Meus Poemas Preferidos – Manuel Bandeira

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Transcrição da apresentação:

Meus Poemas Preferidos – Manuel Bandeira “Em literatura a poesia está nas palavras, se faz com palavras e não com idéias e sentimentos, muito embora, bem entendido, seja pela força do sentimento ou pela tensão do espírito que acodem ao poeta as combinações de palavras onde há carga de poesia”. “Andorinha lá fora está dizendo: - “Passei o dia à toa, à toa!” Andorimha, andorinha, minha cantiga é mais triste! Passei a vida à toa, à toa...” (Andorinha)

1. O Estilo A poesia de Bandeira caracterizou-se pela variedade criadora, desde o soneto parnasiano, pela prática do verso livre, até por experiências com a poesia concretista. Por outro lado, conservou e adaptou ao espírito moderno os ritmos e formas mais regulares, como os versos em redondilhas maiores. Também utilizou o poema-minuto. Em sua poesia, observa-se uma constante nota de ternura e paixão pela vida. Seu lirismo intimista registra o cotidiano com simplicidade, atribuindo-lhe um sentido de evento e espetáculo. Nela, também, estão presentes a infância, a terra natal, a cultura popular, a doença, a preocupação com a morte, a defesa da linguagem modernista, a sensualidade, o lirismo tradicional, o antilirismo, a reflexão existencial, a infância e o humor.

2. A Obra (1966, é uma antologia do autor) Constituída de 144 poemas, extraídos de 11 livros, publicados entre 1917 e 1961, a coletânea contém 23 traduções realizadas pelo autor. Verificamos, em Bandeira, traços indicadores de uma sensibilidade romântica, sobretudo de uma profunda tristeza, aliada ao desencanto e à melancolia. A confissão de seu estado de espírito, da presença do “eu” em poemas e da morte como motivo poético mais freqüente conferiu-lhe uma aura romântica. A infância, como retorno ao passado, opõe-se a este presente de angústia e dor vivenciado pelo poeta. O folclore, suas quadras e canções populares, a família sempre aparecerão ligados à infância. Em muitos poemas, Bandeira aproxima-se da estética parnasiana através da rigidez formal, da seleção de temas, da busca do universal e da apreensão objetiva da realidade. Em outros textos aparecem o irracionalismo, as paisagens indefiníveis, nebulosas e as atmosferas crepusculares. O Simbolismo, que além dessas características privilegiou a musicalidade, despertará no poeta o gosto pelo subjetivismo, pela introspecção.

3. Temas 1. A Tuberculose e o Confessionalismo O poeta padeceu de tuberculose na juventude e a prática literária tornou-se necessária, como se fosse uma forma de preparação para a morte. • No poema, a morte é tratada com ironia e humor negro (Poema - Piada) • Tango – grande dramaticidade que expressa tragédias pessoais. Pneumotórax “Febre, hemoptise, dispnéia e suores noturnos. A vida inteira que podia ter sido e que não foi. Tosse, tosse, tosse. Mandou chamar o médico: - Diga trinta e três. - Trinta e três... trinta e três.... trinta e três.... - Respire. .......................................................................... - O senhor tem uma escavação no pulmão esquerdo e o {pulmão direito infiltrado. - Então doutor, não é possível tentar o pneumotórax? - Não. A única coisa a fazer é tocar um tango argentino.”

2. A Metalinguagem Rejeição aos padrões literários vigentes. Assimilando as conquistas dos poetas do Modernismo, Bandeira, em muitos textos nos quais discute a prática poética, define esta nova postura estética. Primeiramente, houve uma ruptura com o Parnasianismo, ou com a tradição lírica da época; depois, estes textos negariam as confecções e manifestariam o desejo de libertação. O poema equivale a um programa estético. “Clowns”- personagens simples , mas capazes de expressar, com humor espontâneo, verdades essenciais, além de desmascarar a hipocrisia geral. Poética – tratado de poesia; disciplina que estuda teoricamente o fenômeno poético, investigando suas leis, sua natureza e suas formas.

