Carregar apresentação
A apresentação está carregando. Por favor, espere
1
GIL VICENTE O AUTO DA ÍNDIA
2
INTRODUÇÃO (Ana Paula Dias – Para uma leitura do Auto da Índia, de Gil Vicente)
Entre 1502 e 1536, Gil Vicente fez na corte o melhor teatro da Europa cristã da sua época, sob a forma de cinquenta autos. No princípio do período manuelino, o seu trabalho foi apoiado por D. Leonor, irmã de D. Manuel I e viúva de D. João II, protetora das artes. A D. Manuel sucede-se em 1521 o filho, D. João III, que tal como o pai e a tia, manda fazer teatro no paço. Os textos destes autos chegaram até nós através da Copilaçam de todalas obras, de 1562, póstuma e organizada por Luiz e Paula Vicente, filhos do autor e ainda através de alguns folhetos anteriores, impressos na vida do dramaturgo.
3
O Auto da Índia Esta peça, datada de 1509, uma das obras mais importantes de Gil Vicente, é o primeiro texto conhecido de teatro em que se conta uma história, se representa uma intriga, apresentando uma situação na qual se põem à prova tipos cômicos. Sete anos após se ter estreado na corte, com o Monólogo do Vaqueiro, o teatro vicentino apresenta-se substancialmente transformado, longe dos modelos espanhóis que lhe serviram inicialmente de inspiração e longe das até então vigentes representações litúrgicas (dramatizações de fragmentos narrativos do Evangelho ou hagiográficos), paródias, espetáculos mudos, das recitações e das alegorias, típicas da tradição teatral medieval.
4
O Auto da Índia Através de diversos processos linguísticos utilizados pelo autor para a geração do cômico, o autor procede a desmitificação de valores estandardizados, ligados à expansão militar e comercial até à Índia. Conciliando o repertório da tradição com uma atitude crítica face à problemática do seu tempo, o realismo da observação e uma extraordinária capacidade de análise, o autor criou um teatro original, adulto e completo, um grande documento literário que sobreviveu à sua geração e que ainda hoje se pode considerar atualizado – provando que é possível inovar e subverter mediante aproveitamento paradoxal da tradição.
5
LINGUAGEM, CÔMICO E SUBVERSÃO
Já no Prólogo do Cancioneiro Geral de Garcia de Resende é nítida a consciência de que à literatura pode estar associado um papel de intervenção crítica e moralização dos costumes, através da sátira – e, se quisermos recuar um pouco mais, podemos reportar-nos às velhas cantigas do escárnio e maldizer. É um lirismo de indignação; a sátira comporta sempre uma predicação moral purificadora e é evidente neles a intenção de mobilizar a indignação contra pessoas ou vícios. A crítica de costumes tem um forte enquadramento cômico. Este cômico, que parece ser o objetivo imediato da obra, é antes de tudo, um meio e um instrumento privilegiado de crítica social, com finalidade moralizadora. O Auto da Índia debruça-se sobre uma questão frequentemente tratada (nas farsas francesas dos séculos XV e XVI, por exemplo): as consequências da ausência do Marido, mas contando uma história nova, de atualidade (para os portugueses), introduzindo a realidade contemporânea no seu teatro.
6
FARSA A farsa é um texto cômico, de caráter burlesco; a farsa estrutura-se por definição, sobre uma situação que põe à prova tipos cômicos. Aliás, num texto que data verossimilmente de 1522, o próprio Gil Vicente distingue 3 categorias teatrais que o autor criou, a primeira foi a “moralidade”, seguida de “farsa” e, finalmente, da comédia. “Auto” parece surgir como uma designação geral para todos os textos dramáticos vicentinos. Algumas farsas vicentinas apresentam a ação através de cadeias de acontecimentos, que constituem verdadeiros entrechos – é o caso de O Velho da Horta, da Farsa de Inês Pereira e do Auto da Índia. A peça funda-se na exposição de uma intriga. Este entrecho não se constrói, no entanto, à semelhança do teatro clássico da Antiguidade (recuperado no Renascimento ...) pela progressão de uma acção que caminha para um desenlace, dividida em atos e cenas.
7
ESPECIFICIDADE VICENTINA
O que aparece em cena não é propriamente uma aventura que se desenrola ou um destino que se cumpre. Trata-se antes de um conjunto de quadros, reflexo de uma situação, que se oferecem aos olhos na sua realidade imediata, nem sempre seriados pela lógica narrativa do tempo; é frequente a inexistência de soluções de continuidade para os saltos temporais de que as ações representadas dão conta. Podemos distinguir no Auto da Índia, perfeitamente delimitados três momentos: o inicial, correspondente à partida da armada; o nodal, 3 dias depois, entre Ama, Lemos e o Castelhano, e o final, passados 3 anos que corresponde ao regresso do marido. Não há, no entanto, qualquer divisão em atos ou cenas que dê ao espectador a sensação do tempo decorrido; é a criada quem dá essas indicações fulcrais para a compreensão da história.
8
Contraste entre o ideal e a realidade
Muitos críticos viram neste Auto uma espécie de contraponto das ideias feitas, da moral corrente e da ideologia oficial, no qual os heróis do Oriente são reduzidos a dimensões de humana mediania, fazendo os maridos, os atraiçoados, enquanto estão ausentes – o “reverso do mito dos Descobrimentos”, como diz Paul Tessyer (Gil Vicente – o autor e a obra e La Langue de Gil Vicente) A dessacralização do matrimônio. É sabido que a tradição europeia consagrou, no plano literário, um ideal amoroso predominantemente espiritualista, de que algumas cantigas trovadorescas ou a obra de Petrarca são representativas: a mulher divinizada, o amor uma pura aspiração do sentimento, quase um culto ou uma religião, que excluía qualquer hipótese de realização em concreto. Para uma parte da poesia não passava do comprazimento num desejo insatisfeito ou de um meio de alcançar a Suprema Beleza No plano religioso, o ato matrimonial sacraliza o amor e fidelidade mútuos dos nubentes que o ritual católico documenta, quer pela palavra quer pela troca de alianças. Numa sociedade marcadamente cristã, patriarcal e monogâmica como a contemporânea de Gil Vicente, o matrimônio é o fim último do amor.
9
Os Lusíadas C IV, 89 Em tão longo caminho duvidoso
Por perdidos as gentes nos julgavam, As mulheres cum choro piadoso, Os homens com suspiros que arrancavam. Mães, esposas, irmãs, que o temeroso Amor mais desconfia, acrescentavam A desasperação e o frio medo De já nos não tornar a ver tão cedo.
Apresentações semelhantes
© 2025 SlidePlayer.com.br Inc.
All rights reserved.