Salamanca do jarau FAIXA 11 DO CD “ENCANTARIAS DO SUL”

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Apresentação em tema: "Salamanca do jarau FAIXA 11 DO CD “ENCANTARIAS DO SUL”"— Transcrição da apresentação:

1 Salamanca do jarau FAIXA 11 DO CD “ENCANTARIAS DO SUL”
ROLAGEM AUTOMÁTICA

2 Salamanca do Jarau De Salamanca, terra castelã,
para o gaucho,Cerro do Jarau, chega aos poderes de Anhangá-pitã, encantaria, semente do mal. Corpo de lagartixa, com cabeça em pedra rubra, com tanta luz, que até pode cegar, vela princesa encantada, arca de tesouros, mulher, Teiniaguá.

3 Santão, de formação religiosa,
como levado, encontra Teiniaguá, que se revela mulher formosa, para ser seu par e nova gente gerar. Imerso em paixão proibida, sofreu Santão o mesmo encantamento. E, o casal só tronará à vida, pelo louvor de alguém, com puro sentimento.

4 Luz rasga as trevas, raia a liberdade.
Teiniaguá vira tapuia e Santão, gaucho de belo porte. Implode a Salamanca do Jarau, e os tesouros da insanidade, segue livre o casal, para a eternidade, segue livre o casal, para viver a felicidade, segue livre o casal, para a eternidade.

5 Caso interesse, é só utilizar o “ratinho”
Arranjo e Voz: Dudu Fagundes Composição: J. Coêlho IMAGENS SITES: anhangaourivesvf.blogspot.com; cerrodojarau.webnodet.com.br; churrascariagalpaocrioulo.com.br; dana.com.br; escoteiros8drs.wordpress.com; noticias.bol.uol.com.br; panoramio.com; pelotascultural.blogspot.com; taurusetcancer.blogspot.com; e wikimapia.org. A seguir o texto “A Lenda da Salamanca do Jarau” traz algumas considerações sobre a mesma. Caso interesse, é só utilizar o “ratinho”

6 A LENDA DA SALAMANCA DO JARAU
INTRODUÇÃO A Lenda da Salamanca do Jarau é também conhecida como Lenda do Cerro do Jarau. Podemos dizer que o primeiro e mais completo registro literário da lenda, em versão brasileira, foi feito por João Simões Lopes Neto. Por esse motivo, este nosso trabalho, em quase sua totalidade, segue a estrutura de como Simões a contou em seu livro: “Contos Gauchescos e Lendas do Sul”. Podemos dizer que nosso esforço consistiu em: restringir a variedade de detalhes; e substituir os termos, ou em desuso, ou extremamente regionais, que dificultam a leitura e entendimento da lenda, por brasileiros de outras regiões.

7 Como toda lenda e mitos, devemos procurar entendê-la não como fatos, não como história real. É metáfora, linguagem simbólica, da qual precisamos retirar-lhe um entendimento, o sentido real, próprio, correspondente ao figurado. Precisamos fazer analogia entre o invisível, que corresponde ao real sentido, mas velado, e o figurado explícito nos fatos. CENÁRIO E ORIGEM O palco da lenda é o Cerro do Jarau, formado por uma cadeia de morros, que se destacam na paisagem do pampa gaúcho, devido ter alturas fora dos padrões da região, aproximadamente 200 metros. Está localizado no oeste do Rio Grande do Sul, no município de Quaraí, onde o Brasil faz fronteira com o Uruguai. As cidades que lhe são vizinhas são: Alegrete; Rosário do Sul; Santana do Livramento; e Uruguaiana. A palavra salamanca aparece como simples designação para furnas ou cavernas encantadas, e está sempre relacionada às artes mágicas.

