CARTA DE SÃO BRUNO A SEU AMIGO RAUL

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Transcrição da apresentação:

CARTA DE SÃO BRUNO A SEU AMIGO RAUL (Tradução dum monge da Cartuxa de Évora)

São Bruno (1030 - 1101)

Introdução

São poucos os que conhecem as origens da vocação do Fundador da Ordem Cartusiana, São Bruno.

É ele mesmo quem, na carta que dirige o seu amigo Raul, cônego como ele de Reims e depois arcebispo de dita cidade, nos abre o seu coração para que nós possamos apreciar até que ponto 'pulsava o seu coração de amor pelos bens celestiais'

Assim como a sua infatigável afeição pela Verdade e o Bem supremo, dois anseios estes pelos quais suspiram o monge e todo ser humano sobre a terra.

CARTA DE SÃO BRUNO A SEU AMIGO RAUL

Ao venerável senhor Raul, prepósito do Cabido de Reims, digno do mais sincero afeto, Bruno saúda.

A fidelidade que em ti se vê a uma velha e provada amizade é tanto mais admirável e digna de louvor quanto mais rara se encontra entre os homens. Pois, embora corporalmente afastados um do outro por grande distância de terras e prolongado espaço de tempo, estes não puderam arrancar-te o afeto do teu carinho para com o teu amigo.

Isso provou-se claramente pelas tuas cartas amabilíssimas, nas quais me manifestaste tão delicadamente a tua amizade, e pelos teus benefícios tão generosamente oferecidos, não só a mim, mas também por mim a frei Bernardo, e ainda por alguns outros indícios.

Por isso dou graças à tua bondade, não iguais aos teus méritos, mas que brotam da fonte pura do amor.

Mandei-te há algum tempo um correio com cartas, bastante fiel noutros envios; mas como até agora não voltou a aparecer, julgo oportuno enviar-te um dos nossos, que exponha de viva voz mais amplamente – como não poderia eu fazê-lo – o que me diz respeito.

Notifico-te, digno senhor, pois penso que não te desagradará, que estou bem de saúde no corpo – Oxalá assim o estivesse na alma! – e, no que se refere aos assuntos temporais, bastante bem à medida dos meus desejos.

Mas aguardo, suplicante, que a mão da misericórdia divina “cure todas as minhas enfermidades interiores e sacie de bens o meu desejo” (Salmo 102,3.5).

     Vivo nos confins de Calábria, num ermo bastante afastado por todos os lados das habitações dos homens, com os meus irmãos religiosos, alguns bastante eruditos, que, em permanente guarda santa, “esperam o seu Senhor a fim de lhe abrirem a porta, assim que ele chegar e bater” (Lc 12,36).

Da amenidade do lugar, do temperado e sadio dos seus ares, da vasta e graciosa planície que se estende ao longe entre montanhas, com os seus verdes prados e floridas pastagens, que poderei dizer de digno?

Como descrever suficientemente a perspectiva das colinas que de todas as partes se vão elevando suavemente, o retiro dos umbrosos vales, a agradável abundância de rios, regatos e fontes? Tão-pouco faltam hortas de regadio, e variadas e férteis árvores.

Mas, por que deter-me tanto tempo nestas coisas      Mas, por que deter-me tanto tempo nestas coisas? Outros são certamente os deleites do varão sábio, mais agradáveis e muito mais úteis, porque divinos.

Contudo, a nossa débil mente, fatigada por uma austera disciplina e pelos exercícios espirituais, muitas vezes com estas coisas se alivia e respira. Na verdade, o arco sempre tenso perde a força e torna-se menos apto para o seu ofício.

      O que a solidão e o silêncio do deserto proporcionam de utilidade e gozo divino a quem os ama, só o sabem os que o experimentaram.

      Aqui, com efeito, podem os varões esforçados recolher-se em si quanto queiram, e morar consigo, cultivar com afã os germes das virtudes, e alimentar-se com alegria dos frutos do paraíso.

Aqui se adquire aquele olhar, cuja visão clara fere de amores o Esposo e cuja pureza e limpidez permite ver a Deus.

Aqui se pratica um ócio bem ocupado, se repousa numa sossegada atividade (otium celebratur negotiosum... in quieta pausatur actione).

Aqui, pelo esforço do combate, dá Deus aos seus atletas a desejada recompensa: “a paz que o mundo ignora e a alegria no Espírito Santo” (Rom.14,17).