“Estou farto do lirismo comedido / Do lirismo bem comportado Do lirismo funcionário público com livro de ponto expediente protocolo e manifestações de apreço / ao Sr. diretor Estou farto do lirismo que pára e vai averiguar no dicionário o cunho vernáculo de um vocábulo / Abaixo os puristas Todas as palavras sobretudo os barbarismos universais Todas as construções sobretudo as sintaxes de exceção Todos os ritmos sobretudo os inumeráveis Estou farto do lirismo namorador / Político / Raquítico / Sifilítico De todo lirismo que capitula ao que quer que seja fora de si mesmo. De resto não é lirismo Será contabilidade tabela de co-senos secretário do amante exemplar com cem modelos de cartas e as diferentes maneiras de agradar / às mulheres, etc. Quero antes o lirismo dos loucos O lirismo dos bêbedos O lirismo difícil e pungente dos bêbados O lirismo dos clowns de Shakespeare Não quero mais saber do lirismo que não é libertação.”

Desencanto “Eu faço versos como quem chora De desalento... de desalento... Fecha o meu livro, se por agora Não tens motivo nenhum de pranto. Meu verso é sangue. Volúpia ardente... Tristeza esparsa... remorso vão... Dói-me nas veias. Amargo e quente, Cai, gota a gota, do coração. E nestes versos de angústia rouca Assim dos lábios a vida corre, Deixando um acre sabor na boca. - Eu faço versos como quem morre." Poema metalingüístico, composto de versos de nove sílabas, com rimas alternadas. É como se fosse um soneto, que morre no início do último terceto, estabelecendo conexão entre forma e conteúdo.

3. A Familiaridade com a Morte • Sensação de aniquilamento pessoal, de destruição do mundo físico e familiar (morte do pai, mãe e irmã) Bandeira conviveu a vida inteira com a tuberculose e fez dela grande parte de seu canto. Francisco de Assis Barbosa observa que o nosso poeta é o “melhor exemplo de transposição de uma experiência pessoal para o plano artístico”, realçando ainda que “foi a morte que deu vida à poesia bandeiriana.” • Fragmento de “Elegia para minha mãe” “(...) Tudo o que há de infantil em minh’alma sangra Na dor de Ter, Ó mãe, agonizar!”

Profundamente “Quando ontem adormeci / Na noite de São João Havia alegria e humor / Estrondos de bomba luzes e Bengala Vozes cantigas e risos / Ao pé das fogueiras acesas. No meio da noite despertei / Não ouvi mais vozes nem risos Apenas balões / Passavam errantes / Silenciosamente Apenas de vez em quando / O ruído de um bonde / Cortava o silêncio Como um túnel. / Onde estavam os que a pouco Dançavam / Cantavam / Riam / Ao pé das fogueiras acesas? Estavam todos dormindo / Estavam todos deitados / Dormindo Quando eu tinha seis anos / Não pude ver o fim da festa de São João Porque adormeci / Hoje não ouço mais as vozes daquele tempo Minha avó / Meu avô / Totônio Rodrigues / Tomásia / Rosa Onde estão todos eles? - Estão dormindo Estes todos deitados Dormindo / Profundamente.”

Momento num Café “Quando o enterro passou Os homens se achavam no café Tiraram o chapéu maquinalmente Saudavam o morto distraídos Estavam todos voltados para a vida Absortos na vida Confiantes na vida. Um no entanto se descobriu num gesto largo e demorado Olhando o esquife lentamente. Este sabia que a vida é uma agitação feroz e sem finalidade Que a vida é traição É saudava a matéria que passava Liberta para sempre da alma extinta”

Consoada “Quando a Indesejada das gentes chegar (Não sei se dura ou caroável), Talvez eu tenha medo. Talvez sorria, ou diga: - Alô, iniludível! O meu dia foi bom, pode a noite descer. (A noite com os seus sortilégios) Encontrará lavrado o campo, a casa limpa, A mesa posta, Com cada coisa em seu lugar.”

Preparação para a morte “A vida é um milagre Preparação para a morte “A vida é um milagre. Cada flor, Com sua forma, sua cor, seu aroma, Cada flor é um milagre. Cada pássaro, Com sua plumagem, seu vôo, seu canto, Cada pássaro é um milagre. O espaço, infinito, O espaço é um milagre. O tempo, infinito, O tempo é um milagre. A memória é um milagre. A consciência é um milagre. Tudo é milagre. Tudo, menos a morte. - Bendita a morte, que é o fim de todos os milagres.”

Sobre o poema Preparação para a morte é importante observar que o verso final pode significar que a morte, não sendo um milagre, é algo raro na vida, em que tudo é milagre. É portanto, algo grandioso, com seu poder de encerrar todos os milagres. Deve-se observar que a palavra “fim” pode ter, no texto, dois sentidos: A morte não seria o término dos milagres, mas todos os milagres (toda a vida) tenderiam para a morte, teriam-na como finalidade. Ou seja, nesse sentido, sem a morte nada na vida seria milagre.

