Que mania! Mamãe diz que eu sou hipocondríaca. Ai, gente... meu peito tá doendo. Mas eu não tomo remédio, eu só reclamo. Quando eu era pequena, era assim: mãããããe, tô com dor de crescimento!
Pra quem não sabe, isto quer dizer formigamento na batata da perna. Ela dizia: Tô com dor de cabeça! -Sinal que tem cabeça. Que irritante. -Sinal que tem perna e tá crescendo.
Eu queria ouvir: -Vem filhinha, mamãe faz massagem na perninha. Mas titia fazia. Massagem corta-bife, sabe? Grande titia.
Não sei não, acho que foi educação à milanesa: italiano com alemão. Ô ascendenciazinha de personalidade. A avó materna de buço, pesadona, verrugão no queixo. Era uma ordem e ponto, não se podia discutir.
E mamãe bradava orgulhosa: -Diálogo é coisa de geração podes-crer, aqui ninguém é hippie! Avô paterno alemão, disciplina chucrute. Ai, gente... uma pontada no estômago.
Comi dois quindins e quatro bombons serenata. Acho que doce não me cai bem. Estou pensando em tomar um sal de fruta. Fora de cogitação, não tomo remédio.
Mas a que ponto chegava o quartel... Aliás, por pouco eu não ganho certificado de reservista. A mãe chamava e eu respondia: -Já vou. Aí eu ouvia atônita: -Já vou não, tô indo!
Ah ah... acho que vou espirrar! Essa alergia... Não, acho que é gripe. Deus, eu tenho Cebion. Deixa pra lá... não sou hipocondríaca. Eu só reclamo, não tomo remédio.
Composição de imagens: Google Texto cedido pela autora: Não tomo remédio (Ilca Müller) Música: Dilermano Reis- Tempo de criança Formatação: Revisão: Site: Respeite os direitos autorais e de formatação.