Yahweh como pastor

1. O termo “pastor” e sua utilização no Antigo Oriente Próximo É óbvio que a noção de pastor era originalmente aplicada aquelas pessoas que se dedicavam ao cuidado de animais não só no Antigo Oriente Próximo “Uma vez que, desde tempos remotos, a ocupação mais comum na Palestina era o pastoreio, o termo é fundamental para a descrição das pessoas do campo em todos os períodos da história” (Dicionário AT, p. 1438).

a atribuição do termo ao Deus dos hebreus não é uma exclusividade desse povo No Oriente antigo, já em data recuada “pastor” era um título de honra que se aplicava a soberanos e divindades de igual modo. Este uso da palavra se acha em forma estereotipada nas listas de reis sumerianos, nos registros da corte de Babilônia, e nos textos das pirâmides” (Dicionário NT, p. 1587)

Na literatura sapiencial egípcia, encontramos essa mensagem destinado ao rei e datada de cerca de 2000 a.C. Cuida do povo, que é rebanho do deus. Foi por amor aos homens que ele fez o céu e a terra e conteve a avidez das águas. Foi para que seus narizes vivam que ele fez o vento, uma vez que eles são semelhanças dele, saídos do seu corpo. É por amor a eles que ele surge no céu; para eles fez as ervas, os animais, os pássaros e os peixes, para que lhes saciem a fome.

Bosetti e Panimolle resumem a teologia do deus-pastor na Mesopotâmia e Egito: o conceito do deus bom, que cria por amor, e não por interesses egoísticos; o tema da providência divina: a bondade do criador se manifesta no dar a vida, mas também no conservá-la e no assegurar a ela condições para desenvolver-se;

o tema do socorro e da proteção: a confiança do crente se apóia na certeza de que o deus intervém, socorre e protege; o tema da imortalidade: o deus-pastor é aquele que assegura a vida também no além, que guia a julga com verdade também o belo Ocidente (a morada dos mortos).

Por fim, ainda na perspectiva “secular” do termo, o Theological Dictionary of the New Testament (p. 901), o dicionário arqueológico Jesus and His World (p. 251) e o Harper's Bible Dictionary (p. 941) apontam algumas características dessa profissão (e, em contrapartida, do próprio rebanho) em Israel.

por habitar uma terra extremamente árida, os pastores precisam percorrer áreas muito amplas para que seu rebanho pudesse encontrar água e alimento; por isso, a tarefa envolvia um risco considerável; normalmente os pastores eram membros da própria família (o proprietário mesmo ou seus filhos e filhas), ainda que pessoas pudessem ser contratadas para desempenhar a função;

4. o trabalho era considerado terrivelmente aborrecido, por isso exigia muita diligência e perseverança; 5. a posse de um rebanho podia oferecer uma conotação de poder; 6. ao mesmo tempo, o rebanho era uma fonte de riqueza (os proprietários extraíam dali a carne, o leite, a lã e o couro); 7. no sistema religioso sacrificial, as ovelhas eram as vítimas mais comuns.

2. A atribuição da metáfora de pastor a Yahweh Poucas são as nominações diretas de Yahweh como pastor do povo de Deus (Gn 19:24; 48:15; Sl 23:1; 80:2) No entanto, são inúmeras as alusões a atitudes pastorais tomadas por Deus

Yahweh lidera o seu povo, seu rebanho (Sl 68. 7; 23 Yahweh lidera o seu povo, seu rebanho (Sl 68.7; 23.3; 28:9; Jr 13:17; Ez 34:31) busca pastagens para ele (23.2; Jr 50.19); reúne o seu rebanho quanto este se encontra disperso (Zc 10.8); ele cuida do rebanho (Is 40.11); conduz o seu povo (Sl 80.2).

Quatro grandes funções ou papéis pastorais exercidos por Yahweh a) O pastor que guia  Aqui aparece a idéia de que o pastor é aquele que caminha à frente de suas ovelhas, abrindo e mostrando o caminho. Um bom exemplo é o do Salmo 77:20 – “guiaste teu povo como a um rebanho pela mão de Moisés e Arão”.

b) O pastor que provê Destaca-se aqui o papel exercido por Deus na provisão oferecida ao seu rebanho. Fala-se aqui não só do oferecimento de alimentos e de água, mas também da criação de um ambiente em que haja uma otimização das condições para que o rebanho possa crescer e se multiplicar. Devemos nos lembrar também que a provisão, na imagem do pastor do Antigo Oriente Próximo, também fala do suprimento de um lugar de descanso. O salmista é muito claro nesse sentido: nada me faltará (Sl 23:1).

c) O pastor que liberta  Aqui estão envolvidas as tarefas de defender e vigiar o rebanho. Mas isso não é feito apenas de maneira passiva, ou seja, como se Deus-pastor ficasse “esperando” o aparecimento do perigo para então proteger o seu rebanho, mas também de maneira ativa: Deus ativamente providencia o livramento de todo e qualquer perigo. Ele está totalmente envolvido com a tarefa de buscar a ovelha perdida, de reunir o rebanho disperso e de defender a ovelha mais fraca.

c) O pastor que liberta “O Pastor de Israel toma conhecimento da situação de falência e dispersão do povo que ele ama; envolve-se pessoalmente para fazê-lo passar da escravidão à liberdade e se entrega ao trabalho paciente de procurar e de reunir” (p. 36).

d) O pastor que se alia O Deus-pastor “se sente ligado afetivamente ao seu rebanho. Estabelece relações de conhecimento, amizade e de solidariedade para com as ovelhas.” (p. 22). Todo o vocabulário da aliança faz referência à relação afetiva desse Deus com o seu rebanho.