4. A Sensualidade e o Amor • Exploração dos elementos sensoriais (visão, audição, tato, olfato, gustação) é marcante. • Herdeiro da musicalidade simbolista, sempre se preocupou com a sonoridade, harmônica ou dissonante, dando um efeito mais agressivo a quaisquer temas. • Nos textos eminentemente sensuais, é interessante notar a linguagem coloquial, anti-retórica, despojada, a grandiloqüência, as metáforas arrojadas, muito usadas por poetas da nossa língua

Poemeto Erótico “Teu corpo claro e perfeito. / - Teu corpo de maravilha. Quero possuí-lo no leito / Estreito da redondilha... Teu corpo é tudo o que cheira... / Rosa... flor de laranjeira... Teu corpo, branco e macio. / É como um véu de noivado... Teu corpo é pomo doirado... Rosal queimado do estilo. / Desfalecido em perfume... Teu corpo é a brasa do lume... Teu corpo é chama e flameja / Com à tarde os horizontes... É puro como nas fontes / A água clara que serpeja. Que em cantiga se derrama... Volúpia da água e da chama... A todo o momento o vejo... / Teu corpo... a única ilha No oceano do meu desejo... Teu corpo é tudo que brilha. / Teu corpo é tudo que cheira... Rosa, flor de laranjeira...”

Observe que logo no início do poema, o eu-lírico fala da posse erótica da mulher através da posse da própria poesia. O excesso de reticências cria uma atmosfera arquejante, mesclando, através do recurso da sinestesia, os vários sentidos. A sensualidade do corpo da mulher é assinalada por metáforas ígneas, como chama, lume, rosal queimado do estio, que contrasta com metáforas aquáticas (fontes, água), culminado com a hipérbole metafórica: “Teu corpo... a única ilha No oceano do meu desejo...”

Arte de Amar “Se queres sentir a felicidade de amar, esquece a tua alma. A alma é que estraga o amor. Só em Deus ela pode encontrar satisfação. Não noutra alma. Só em Deus – ou fora do mundo. As almas são incomunicáveis. Deixa o teu corpo entender-se com outro corpo. Porque os corpos se entendem, mas as almas não.”

Porquinho-da-índia “Quando eu tinha seis anos Ganhei um porquinho-da-índia. Que dor de coração me dava Porque o bichinho só queria estar debaixo do fogão! Levava ele pra a sala Pra os lugares mais bonitos mais limpinhos Ele não gostava: Queria estar debaixo do fogão. Não fazia caso nenhum das minhas ternurinhas.... - O meu porquinho-da-índia foi a minha primeira namorada.”

5. A Evasão, A Utopia, A Busca de Elementos da Infância • A opressão da realidade, a impossibilidade de uma existência plena, a dificuldade financeira, aliada à doença e a uma solidão de base neo-romântica, têm como conseqüência vários poemas em que se procuram os bens perdidos: os entes familiares queridos, a saúde, a felicidade, a plenitude, o absoluto. O famoso Vou-me embora pra Pásargada é o melhor exemplo dentro dessa temática, onde se fundem elementos da infância com sonhos de adulto. É perceptível no poema a presença do surrealismo, através de imagens e comparações insólitas.

Evocação do Recife Recife / Não a Veneza americana Não a Mauritsstad dos amadores das Índias Ocidentais Não o Recife dos Mascates Nem mesmo o Recife que aprendi a amar depois – Recife das revoluções literárias / Mas o Recife sem história nem literatura Recife sem mais nada / Recife da minha infância A Rua da União onde eu brincava de chicote-queimado e partia as vidraças da casa de dona Aninha Viegas Totônio Rodrigues era muito velho e botava o pincenê na ponta do nariz Depois do jantar as famílias tomavam a calçada com cadeiras,mexericos, namorados, risadas A gente brincava no meio da rua Os meninos gritavam Coelho sai! Não sai! À distância as vozes macias das meninas politonavam Roseira dá-me uma rosa. (....)

A vida não me chegava pelos jornais nem pelos livros Vinha da boca do povo na língua errada do povo Língua certa do povo Porque ele é que fala gostoso o português do Brasil Ao passo que nós O que fazemos É macaquear A sintaxe lusíada A vida com uma porção de coisas que eu não entendia bem Terras que não sabia onde ficavam Recife... Rua da União... A casa de meu avô... Nunca pensei que ela acabasse! Tudo lá parecia impregnado de eternidade. (...)”