8 Histórias e lendas, sobre salamancas encantadas e lagartas com jóias incrustada na cabeça, partem da península ibérica e chegam até a fronteira do Rio Grande do Sul, trazidas pelos colonizadores. São recriadas em versões populares, difundidas pela região e transformadas em registro literário, como a da Slamanca do Jarau, pelo talento de Lopes Neto. Pesquisadores afirmam que a obra “Reseña histórico-descriptiva de antiguas e modernas supersticiones del Rio de La Plata” (1896), do escritor espanhol Daniel Granada ( ) foi uma das principais fontes de Lopes Neto. O ENCONTRO COM O SANTÃO DA SALAMANCA DO CERRO BLAU ENCONTRA E RECONHECE SANTÃO Blau Nunes era gaucho de bom porte e trabalhava como vigia do gado, na entrada de um extenso campo gaúcho. Um dia saiu à procura do Boi Barroso, boi encantado muito procurado, mas nunca encontrado. Ia pelo campo procurando atentamente quando, de repente, perto dum arbusto, percebeu um vulto de face tristonha e muito branca.

9 Retesou a rédea e parou bruscamente o cavalo
Retesou a rédea e parou bruscamente o cavalo. Reconheceu aquele vulto de face branca e tristonha. Aquele vulto era o Santão da Salamanca do Cerro, muito procurado por interessados em encantamentos. Blau sentiu um arrepio pelo corpo, mas era tarde para recuar. Como a tradição determina, que quem chega é que deve saudar, Blau saudou-o: Laus’Sus-Cris, forma abreviada de Louvado Seja Jesus Cristo. Para sempre amém, respondeu o Santão da Salamanca do Cêrro e, para demonstrar seus poderes, acrescentou: o Boi Barroso cumpre seu destino, vai subindo o cerro... Pasmado com a adivinhação, Blau Nunes revidou com suas habilidades como vaqueiro: vou ao rastro, sei tudo palmo a palmo, até a boca preta da caverna do Cerro. Surpreso, Santão da Slamanca do Cerro retrucou: tu sabes a entrada da Salamanca? Orgulhoso, Blau respondeu: minha avó, índia charrua, contou a respeito.

10 Interessado em saber até onde iam os conhecimentos de Blau, Santão indagou: o que contara sua avó?
Blau reproduziu o que sua avó lhe contara... A HISTÓRIA CONTADA PELA AVÓ DE BLAU MOUROS TRAZEM MAGIA PARA AS TERRAS GAUCHA Na Espanha havia uma cidade chamada Salamanca, onde viveram os mouros, mestres nas artes da magia. Eram possuidores de um Condão Mágico, que era guardado numa caverna escura, pois era preciso protegê-lo da luz do sol, que lhe desmanchava a força do encantamento. O condão sempre ficava no colo duma Fada Velha, que era Princesa encantada e muito bonita. Depois de vencidos, alguns se passaram por cristãos, atravessaram o mar e vieram dar nas terras gaúchas sossegadas. Vieram procurar riquezas para reorganizarem-se e tentarem novamente o domínio sobre as terras espanholas. Assim, chegaram os tais mouros trazendo escondida a Fada Velha e o Condão Mágico.

11 Mal puseram o pé em terra e logo na primeira sexta—feira, foram visitados, a meia noite, pelo mesmo Diabo deles, que aqui era chamado de Anhangá-pitã. ANHANGÁ-PITÃ TRANSFORMA CONDÃO MÁGICO E FADA VELHA EM TEINIAGUÁ Anhangá-pitã ficou muito alegre com a vinda dos mouros, porque a gente destas serras era sem cobiça. Comia só o peixe, a caça, as frutas e as raízes, que seu deus Tupã despejava em abundância. Após escutar as ambições dos recém-chegados, o maldoso pegou o Condão Mágico esfregou-o no suor de seu corpo e transformou-o em pedra transparente. Lançou o bafo queimante de seu peito sobre a Fada Moura, transformando-a em pequeno animal, semelhante a uma lagartixa, mas sem cabeça. No lugar da cabeça cravou no corpo da encantada a pedra transparente. Encantaria conhecida como Teiniaguá. Devido ao sol vermelho, que rompia sobre o mar, a cabeça de pedra transparente ficou vermelha como brasa e tão brilhante, que poderia cegar olhos humanos, quando a fitassem.