     Esta é aquela formosa Raquel, de belo aspecto, mais amada por Jacob, ainda que menos prolífera que Lia, a mais fecunda, mas de olhos sem brilho.

Porque são, com efeito, menos os filhos da contemplação que os da ação Porque são, com efeito, menos os filhos da contemplação que os da ação. Não obstante, José e Benjamim são mais queridos pelo pai que os outros irmãos.

Esta é aquela “melhor parte que Maria escolheu e que não lhe será tirada” (Lc 10,42).

Esta é aquela belíssima Sunamita, única encontrada em todo o Israel, que, virgem, pudesse cuidar e dar calor ao ancião David (cf. 1 Reis 1,2-3).

Oxalá, irmão caríssimo, tu a amasses unicamente a ela, para que ao calor dos seus braços te inflamasses de amor divino!

Se o seu amor assentar uma vez no teu coração, terás por vil a acariciadora e sedutora glória do mundo,

rechaçarás facilmente as riquezas que tanto inquietam e tão pesadas são à alma...

e aborrecerás os prazeres tão nocivos ao corpo como à alma.

    A tua prudência sabe quem disse: “Aquele que ama o mundo e o que está no mundo –voluptuosidade carnal, concupiscência dos olhos e ambição – o amor do Pai não está nele” (1 João 2, 15-16).

E também: “Quem quiser ser amigo deste mundo, torna-se inimigo de Deus” (Tiago 4,4).

Que coisa mais iníqua, mais própria duma alma insensata e louca, que coisa tão perniciosa e desgraçada, que querer hostilizar Aquele a cujo poder não podes resistir e de cuja justa vingança não podes escapar? Acaso “somos mais fortes que Ele? (1 Cor. 10,22).

Acaso, porque nos convida à penitência a sua paciente misericórdia, não castigará por fim a injúria do desprezo?

Que coisa há mais perversa, mais contrária à razão, à justiça e à mesma natureza, do que amar mais a criatura que o Criador, e perseguir mais o perecedouro que o eterno, o terreno que o celestial?

Que pensas fazer, caríssimo     Que pensas fazer, caríssimo? O quê, senão seguir o conselho divino, crer na Verdade que não pode enganar? A todos aconselha, ao dizer: “Vinde a Mim, todos os que estais cansados e oprimidos, e Eu vos aliviarei” (Mt 11,26).

Não é um trabalho péssimo e inútil ser atormentado pela concupiscência e afligir-se sem cessar com preocupações e ansiedades, temores e dores, por causa de tais desejos?

Que carga há mais pesada do que aquela que faz cair a alma da sublime altura da sua dignidade até ao mais baixo? Isto é a injustiça mesma!

     Foge, pois, meu irmão, de todas estas moléstias e misérias, e passa da tempestade deste mundo ao repouso seguro e tranqüilo do porto.

A tua prudência também sabe o que nos diz a mesma Sabedoria: “Se alguém não renuncia a tudo o que tem não pode ser meu discípulo” (Lc. 14,33).

Quem não vê quão formoso, útil e agradável seja permanecer na sua escola, sob a direção do Espírito Santo, e aprender a divina filosofia, a única que dá a verdadeira felicidade?

   Por isso é preciso que a tua prudência pondere com diligencia exame que, se o amor de Deus não te move, se a utilidade de tão grandes prêmios não te estimula, ao menos, deve impelir-te a isso o inevitável e terrível das penas.

Já sabes com que promessa estás ligado, e a Quem Já sabes com que promessa estás ligado, e a Quem. É todo-poderoso e terrível o Senhor a quem te entregaste como oferenda grata e inteiramente aceitável.

A Ele não te é lícito mentir nem convém que mintas, porque não sofre que se zombe d’Ele impunemente.

     Lembras-te, sem dúvida, amigo, como certo dia, estando juntos eu, tu e Fulcuio, o Monóculo, no pequeno jardim contíguo à casa de Adão, onde então me hospedava,

tratamos durante algum tempo, parece-me, dos falsos atrativos e das perecedouras riquezas do mundo, e dos gozos da glória eterna.

Então, ardendo de amor divino, prometemos, fizemos voto e decidimos abandonar em breve o mundo fugaz (fugitiva sæculi relinquere), para ir em busca do eterno (et æterna captare).

