A hora da estrela Clarice Lispector.

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Clarice Lispector.  Clarice Lispector faz parte do Modernismo brasileiro, que começou com a conhecida Semana de Arte Moderna em  Clarice Lispector.
Informações sobre A hora da estrela (1977), de Clarice Lispector Prof. Marcel Matias.
Transcrição da apresentação:

A hora da estrela Clarice Lispector

Biografia “Que há de se fazer com a verdade de que todo mundo é um pouco triste e um pouco só”. “Passei a vida inteira tentando corrigir os erros que cometi na minha ânsia de acertar”. 1926 - Nasce na Ucrânia e recém-nascida vem para o Brasil com a família; 1934 – Muda-se de Recife para o Rio de Janeiro; 1943 – Forma-se na faculdade de Direito da Universidade do Brasil; 1944 – Casada com um diplomata brasileiro passa alguns anos fora do Brasil (Itália, Suíça e EUA) • 1959 – Separa-se do marido e volta ao Rio de Janeiro com os dois filhos; • 1977 – Morre de câncer, em dezembro, um dia antes de seu aniversário.

Principais obras Perto do Coração Selvagem (1944) A paixão segundo G.H. (1961) A hora da estrela (1977) Laços de Família (1960) A Legião Estrangeira (1964) Felicidade Clandestina (1971) Escreveu também crônicas e literatura infantil

Modernismo – 3ª Fase A autora, juntamente com Guimarães Rosa, empreende uma revolução na ficção brasileira. Linguagem: Face chocante do óbvio; Preferência por jogos metafóricos; Trabalho na clave do “como” ou do “como se” - “as coisas revivendo cheias de pressa como uma chaleira a ferver” A repetição é assumida como uma técnica e como um gosto pessoal Repetição binária: a história é história (p. 26); hoje é hoje (p. 27); Tudinho, tudinho!” (p. 63); “Tudo de repente era muito e muito…” (p. 90) Repetição ternária: é antes de tudo vida pri- mária que respira, respira, respira (p. 19); e pedirei música, música, música (p. 93); Rezava mecanica- mente três ave-marias, amém, amém, amém. (p. 42); Pensou, pensou e pensou! (p. 48); - Acredito sim, acredito, acredito… (p. 57); Não! Não! Não! (p. 88) Anáforas: … e havia o nunca e havia o sim. (p. 17); Antes de nascer ela era uma ideia? Antes de nascer ela era morta? (p. 35). Pleonasmo: tão vivo de vida (p. 18).

Um instante de epifania e a náusea “relato de uma experiência que a princípio se mostra simples e rotineira, mas que acaba por mostrar toda a força de uma inusitada revela- ção. É a percepção de uma realidade atordoante quando os objetos mais simples, os gestos mais banais e as situ- ações mais cotidianas comportam iluminação súbita da consciência dos figurantes, e a grandiosidade do êxtase pouco tem a ver com o elemento prosaico em que se inscreve o personagem. Em A hora da estrela tal instante epifânico surge quando Macabéa descobre que possui um futuro. A cartomante, fada madrinha às avessas, resolve dar a Macabéa um futuro, o que lhe revela uma outra reali- dade, um instante súbito de iluminação, mas que será interrompido pela morte (a hora de estrela) da protagonista. A comparação com animais (zoomorfismo) Ela ficou de cabeça inclinada para o ombro assim como uma pomba fica triste. (p. 58) — Um dia a pílula te cola na parede da garganta que nem galinha de pescoço meio cortado, correndo por aí. (p. 72) Como uma galinha de pescoço malcortado que corre espavorida pingando sangue. Só que a galinha foge — como se foge da dor — em cacarejos apavorados. E Macabéa lutava muda. (p. 92) Deitada, morta, era tão grande como um cavalo mor- to. (p. 97)

A marcação teatral No transcorrer da narrativa de A hora da estrela, aparece a expressão explosão entre parênteses, sempre que a personagem Macabéa vive um momento de grande emoção. O uso desse recurso indica a inesperada presença de marcação teatral — dramática — no texto narrativo.