12 A caverna do encontro passou a ser chamada de salamanca e estendeu-se para todas as furnas, em lembrança da cidade dos mestres da magia. ANHANGA-PITÃ MOSTRA O MAPA DOS TESOUROS ESCONDIDOS NA REGIÃO Durante sete noites de sexta-feira, Anhangá-pitã levando a Teiniaguá num alforje, saiu pela região, para ensinar-lhe sobre os caminhos de todas as cavernas guardiães de tesouros escondidos. Então, Anhangá-pitã, cansado, pegou num cochilo pesado. Só não tomou as precauções necessárias. Esqueceu-se de que Teiniaguá era mulher. Para complementar a lenda e, também, para ratificar que a Tenianguá era mulher, o Santão da Salamnca do Cerro narrou sua saga ao Blau. A SAGA DO SANTÃO DA SALAMANCA DO CERRO O ENCONTRO DE SANTÃO DA SALAMANCA DO JARAU COM TEINIAGUÁ

13 SANTÃO ENCONTRA, APRISIONA E CARREGA CONSIGO TEINIAGUÁ
Santão continuou sua narrativa: vivia na cidade de Santo Tomé, na Argentina, do outro lado do rio Uruguai. Nela havia uma lagoa larga e funda e a Igreja de São Tomé. Era o sacristão dessa igreja. Cuidava dos altares e ajudava a missa. Um dia na hora do mormaço saí da igreja, levando no corpo o frescor daquele local sagrado. Saí e andei como levado. A água da lagoa borbulhava. Certamente, lá embaixo, dentro da terra é que estaria a causa da fervura. Aproximei-me como levado. Porém, logo outra força fez tudo se acalmar. Quando estava na beira da água, rompeu dela um clarão vermelho como sol se pondo. Sem medo e sem ameaçar veio andando em minha direção e, não acreditava no que via. Era a Teiniaguá, de cabeça de pedra luzente, da qual já ouvira falar. Entrecerrei os olhos, prevenindo-me do perigo, mas a Teiniaguá veio se chegando. E, aí, me lembrei do que as pessoas falavam sobre as sensações, pelas quais somos tomados, na hora do encantamento.

14 Mas, mantive o controle e pensei: se da água saíra na água viveria
Mas, mantive o controle e pensei: se da água saíra na água viveria. Ali perto, avistei uma guampa (vasilha feita de chifre do gado). Apanhei e enchi a guampa com a água da lagoa e coloquei-me na frente da Teiniaguá. Deteve-se e firmou-se nas patinhas da frente. A pedra rubra, como cheia de curiosidade, cintilava, faiscava... Assentei no chão a guampa e num repente, de olhos apertados, com a respiração ofegante, entre o medo e a coragem, segurei-a dentro da guampa. Corri levando-a para a cela de pedra, onde eu morava, que ficava no fundo da igreja, Fechei a guampa dentro da canastra (cesto largo) e pensei: pelo falar dos padres, quem prendesse a Teiniaguá se transformaria no homem mais rico do mundo. Desfilaram em minha mente as mais diversas imagens de riqueza e poder: escancaram-se portas de castelos e palácios repletos de ouro e outras preciosidades; desfilaram campos e estâncias cheias de rebanhos e manadas; armazéns repletos de gêneros...

15 Todas essas imagens eram contadas, medidas e pesadas até cair de cansaço.
Voltei a mim. Lembrei-me de que o animalzinho precisava ser alimentado. Tranquei porta e janelas e saí para buscar uma cuia do melhor mel. TEINIAGUÁ REVELA-SE FADA MOURA PARA O SANTÃO Voltei abri e fechei rápida e sutilmente a porta. Descerrei a janela e dirigi-me para a canastra. Quando ia tirar a guampa para alimentar a Teiniaguá, fui surpreendido. Surge, na minha frente bela moça, que me disse: sou a Princesa Moura encantada, trazida de outras terras e Anhangá–pitã transformou-me em Teiniaguá da cabeça luminosa, que muitos desejam, porque sou a conhecedora dos tesouros escondidos. Muitos me procuraram, entretanto respondi a sua ambição e cobiça com o relampejar do lume vermelho de minha cabeça transparente. Continuou a princesa encantada: tu, não. Procuraste-me sem ambições e vim ao teu encontro. Trataste-me bem: água na guampa e mel fino.

