de gerenciar recursos limitados para o atendimento de demandas ilimitadas: a macrojustiça. Ou seja: ainda que fosse legítimo o controle jurisdicional das políticas públicas, o jurista não disporia do instrumental técnico ou de informação para levá-lo a cabo sem desencadear amplas distorções no sistema de políticas públicas globalmente considerado.” (Barcellos, A.P. , 2006) Mesmo uma sentença cujos efeitos se limitem às partes, pode haver ‘efeito demonstração” .... Cuidado: a crítica ao paradigma positivista acarreta riscos da ausência de rigor metodológico na interpretação de princípios

41 A resistência a incorporar a análise de efeitos reais às análises jurídicas – tensões possíveis
Pressupostos comportamentais generalizantes (ex. racionalidade auto-interessada) X Consideração do caso individual. OBS: não se trata de discutir se uma abordagem é necessariamente mais correta que outra, mas sim se ela é a mais adequada ao nível de análise em discussão. Ex., Os economistas podem pressupor que, se a multa por atraso de pagto não for suficientemente alta, os indivíduos tenderão a não tomar os cuidados necessários para honrá-lo tempestivamente. Essa é uma qualidade do todo – ie., do grupo, não do indivíduo. Isso não diz se um dt indivíduo vai ou não sofrer essa influência da lei... Cuidado com a falácia da composição -

42 Efeitos das decisões judiciais
Como avaliá-los? Os efeitos devem orientar as decisões? Objetivo: Discutir a questão, já que o tema - efeitos ...– não é tratado sem dificuldade nas análises jurídicas Sobre como identificar os efeitos – reais: como avaliá-los? Sobre se esses efeitos devem ser considerados nas decisões dos juízes (se devem ser levados em conta no processo decisório judicial). Os 2 conjuntos embutem polêmicas: explicações prévias sobre os pressupostos do questionamento… : Quando falo em efeitos-impactos, têm-se em vista os eventos do mundo real : o que acontece na decisão de agentes econômicos em virtude de ter sido tomada determinada decisão judiciária; - não estou tratando, aqui, de efeitos no próprio plano normativo (dever-ser). Percebe-se, portanto, que, ao colocar o problema dessa forma, parto da ideia de separação dos planos de análise das disciplinas do direito e da sociologia/economia.


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