A abertura do romance A hora da estrela é feita de maneira inusitada por meio de uma sequência de treze títulos nos quais o autor Rodrigo teria pensado antes de escolher um deles: A culpa é minha A hora da estrela Ela que se arranje O direito ao grito Quanto ao futuro Lamento de um blue Ela não sabe gritar Uma sensação de perda Assovio no vento escuro Eu não posso fazer nada Registro dos fatos antecedentes História lacrimogênica de cordel Saída discreta pela porta dos fundos

Os títulos podem ser agrupados em quatro conjuntos: O primeiro: A culpa é minha; Ela que se arranje; Ela não sabe gritar; Eu não posso fazer nada e Saída discreta pela porta dos fundos. É a tematização do sentimento de culpa. O segundo: O direito ao grito; Quanto ao futuro; Uma sensação de perda e Assovio no vento escuro. É a descrição da personagem oprimida. O terceiro refere-se à forma e temor da narrativa, que na busca de clareza correria o risco de ser trivial, mantendo-se popular: Lamento de um blue; Registro dos fatos antecedentes; Histórias lacrimogênicas de cordel. Finalmente, há um quarto conjunto. Refere-se a um instante íntimo da personagem – a morte. Mesmo numa condição abjeta e mesmo que seja penoso dizer isso, Macabéa tem, afinal, a sua Hora da Estrela.

Características da obra Emprego dos fluxos de consciência. Sondagem psicológica ( analisa profundamente a alma das personagens). Emprego do monólogo interior: ( o narrador conversa consigo mesmo). Emprego da metalinguagem. Epifania (Revelação).

Estrutura da obra

A hora da estrela, publicado em 1977, é o último romance de Clarice Lispector. Nele, a metalinguagem, o questionamento sobre a criação literária, as indagações sobre o ato de existir (a questão filosófica da existência, sintetizada na questão “Quem sou?”) e a existência de um ser absolutamente alienado da própria vida constituem os temas centrais da narrativa. O livro possui três narrativas que confluem: o drama de Rodrigo S.M., um escritor limitado que deseja narrar a história de Macabéa; a narrativa da vida de Macabéa e a história da própria composição da narrativa (metalinguagem). É importante saber que não ocorre o predomínio de uma história sobre a outra. Elas acontecem simultaneamente.

Os três narradores Rodrigo S. M., o narrador, é um escritor que não usufrui de prestígio ou de sucesso e deseja escrever um história simples, com enredo linear e vocabulário também simples. No afã de conhecer melhor sua personagem, a alagoana Ma- cabéa, Rodrigo S. M. procura se identificar com ela e, para isso, deixa de tomar banho e fazer a barba, quase não dorme, o que lhe confere um aspecto de cansaço; abandona qualquer atividade que lhe proporcione prazer. Acredita que agindo assim conseguirá descer até sua personagem, conseguirá atravessar o nojo do contato, para finalmente identificar e compreender a personagem e a si mesmo. Para ele, conhecer o outro é provar ainda mais da náusea, do asco que irmana todos nessa vida. Assim, o narrador informa ao leitor que escrever é sempre uma atividade dolorosa e que falar do outro é sempre uma forma de conhecer a si mesmo.