16 Se quiseres todas as riquezas que sei, entrarei de novo na guampa e irás aonde te orientar e serás o homem mais rico do mundo. Afirmou, ainda, a Princesa Moura encantada, fitando com ternura o Santão: a Teiniaguá sabedora dos tesouros sou eu. Estava escrito que serias meu par. E, quebrado o encantamento, geraremos nova gente: forte; bela; dourada; e sábia. A PAIXÃO PROIBIDA VIVIDA POR SANTÃO Depois de narrar seu primeiro encontro com a princesa, continuou o Santão da Salamanca do Cerro: o regaço da moura era meu ninho todas as noites. Mas, quando apontava o raiar do dia desaprecia deixando-me com a face cavada de olheiras... E no ofício de sacristão, quando chegava a hora do padre lançar a benção sobre aquela gente ajoelhada e rezando para aliviar seus pecados, doía-me até a alma, pois seus pecados nem pecados seriam se comparados aos meus.

17 Numa dessas noites ela quis misturar o mel do seu sustento com vinho
Numa dessas noites ela quis misturar o mel do seu sustento com vinho. Retrucou-me: vinho, só o da santa missa. Enlouquecido pela paixão busquei. Bebemos e amamos toda a noite. Ao despertar decomposto, estava cercado pelos padres. Acharam na canastra a guampa a cuia de mel. Farejaram no ar cheiro de mulher e de vinho. A Princesa Moura transformara-se em Teiniaguá e fugira para as barrancas do rio Uruguai. SANTÃO É SETENCIADO À MORTE Sob o arrocho da tortura, minha boca não falou. Fui sentenciado à morte pelo garrote; condenado por ter errado com bicho imundo, que era bicho e mulher moura, falsa, sedutora e feiticeira. Nos arredores da igreja, o povo ajoelhado clamava a morte de meu corpo e a misericórdia de minha alma. O sino dobrou a finados. Trouxeram-me entre lanças e, em lento cortejo: os soldados, os padres, o carrasco e o povaréu.

18 Sem qualquer esperança nos homens e nem em socorro do céu, ao sentir réstia de saudade daquele soberano amor, chorei lágrimas de adeus à Princesa Moura... Parece que aquilo saiu de meu peito e ponteou para o encontro doutra saudade. Assim pareceu, pois uma ventania estourou sobre as águas da lagoa e a terra tremeu... Os santos padres, pasmados, rezavam encomendando minha alma. Bem perto de mim, continuava o carrasco atento ao garrote. Mas, os olhos de meus pensamentos, livres, viam o corpo lindo da Princesa Moura e recreavam-se na luz jorrada, pela cabeça encantada da Teiniaguá, onde reinavam os olhos de amor da princesa. Quanto mais os padres e representantes da lei ordenavam que morresse, mais por minha liberdade empenhava-se a encantada, não sei se por amor, se por orgulho ou se pelo desejo de um dia ser humana. O governador da província levanta o pendão real e o carrasco atira-me sobre o garrote. Morte por ter profanado a igreja e apaixonar-se por mulher moura, falsa, sedutora e feiticeira.

19 TEINIAGUÁ SALVA SANTÃO DO ENFORCAMENTO
Da lagoa, como resposta, um ronco monstruoso, nunca ouvido. Vi e todos viram a Teiniaguá de cabeça de pedra transparente, luminosa como nunca, rasgando barrancos, para que despencasse a correnteza como torrentes de chuvas. Coral de lástimas, choros e gemidos levantou-se para o céu. Depois de um grande silêncio, um milagre se fez: o Santíssimo, de si próprio, cortou nas alturas, no ar turvado a Cruz bendita. Foi um temor geral e todos desandaram como em procissão. Fiquei sozinho, percebendo minhas contradições entre o sentir físico e o sentir do pensamento. Com meu sentido físico: ouvi as ladainhas que iam minguando em retirada; senti o cheiro do incenso, que fugia ardendo e perfumando; senti a secura de minha boca em agonia e terror; sentia, em minhas mãos, as manilhas de ferro, que me prendiam. Entretanto, com o sentir do pensamento: ouvi o chamado carinhoso da Princesa Moura; vi seu sorriso mimoso e tentador; saboreei os beijos e senti o roçar sôfrego do corpo torneado e rijo da encantada.