Te-lo-íamos feito em seguida, se Fulcuio não tivesse partido para Roma; por isso adiamo-lo para o seu regresso. Mas, atrasando-se ele e intervindo outras causas, o ânimo se resfriou e desvaneceu-se o fervor.

    Que te resta fazer, pois, caríssimo, senão libertares-te quanto antes dos laços de tão grande dívida?

Não seja que, por tão grave e tão prolongado pecado de mentira, incorras na ira do Todo-poderoso e, com isso, em terríveis tormentos.

Que poderoso soberano deixaria impune o ser defraudado por qualquer súdito seu num serviço seu prometido, sobretudo se para ele é de muita estima e preço?

     Assim, pois, crê-me, não a mim, mas ao profeta, ou antes, ao Espírito Santo, que diz: “Fazei votos ao Senhor vosso Deus, e cumpri-os, todos os que à sua volta trazeis oferendas: ao terrível que deixa sem alento os príncipes, e é terrível para os reis da terra” (Salmo 75, 12-13).

Ouves o Senhor ouves o teu Deus, ouves o Terrível que deixa sem alento os príncipes, ouves o Terrível para os reis da terra, por que inculca o Espírito Santo tudo isto senão para te urgir vivamente a cumprir o prometido no teu voto?

     Por que tens por pesado o que não produz nenhuma perda nem diminuição dos teus bens, e aumenta os teus lucros mais que os daquele a quem tu pagas?

Não te detenham, pois, as falazes riquezas que não podem remediar a necessidade, nem a tua dignidade de prepósito que não pode ser exercida sem perigo da alma.

És administrador, não dono do alheio És administrador, não dono do alheio. Converter em uso próprio o alheio, permite-me que to diga, seria tão odioso como injusto.

E se apeteces o brilho e a glória e ter muita criadagem, não te sucederá que, por não te bastarem os teus bens legítimos, necessites de qualquer modo arrebatar a uns o que repartirás pelos outros? Isso não é ser benfeitor nem liberal. Não há liberalidade onde não há justiça.

Quero, além disso, amigo, que te persuadas disto: a tua estreita amizade com o senhor arcebispo, que confia e se apóia muito nos teus conselhos – e não é fácil dá-los sempre justos e úteis – não te deve afastar do amor de Deus, que é tanto mais útil quanto mais justo.

Ora, que há tão justo e tão útil, tão inato e conforme com a natureza humana, como amar o bem? E que outro ser tão bom como Deus? Melhor ainda, que outro bem há senão só Deus?

Daqui que a alma santa, percebendo em parte o incomparável atrativo, esplendor e beleza deste bem, inflamada em chama de amor, diga: “A minha alma tem sede do Deus forte e vivo, quando irei ver a face de Deus?” (Salmo 41,3).

Oxalá, irmão, não desprezes o amigo que te admoesta Oxalá, irmão, não desprezes o amigo que te admoesta! Oxalá não dês ouvidos surdos às palavras do Espírito Santo! Oxalá, caríssimo, satisfaças o meu desejo e a minha longa espera, para que não sofra a minha alma por mais tempo preocupações, ansiedades e temor!

Pois, se acontecesse, o que Deus não permita, que antes de pagar a dívida do teu voto, partisses desta vida, deixar-me-ias sumido numa contínua tristeza e sem nenhuma consolação de esperança.

Por isso quero que tenhas como concedido e obtido de ti que, ao menos por devoção, te dignes vir a São Nicolau (1), e dali até nós, para que vejas quem singularmente te ama, [1] Em Bari, sudeste de Itália. A partir de 1089, em que foi levada a relíquia, tinham começado as peregrinações ao corpo de São Nicolau.

e possamos tratar, entre os dois, de viva voz, do estado das nossas coisas e da nossa observância religiosa, e também de outros assuntos de interesse comum.

E confio no Senhor que não te pesará teres-te submetido ao trabalho de tão longo caminho.

Ultrapassei os limites da brevidade epistolar porque, enquanto não posso ter-te presente corporalmente, ao menos permaneço conversando contigo mais tempo.

Desejo vivamente, irmão, que recordes o meu conselho e tenhas por muitos anos boa saúde.

Peço-te que me envies a vida de São Remígio (2), porque por estas terras é impossível encontrá-la. [2] Provavelmente a escrita por Hincmaro em 878.

Adeus.

Produzido por Dr. Dário A S Mattos Teólogo e médico psiquiatra dasmattos@yahoo.com.br

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