Macabéa nasceu no sertão de Alagoas e ficou órfã aos dois anos de idade. Foi criada por uma tia beata que a castigava constantemente. Aos dezenove anos veio para o Rio de Janeiro e conseguiu um emprego de datilógrafa, embora mal soubesse escrever. Divide um quarto alugado com mais quatro moças, e seus raros momentos de prazer resumem-se a ir ao cinema uma vez por mês e a pin- tar as unhas de vermelho. Como passatempo, Macabéa escuta na madrugada a Rádio Relógio Federal, que dá a hora certa e informações sobre os mais diversos assuntos, e costuma recortar anúncios de jornais. O anúncio de que ela mais gosta é o de um creme de beleza e imagina que, se um dia pudesse comprá-lo, ela não o passaria pelo corpo – iria comê-lo. Sonha também em ser uma estrela de cinema, como a atriz Marylin Mon- roe. Daí o título do livro e a ironia que ele contém, pois o momento culminante da vida de Macabéa (a hora de estrela) não tem nenhum glamour. Pelo contrário, será o momento de uma morte involuntária e sem nenhum brilho.

A terceira narrativa é de caráter metalinguístico, pois procura desvendar os segredos da criação literária. A começar pela “Dedicatória do Autor (Na verdade Clarice Lispector),” a autora procura apresentar para o leitor os processos de construção do texto literário. Clarice abandona sua identidade social para assumir a identidade do narrador, revelando, desse modo, os caminhos que um escritor percorre para compor sua história. Daí o fato de o narrador Rodrigo S.M. expor ao leitor, a todo instante, as agruras que enfrenta para poder construir sua narrativa. Afirma que a escolha de uma linguagem simples e de um enredo linear é a melhor solução para abordar a vida de uma moça pobre. Contudo, embora afirme logo no começo da história que dará início à narrativa da vida de Macabéa, ele faz antes uma série de observações sobre o processo de construção do texto, adiando a história da nordestina.

Narrador O romance é narrado por Rodrigo S.M., um narrador interposto, que reflete a sua vida ao personagem ao projetar-se na protagonista. Narrador onisciente e onipotente (ele está presente em tudo: apresenta-se como autor da obra, funciona como uma transfiguração da verdadeira autora). O narrador projeta seus pensamentos sobre literatura, desejos e decisões a respeito do destino da protagonista.

Tempo A época retratada é dos anos posteriores a 1950, percebendo aí a paixão da protagonista (Macabéa) pelas atrizes mais famosas de Hollywood, como Greta Garbo e Marylin Monrou. O tempo da narrativa está voltado mais para o psicológico.

Espaço A ação se passa no Rio de Janeiro, por umas poucas referências externas de ruas e locais característicos.

Ação O enredo não segue propriamente uma narrativa linear. Existem três polos que podem ser formados de certa forma como estruturas narrativas e que se misturam todo o tempo para formar narrativa. 1- Rodrigo conta a história de Macabéa. 2- Rodrigo conta sua própria história. 3- Rodrigo tece as artimanhas da própria narrativa para explicar criação, montagem e apresentação do próprio texto.

Personagens As personagens de Clarice Lispector são seres em busca da revelação de mundos desconhecidos dentro de si mesmos. Macabéa: É a protagonista do romance, moça nordestina e humilde que enfrenta a vida na cidade grande – Rio de janeiro – Orgulha-se de ser datilógrafa (embora medíocre) ; virgem, semi-analfabeta, gosta de goiabada com queijo e coca-cola. Quer ser estrela de cinema. Ouve notícias da Rádio – Relógio e não sabe empregá-las na conversação.

Rodrigo S. M. : É o narrador da história de Macabéa Rodrigo S.M.: É o narrador da história de Macabéa. Afirma que é escritor rico. Sente grande dificuldade para escrever e não consegue dar a sua personagem um destino melhor. Olímpico: É nordestino ambicioso e cheio de ilusões, possuidor de um passado sujo, vem também para a cidade em busca de ascensão social. Rouba os próprios colegas de trabalho. Foi namorado de Macabéa antes de conhecer Glória. Matou um homem antes de vir para o Rio. Gosta de fazer discursos e mentir. Quer ser deputado, o que acaba acontecendo segundo o narrador. Glória: É colega de Macabéa na firma. Cheia de Carne. Apesar de branca e cabelos oxigenados, não consegue esconder sua origem mulata. Rouba o namorado da colega, mas por se sentir culpada, aconselha a amiga a ir a busca de uma cartomante, emprestando-lhe dinheiro. Madame Carlota: É a cartomante que já foi prostituta e dona de bordel. Abusa da boa fé das pessoas lendo a sorte e predizendo o futuro. Serve de instrumento de felicidade para a protagonista por uns breves momentos. Outros Personagens: Seu Raimundo (chefe de Macabéa), as colegas de quarto de Macabéa e o Médico.