20 Enquanto o povo chegava à cidade, eu chegava à barranca do Uruguai
Enquanto o povo chegava à cidade, eu chegava à barranca do Uruguai. Sem peso de dores e de ferros no corpo e sem peso de remorsos na alma, atravessei o rio. O DESTINO DE SANTÃO TRAÇADO PELO SOBRENATURAL Teiniaguá fechou os tesouros e juntos fizemos então caminho para o Cerro do Jarau, que ficou sendo o esconderijo das riquezas de todas as salamancas. Faz duzentos anos. Nunca mais dormi. Nuca mais nem sede, nem fome, nem dor e nem riso. Passeio no palácio dentro deste Cerro do Jarau; ando sem parar e sem cansaço; piso torrões de ouro em pó que se desfazem como areia; passeio enjoado pelo jardim, do qual o areão é todo feito de pedras preciosas. Olho para tudo, entediado por ter tanto e não poder gozar nada entre os homens, quando era como eles.

21 O encantamento que me aprisiona consente que acompanhe os homens de alma forte e coração sereno, que quiserem tentar a sorte nesta salamanca. Todos os que até o presente aqui chegaram, vieram arrastados pela cobiça, vícios e ódios. Foste o único a aqui chegar sem pensar e o único que me saudou como filho de Deus. Quando a terceira saudação de cristão a mim for dada, o encantamento cessará, porque estou arrependido. E, quando o meu encantamento cessar, também, cessará o de Teiniaguá. Assim que cessar o encantamento, a salamanca desaparecerá e, com ela, todas as riquezas, todas as pedras preciosas, todas as peças cunhadas, todas as influências maléficas. Tudo se perderá em fumaça, que sairá pelo topo do cerro e se dissolverá. SANTÃO CONVIDA BLAU NUNES A ENTRAR NA SALAMANCA Santão com um olhar quase suplicante dirigiu-se a Blau : alma forte e coração sereno, a caverna está lá, entra.

22 Não há e nem se vê ninguém, mas há mãos que batem no ombro de quem entra, como saudação ou incentivo. Mãos que empurram aqueles que, por medo, recusam entrar. Alma forte e coração sereno! Se te portares assim lá dentro, tudo que quiseres será atendido. Governa o pensamento e segura a língua. A SAGA DE BLAU NUNES BLAU E AS SETE PROVAS DENTRO DA SALAMANCA Blau seguiu, foi andando, calado entrou na boca da caverna, onde só aí havia luz. Andou por corredor até uma encruzilhada de onde nasciam sete outros corredores. A cada corredor correspondia a uma das sete provas, pelas quais deveria passar Blau. Enveredou por um deles. O silêncio e a escuridão o acompanhavam.

23 Ouviu ruído conhecido de ferros que se chocavam, o tinir de espadas
Ouviu ruído conhecido de ferros que se chocavam, o tinir de espadas. Um lapso de insegurança o acometeu, mas atentou logo aos dizeres de Santão: alma forte, coração sereno... Meteu o peito por entre o espinheiro de espadas. Mãos leves bateram-lhe nos ombros, como carinhosas e satisfeitas. Blau Nunes voltou e adentrou ao segundo corredor. Continuou andando e saltaram-lhe aos quatro lados jaguares e pumas de goela aberta e bafo quente, patas e unhas em posição de ataque. E passou escutando urros que iam desaparecendo. As mãos, de braços que não via, iam-lhe sempre afagando os ombros incentivando-o a continuar. De mesmo modo venceu as outras provas, passando pelos outros cinco corredores. Como sempre de alma forte e coração sereno, bem como sempre saudado e incentivado, a cada corredor com mais intimidade, por mãos invisíveis. No terceiro corredor, caminho tomado por esqueletos humanos incompletos, sob bafo de juntas bolorentas.