A Estrela “Vi uma estrela tão alta. / Vi uma estrela tão fria A Estrela “Vi uma estrela tão alta. / Vi uma estrela tão fria! Vi uma estrela luzindo / Na minha vida vazia. Era uma estrela tão alta / Era uma estrela tão fria Era uma estrela sozinha / Luzindo no fim do dia. Põe que da sua distância / Para a minha companhia Não baixava aquela estrela? / Por que tão alta luzia? E ouvi-a na sombra funda / Responder que assim fazia Para dar uma esperança / Mais triste ao fim do meu dia.” • A estrela é uma imagem obsessiva na poesia da Bandeira, metaforizando o absoluto, o inatingível, a luz que orienta, na mesma linha da poesia romântica e simbolista. • Algumas vezes, significa a mulher, sensual e distante, ansiosamente aguardada. • Nos últimos versos há ironia, pois a estrela reitera a sua distância insuperável, dando ao “eu” lírico uma esperança triste, uma vez que ele a contempla sem a menor possibilidade de aproximação.

6. Experiências concretistas O Concretismo, poesia de vanguarda que se firmou na década de 60, também mereceu a atenção de Bandeira. As poesias concretas trazem novas formas de expressão: valorização da forma e da comunicação visual, sobrepondo ao conteúdo. O poema da poesia concreta é chamado de poema-objeto por causa dos recursos estilísticos adotados: a eliminação de versos e a incorporação de figuras geométricas. Os poemas concretos possuem carga semântica, mas diferenciam-se por enfatizar o conteúdo visual e sonoro das palavras. A onda “a onda anda aonde anda a onda? a onda ainda ainda onda ainda anda aonde? a onda a onda”

Os Sinos “Sino de Belém, / Sino da paixão Os Sinos “Sino de Belém, / Sino da paixão... / Sino de Belém, / Sino da paixão... Sino do Bonfim!... / Sino do Bonfim!... Sino de Belém, pelos que ainda vêm! / Sino de Belém, bate bem-bem-bem. Sino da paixão – pela minha irmã! / Sino da paixão – pela minha mãe! Sino do Bonfim, que vai ser de mim? Sino de Belém, como soa bem! Sino de Belém parte bem-bem-bem. Sino da paixão... Por meu pai?... Não! Não! Sino da paixão bate bão-bão-bão. Sino do Bonfim, pateras por mim?... Sino de Belém / Sino da paixão / Sino da paixão pelo meu irmão. Sino da paixão, / Sino do Bonfim... Sino do Bonfim, aí de mim, por mim! Sino de Belém, que graça ele tem!”

7. Cotidiano • A poesia tem um tem pessoal, intimista, coloquial, sempre resvalando ou abordando diretamente o cotidiano. Testamento “(...) Criou-me, desde eu menino, Para arquiteto meu pai, Foi-se-me um dia a saúde... Fiz-me arquiteto? Não pude! Sou poeta menor, perdoai!” Poema do Beco “Que importa a paisagem. a Gloria, a baía, a linha do horizonte? - O que eu vejo é o beco.”

Neologismo “Beijo pouco, falo menos ainda Neologismo “Beijo pouco, falo menos ainda. Mas invento palavras Que traduzem a ternura mais funda E mais cotidiana. Inventei, por exemplo, o verbo teadorar. Intransitivo: Teadoro, Teodora.” A realidade e a imagem “O arranha-céu sobe no ar puro lavado pela chuva E desce refletido na poça de lama do pátio. Entre a realidade e a imagem, no chão seco que as separa, Quatro pombas passeiam.”

8. A Crítica Social e a Ironia Irene no céu “Irene preta Irene boa Irene sempre de bom humor. Imagino Irene entrando no céu: Licença, meu branco! E São Pedro bonachão: - Entra, Irene. Você não precisa pedir licença.”

Pensão familiar “Jardim da pensãozinha burguesa Pensão familiar “Jardim da pensãozinha burguesa. Gatos espapaçados ao sol. A tiririca sitia os canteiros chatos. O sol acaba de crestar as boninas que murcharam. Os girassóis amarelo! resistem. E as dálias, rechonchudas, plebéias, dominicais. Um gatinho faz pipi. Com gestos de garçom de restaurante-Palace Encobre cuidadosamente a mijadinha. Sai vibrando com elegância a patinha direita: - É a única criatura fina na pensãozinha burguesa.”