Sobre Macabéa a) Os primeiros aspectos definidores de Macabéa são os de sua modesta origem social (“Como a nordestina, há milhares de moças espalhadas por cortiços, vagas de cama num quarto, atrás de balcões trabalhando até a estafa”). Órfã, criada por um tia repressora, ela é feia, virgem, gosta de coca-cola, passa um pouco de fome e trabalha como datilógrafa no Rio de Janeiro. No entanto, o aspecto predominante de sua medíocre personalidade é o seu despreparo para a vida inteligente. É tão tola que sorri para as pessoas na rua, mas ninguém lhe responde ao sorriso porque sequer a olham. Sua própria cara expressa tanta pobreza mental que parece pedir para ser esbofeteada. Em síntese, trata-se de um ser ínfimo, de uma “alma rala”. b) A principal característica de Macabéa é a sua completa alienação. Ela não sabe nada de nada. A palavra realidade não lhe dizia nada. (...) Ela somente vive, inspirando e expirando, inspirando e expirando. (...) Nenhuma coisa importante jamais acontecera em sua vida: Mas vivia em tanta mesmice que de noite não se lembrava do que acontecera de manhã. (...). Domingo ela acordava mais cedo para ficar mais tempo sem fazer nada. (...)

A sua inconsciência não resulta apenas da ignorância do mundo A sua inconsciência não resulta apenas da ignorância do mundo. Ela se desconhece: “Quando acordava não sabia mais quem era”. Às vezes, diante do espelho, não se enxergava, como se a sua tivesse sumido. A todo instante, Rodrigo S. M. registra a alienação de Macabéa, a sua incapacidade de percepção. Por isso, a jovem nordestina vive a dimensão do não-ser. Algumas delimitações que Rodrigo S.M. elabora para Macabéa são tragicamente líricas: Ela era subterrânea e nunca tinha tido floração. Minto: ela era capim. (...) Tornara-se apenas vivente em sua forma primária. (...) Era apenas fina matéria orgânica. Existia. Só isto. c) Quase nula é a compreensão de Macabéa a respeito da existência, seja a sua, seja a da humanidade em geral.   Ao ser atropelada, Macabéa descobre a sua essência:“Hoje, pensou ela, hoje é o primeiro dia de minha vida: nasci”. Há uma situação paradoxal: ela só nasce, ou seja, só chega a ter consciência de si mesma, na hora de sua morte. Por isso antes de morrer repete sem cessar: “Eu sou, eu sou, eu sou, eu sou”.

Silêncio. Se um dia Deus vier à terra haverá silêncio grande Silêncio. Se um dia Deus vier à terra haverá silêncio grande. O silêncio é tal que nem o pensamento pensa. O final foi bastante grandiloquente para a vossa necessidade? Morrendo ela virou ar. Ar enérgico? Não sei. Morreu em um instante. O instante é aquele átimo de tempo em que o pneu do carro correndo em alta velocidade toca no chão e depois toca mais e depois toca de novo. Etc. etc. etc. No fundo ela não passara de uma caixinha de música meio desafinada. Eu vos pergunto: – Qual é o peso da luz? E agora – agora só me resta acender um cigarro e ir para casa. Meu Deus, só agora me lembrei que a gente morre. Mas – mas eu também? Não esquecer que por enquanto é tempo de morangos. Sim. Rodrigo S.M. afirma que morre com Macabéa e mais uma vez coloca o leitor como seu interlocutor, questionando-o sobre a grandiloquência do final da narrativa. O narrador faz uma descoberta e a compartilha com o leitor: o destino humano é igual para todos. É a consciência da morte que nos torna conscientes da vida. “Não esquecer que por enquanto é tempo de morangos.” Seria o “por enquanto” o tempo da vida e o “tempo de morangos” as possíveis delicadezas que podemos colher na vida? Não importa a resposta, o importante, parece insinuar o narrador, é que sejamos capazes de formular as perguntas.