24 No quarto corredor, surpreendido por um jogo línguas de fogo vermelhas e fortes contra repuxos d’água saídos das paredes da caverna, que batiam nele, referviam e faziam vapor. No quinto, a cascavel (boicininga) guardava a passagem: levantando a cabeça; flechando o ar com sua língua; e pingando de suas duas pressas goma escura, que era a peçonha mortal. O sexto corredor desembocava num pequeno campo de gramado fofo. Moças bonitas e alegres saíram do meio do arvoredo a seduzi-lo. Algumas vestidas somente com os longos e soltos cabelos. Outras dançavam num requebro, como marcado por música. Ainda outras, acenavam-lhe com a beleza de seus corpos, atirando-se ao chão em esteiras macias. Tudo num convite aberto e ardiloso. O sétimo corredor desembocava num arvoredo. Foi logo rodeado por uma tropa de anões, cabeçudos e de pernas tortas, cada qual melhor para galhofas. Porém, Blau passou sem sequer um ar de riso no canto dos olhos. E, como era o sétimo e último passo surgiu-lhe em frente a face tristonha e branca de Santão. Tomou a mão de Blau e foram seguindo.

25 BLAU E AS SETE ESCOLHAS OFERTADAS PELA VELHA ENCANTADA
Sentada numa banqueta transparente, estava uma velha enrugada e corcunda, que segurava uma varinha branca. Santão dirigiu-se a ela: Cunhã, ele quer. Balançando a cabeça afirmativamente, a velha respondeu: tu vieste, tu chegaste, tu podes. A velha continuou: por sete provas passaste, sete escolhas te darei. A escolha é tua. A Blau Nunes, a velha ofertou: sorte para qualquer jogo; talento para tocar viola e cantar, para seduzir mulheres; conhecimento sobre ervas, raízes e outras plantas para a cura, ou doença ou, para fazer as mais diversas simpatias; precisão e segurança, para acertar golpes em teus inimigos, nas mais adversas situações e com as mais diversas armas; poder para mandares no teu distrito e capacidade de comunicação em qualquer língua; sagacidade para enriqueceres e gado e manadas de todo pelo; e talento e inspiração para as mais diversas artes.

26 A cada oferta, a velha indagava a Blau: queres
A cada oferta, a velha indagava a Blau: queres? E Blau respondia convicto: não. A velha dirigiu-se de forma ríspida a Blau e concluiu: se a todos os poderes que te foram ofertados nada quiseste, nada te darei. Vai-te! Blau nem se moveu e pensou no que quis dizer, mas não podia: Tenianguá encantada, queria a ti, porque és tudo. Tudo que não sei o que é, porém que atino que existe fora de mim, em volta de mim, superior a mim, no mais profundo de mim... BLAU NUNES VOLTA Á CAVERNA Blau Nunes andou em voltas até bater de novo na boca da caverna por onde entrara. Encontrou atado e quieto seu cavalo. Lembrou o que tinha acabado de ver, ouvir e responder. Refletiu sobre ter tido oferta de muito e não lograra nada, por querer tudo. Numa crise de raiva decidiu entrar de novo na caverna.

27 Tentou entrar, mas bateu com o peito na parede dura do cerro
Tentou entrar, mas bateu com o peito na parede dura do cerro. Desanimado, montou o cavalo e, ao dar rédea, apareceu-lhe o sacristão, o vulto de face branca e tristonha, o Santão da Salamanca do Jarau,que lhe estendeu a mão dizendo-lhe: nada quiseste; tiveste a alma forte e o coração sereno. Não soubeste governar o pensamento, que eleva os homens nem e nem segurar a língua, que os amesquinha. Aceita este presente que te dou. É uma moeda de ouro, que está furada pelo Condão Mágico. Com ela terás tantas outras quantas quiseres, mas sempre uma de cada vez. Nunca mais do que uma por vez. Guarda-a como lembrança minha. E o corpo do sacristão encantado desfez-se em sombra A NOVA VIDA DE BLAU COM A MOEDA DE OURO FURADA BLAU CERTIFICA-SE DO ENCANTO DA MOEDA Blau Nunes meteu a Moeda de Ouro Furada em um dos bolsinhos de seu largo cinto de camurça (guaiaca) e trotou para o posto em que morava.

28 Rumou para uma venda e, como estava com a garganta seca e a cabeça atordoada, pediu bebida e preparou-se para testar, se a Moeda de Ouro Furada era mesmo encantada. Bebeu, apertou na guaiaca e a outra moeda lhe caiu nas mãos. Puxou da guaiaca a outra moeda e pagou. Era tão mínima a despesa, que o troco o assustou. Socou o troco para dentro da guaiaca. No caminho, foi pensando nas coisas que poderia comprar. Chegou ao posto onde morava. Como homem prevenido e cauteloso, falou, somente, que procurou o Boi Barroso e não o encontrou. No dia seguinte saiu para testar novamente o prometido. Voltou ao mesmo armazém e providenciou aquilo de maior urgência: algumas roupas; uma faca para caça; esporas e um pequeno chicote. A compra passava de três moedas de ouro. Blau, com as fontes latejando, respiração atropelada, e desconfiado, apertou a primeira vez a guaiaca escondida debaixo de seu casaco largo e remendado, e caiu-lhe nas mãos uma moeda, depois outra, outra, até a quarta que, na ocasião, era o necessário.

29 Voltou ao rancho com as mercadorias, mas continuou sem falar sobre o acontecido.
No outro dia seguiu para outro negociante com prateleiras mais variadas. A conta chegou próxima a quinze moedas. O mesmo ritual e o comerciante teve que esperar e ir alinhando as moedas sobre o balcão, pois elas caíam uma a uma. No terceiro dia, Blau fez parar uma cavalhada que passava pela estrada. Com seu olho experiente pelo trabalho no campo, acertou preço e escolheu trinta cavalos, que lhe custaram quarenta e cinco moedas de ouro. Pagos como nas compras anteriores. Entretanto, o vendedor estranhando a demora, comentou: as suas moedas parecem pinhão de serra, que só se descasca um de cada vez. BLAU EXPANDE SEUSNEGÓCIOS Depois desses três dias, Blau não teve mais dúvidas sobre o encantamento da lembrança, que lhe foi dada pelo Santão do Cêrro do Jarau.

30 Arrendou um campo e comprou mais de dez mil cabeças de gado
Arrendou um campo e comprou mais de dez mil cabeças de gado. Negócio acima de três mil moedas de ouro. Coitado do Blau perdeu quase o dia todo apertando o bolsinho da guaiaca, aparando moeda por moeda, Sofreu também o vendedor... CORREM FAMA E FUXICOSA SOBRE A FORTUNA DE BLAU Começou a correr a fama da fortuna de Blau Nunes. Todos se espantavam com sua rápida trajetória de gaúcho pobre para concorrente dos mais abonados da região. Também, comentava-se de seu esquisito modo de pagar. Mistério para Blau... Muito rico, muito rico, mas todo dinheiro que recebia de seus negócios, mesmo que guardado na arca de ferro, desaparecia como desfeito em ar. Começou a correr fuxicos: Blau teria parte com o diabo. Que o dinheiro era maldito, pois todos com quem tratava e recebiam de suas moedas de ouro, passaram a fazer maus negócios e perdiam, exatamente, a mesma quantia recebida das mãos de Blau.

31 Os rumores foram se alastrando e já diziam que aquilo, certamente, era mandinga arrumada na Salamanca do Jarau, onde Blau fora visto várias vezes. Movidos pela ambição muitos passaram a tentar a sorte no Cerro do Jarau. Blau passou a ser discriminado e tratado à distância. Já não tinha com quem prosear; churrasqueava e tomava seu mate sozinho. Só seus cachorros o acompanhavam. BLAU DECIDE DEVOLVER A MOEDA DE OURO FURADA PARA SANTÃO Decidiu-se. Montou o cavalo e foi ao cerro. Chegou junto ao local tão seu conhecido e recordado. Tão logo chegou, deu de cara com o vulto de face branca e tristonha. Ainda, desta vez, como era ele que chegava, saudou como da outra: Laus’ Sus-Cris(Louvado Seja Jesus Cristo). Para sempre, amém, respondeu Santão. Então, Blau, sem apear, atirou-lhe aos pés a moeda de ouro encantada, dizendo: devolvo. Prefiro a minha pobreza dantes à riqueza dessa moeda, que parece amaldiçoada. Adeus e fica com Deus.