Resumo da obra

Para quem está acostumado com resumos tradicionais, não é fácil fazer a síntese de A Hora da Estrela. Isso porque, aparentemente, nada acontece. Logo nas primeiras linhas, o que se percebe é a presença de um autor – o escritor Rodrigo S. M. – às voltas com certos impasses de sua carreira, tentando dar início à narrativa da história da nordestina Macabéa em sua vida cotidiana no Rio de Janeiro. Rodrigo S. M. declara: “Pensar é um ato. Sentir é um fato” – e essas frases podem ser entendidas como uma apresentação da obra. De fato, as reflexões e os sentimentos registrados pelo escritor constituem parte da narrativa. Portanto, se o leitor espera algo acontecer para começar a fazer a sua síntese do romance, é bom se apressar, porque a história já começou. Macabéa é introduzida aos poucos na narrativa, sobressaindo-se das reflexões de Rodrigo S. M. Ele se depara com ela em uma rua do Rio de Janeiro, quando, por intermédio de uma simples troca de olhares, a história da moça lhe é revelada. Alagoana, Macabéa perde os pais ainda muito criança e é criada por uma tia, que, no intuito de educá-la, dá-lhe constantes pancadas da cabeça com os nós dos dedos. Frequenta escola apenas até o terceiro ano primário e escreve muito mal. Mesmo assim, consegue levar adiante um curso de datilografia.  

A tia muda-se para o Rio de Janeiro e Macabéa a acompanha A tia muda-se para o Rio de Janeiro e Macabéa a acompanha. Arranja emprego como datilógrafa. Depois da morte da mãe de criação, passa a dividir um quarto de pensão com quatro moças que trabalham como balconistas. Pouco convive com elas, que chegam muito cansadas à noite e dormem logo, enquanto Macabéa fica ouvindo a Rádio Relógio ao longo das madrugadas.  Certo dia, resolve faltar ao trabalho e sair para um passeio. Encontra-se então com Olímpico de Jesus, metalúrgico nordestino. Ele a chama de “senhorinha” e a convida para um passeio. Para ela, é o começo de um namoro. Em suas conversas, ela exibe,  sempre de forma precária, o conhecimento adquirido com as audições da Rádio Relógio, enquanto ele afirma sua disposição de crescer e ser alguém na vida. Em uma visita a Macabéa no local de trabalho, Olímpico conhece Glória, colega da namorada. Interessa-se por ela e abandona Macabéa. Sem ter exata noção do quanto isso a faz sofrer, Macabéa recolhe-se ao banheiro do escritório e passa com força o batom vermelho nos lábios, para se sentir uma estrela de cinema. Constrangida por lhe roubar o namorado, Glória dá dinheiro a Macabéa e aconselha que ela procure uma cartomante. Macabéa acata a ideia e vai até Madama Carlota, que lhe prevê um futuro brilhante e o encontro próximo de um grande amor. Ao sair da cartomante, Macabéa morre atropelada. Os transeuntes se reúnem em torno dela, que se torna, pela primeira e última vez na vida, o centro das atenções. Como uma estrela de cinema.

Conclusão Assim, A Hora da Estrela assume a inventividade artística como metáfora da própria aventura existencial. Uma aventura renovada pelo leitor a cada novo ato de leitura. Fazendo da narrativa um jogo que incorpora a voz do outro, a transfiguração de identidade.