32 QUEBRA-SE O ENCANTAMENTO
Santão caiu de joelhos e de mãos postas como numa reza exclamou: seja Deus louvado! Pela terceira vez falaste o Nome Santo e quebraste o encantamento. Graças!Graças!Graças! No mesmo momento em que Blau saudava o Nome Santo, pela terceira vez, ouviu-se um imenso estrondo. O Cerro do Jarau tremeu de alto a baixo. Em cima, no cume do monte, surgiu e apagou-se enorme língua de fogo. Deu lugar a rolos de fumaça imensos. Como dissera o Santão, os tesouros da Salamanca do Jarau foram queimados. Para os olhos de Blau, o cerro ficou transparente. Tomou ciência do que lá dentro se passara: os jaguares, os esqueletos, os anões, as lindas moças, a cascavel tudo se dissolveu nas labaredas e se perdeu nas nuvens de fumaça. Ainda uma vez, a velha enrugada e corcunda transformou-se em Tenianguá e esta, na Princesa Moura. E, finalmente, a moura transformou-se numa tapuia formosa.

33 Santão tomou a figura do sacristão de São Tomé e este num gaúcho de belo porte.
Assim, quebrado o encantamento, aquele par juntado e tangido pelo destino, de mãos dadas, deu as costas ao seu desterro, e foi descendo até a várzea plana, verde e limpa, amornada pelo sol claro, em viagem de alegria a caminho do repouso. Blau Nunes, também, não quis mais ver traçou sobre seu peito e na testa de seu cavalo uma cruz, deu de rédea e desceu a encosta do cerro com o coração aliviado e alegre. Agora estava certo de que era pobre como antes, porém que comeria seu churrasco, tomaria seu chimarrão e tiraria sua sesta e viveria em paz. Assim, acabou a Salamanca do Cêrro do Jarau. Durou duzentos anos, pois é contada desde os tempos das Sete Missões . Anhangá –pitã, também, desde então nunca mias foi visto. Dizem que, desgostoso, anda escondido por não haver tomado os cuidados e precauções necessários, visto que Tenianguá era mulher.

34 CONSIDERAÇÕES FINAIS Como toda lenda a Salamanca do Cerro do Jarau é cheia de símbolos. Seus personagens e muito de suas falas são simbólicas. A linguagem das lendas e dos mitos é metafórica. A simbologia dessa e de muitas outras tem muito a ver: com nosso autoconhecimento; e com as situações impostas por um sistema com modelos preestabelecidos. Modelos sem sintonia com a individualidade humana: diversa em suas manifestações, criativa, dual em sua natureza; e desligada, ainda, de sua essência. O enredo da lenda apresenta a natureza dual dos homens: princesa e teiniaguá; sacristão e jovem incendiado pelo amor; e Blau,simplório e ambicioso. Além disso, desfila aspectos emocionais e mentais, que impedem o homem de religar-se a sua essência. Basta observar o monólogo de Santão, durante sua sentença de morte e sua libertação, quando expões sobre seu sentir no presente, real e físico e no mental no passado.

35 A salamanca esconde tesouros de mesma forma como nossa personalidade
A salamanca esconde tesouros de mesma forma como nossa personalidade . Procura, garimpar nas salamncas é tentar religar-nos a essência, para transformarmo-nos no que realmente somos: a individualidade liberta e revelada, como o gaucho e a tapuia em que se transformaram Santão e a Princesa Moura. As salamncas não estão na península ibérica ou nos pampas gaúchos, mas sim numa guampa no mais íntimo de nosso ser, Numa guampa, que como disse Blau: “Tenianguá encantada, queria a ti, porque és tudo. Tudo que não sei o que é, porém que atino que existe fora de mim, em volta de mim, superior a mim, no mais profundo de mim...” FONTES: LIVROS: “Contos Gauchescos e Lendas do Sul”; e “Lendas do Sul” – João Simões Lopes Neto.

36 ORGANIZAÇÃO E FORMATAÇÃO
SITES: páginadogaucho.com.br; pelotascultural.blogspot.com; revlet.com.br; e wikipedia.org. ORGANIZAÇÃO E FORMATAÇÃO DOTEXTO: J. COÊLHO


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