Realismo-Naturalismo

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Transcrição da apresentação:

Realismo-Naturalismo revisão

Realismo e as Doutrinas Materialistas Pode-se dizer que o realismo artístico é uma reação às mudanças sociais e culturais ocorridas por decorrência da Revolução Industrial. A expansão do capitalismo, o urbanismo crescente, as relações de trabalho na indústria, etc. Para compreender a sociedade industrial, seus crescentes problemas (miséria, abusos dos patrões, etc.), tomaram força três doutrinas: O Comunismo – de Marx e Engels (o “Manifesto Comunista” é de 1848). O Liberalismo – de Adam Smith (final do séc. XVIII). A Economia – Thomas Malthus. (*)Doutrina é uma orientação do pensamento, a partir de um método, não necessariamente é uma ciência, mas um pensamento organizado.

Realismo e o Comunismo O “Manifesto Comunista” (1848) foi escrito por Karl Marx e Friedrich Engels e apresenta os seguintes tópicos: As relações de produção e trabalho DETERMINAM a estrutura da sociedade industrial (capitalista). O sistema capitalista OPRIME e CONDENA as classes trabalhadoras à MISÉRIA (inclusive intelectual pelo processo de massificação). O ideal comunista: seria que as pessoas (os trabalhadores – operários e camponeses) buscassem trabalhar juntas não para um patrão, para o lucro individual deste, mas para o bem coletivo.

Realismo e o Liberalismo O liberalismo doutrina a participação do Estado nas relações econômicas produtivas e comerciais. Da mesma forma dá bases para o capitalismo industrial, ao pregar liberdade aos anseios econômicos da burguesia crescente. Segundo Adam Smith (final do séc. XVIII): A função do Estado é apenas preservar a lei, manter a ordem e defender a nação, sem fazer qualquer tipo de intervenção na economia. O comércio e a indústria (no sentido de venda de produtos) deveria ter o direito de praticar a livre-iniciativa. Sociedade de grupos produtores e comerciários aparecem para defender os interesses liberais dos “patrões”.

Realismo e a economia Thomas Malthus vai evidenciar uma das questões mais discutidas pelos realistas: O descompasso entre o crescimento populacional e a produção de alimentos gera um estado de pobreza permanente. Para manutenção de um estado industrializado, seria necessário uma espécie de “seleção natural social”, alguns setores produtivos da economia anseiam que o estado não gaste dinheiro de impostos (pagos pelos próprios) com a população carente.

Uma conclusão – afastamento das idéias românticas: A subjetividade e a idealização romântica não conseguem explicar adequadamente – para a elite intelectual – os desafios do mundo industrial e a organização extremamente capitalista da sociedade. As doutrinas citadas anteriormente ditam as tendências do pensamento realista: o materialismo, a crítica social e a objetividade. A literatura realista é aquela que busca compreender como o indivíduo, dentro da organização social, comporta-se e pensa – e quais as consequências desse conjunto de comportamentos e pensamentos.

Realismo: de causas e consequências: O estado da sociedade e das relações humanas é causa e consequência da ação do homem (enquanto indivíduo, grupo ou coletividade) tanto no aspectos sociais (relações familiares, religiosas, de trabalho, etc.) quanto nos aspectos econômicos. A literatura realista quer detectar essas causas e revelar as consequências. causas consequências sociedade indivíduo sociedade

A estética Realista: Projeto literário do realismo: Os escritores realistas tratam dos seguintes TEMAS: ADULTÉRIO, A OPRESSÃO (do pobre, do “ignorante”, do religioso, enfim do indivíduo perante as instituições da sociedade) e a CORRUPÇÃO (tanto das instituições, quanto dos valores sociais e individuais) Estes TEMAS eram retratados da seguinte FORMA: com OBJETIVIDADE e CRITICISMO, sem apelar para fórmulas prontas ou modelos morais. O público leitor em geral vai desqualificar a obra realista mais incisiva por considerá-la IMORAL e INDECENTE.

Do indivíduo para a sociedade: Um aspecto de comum confusão é desconsiderar o papel do indivíduo no realismo: O ponto de partida do escritor realista quase sempre é o CARÁTER DO INDIVÍDUO, para entender suas causas e efeitos na sociedade. Este caráter é analisado sistematicamente (o “método realista” implicitamente revela as tendências cientificistas e doutrinárias da época) “Para entender a ‘anatomia do caráter’ humano, os autores realistas davam um tratamento diferente às personagens” A análise psicológica pode explicar o comportamento humano; As personagens são construídas de modo coerente com o contexto social, cultural, econômico e político que se inserem (determinismo social).

As diferentes técnicas: Eça de Queirós (português, 1845-1900): Usa narradores em 1ª e 3ª pessoa (mesmo quando participante, posiciona-se como um narrador objetivo) observando e criticando a sociedade. Seu alvos nos primeiros romances são: as instituições religiosas, os dogmas (casamento, por exemplo) e os valores burgueses relacionados a esses. Imprime em sua crítica forte caráter ideológico, sua “visão de mundo” parece condenar os vícios e erros do mundo. Essa postura pode ser compreendida como “moralista”.

As diferentes técnicas: Machado de Assis (brasileiro, 1839-1808): Na sua segunda fase, a do romance realista, ele emprega narradores em 1ª pessoa, que narram afastados de seus objetos (nos contos usa técnicas diversificadas). O narrador é crítico e irônico, porém, parcial: todas as vozes das personagens são (re)constituídas pelo narrador. Dialoga constantemente com o leitor, um jogo metatextual, para tentar conquistar a simpatia do outro – encobrindo seus defeitos e vícios. A mais abrangente crítica social, à burguesia, é legada ao leitor.

“Memórias póstumas de Brás Cubas” (cap. 9), Machado de Assis: Identifique as características apontadas anteriormente no seguinte trecho: “Memórias póstumas de Brás Cubas” (cap. 9), Machado de Assis: “(...)E vejam agora com que destreza, com que arte faço eu a maior transição deste livro. Vejam: o meu delírio começou em presença de Virgília; Virgília foi o meu grão pecado da juventude; não há juventude sem meninice; meninice supõe nascimento; e eis aqui como chegamos nós, sem esforço, ao dia 20 de outubro de 1805, em que nasci. Viram? Nenhuma juntura aparente, nada que divirta a atenção pausada do leitor: nada. De modo que o livro fica assim com todas as vantagens do método, sem a rigidez do método. Na verdade, era tempo. Que isto de método, sendo, como é, uma coisa indispensável, todavia é melhor tê-lo sem gravata nem suspensórios, mas um pouco à fresca e à solta, como quem não se lhe dá da vizinha fronteira, nem do inspetor de quarteirão. E como a eloqüência, que há uma genuína e vibrante, de uma arte natural e feiticeira, e outra tesa, engomada e chocha.Vamos ao dia 20 de outubro.”

“O enfermeiro”, Machado de Assis: Identifique as características apontadas anteriormente no seguinte trecho: “O enfermeiro”, Machado de Assis: “(...) Acordei aos gritos do coronel, e levantei-me estremunhado. Ele, que parecia delirar, continuou nos mesmos gritos, e acabou por lançar mão da moringa e arremessá-la contra mim. Não tive tempo de desviar-me; a moringa bateu-me na face esquerda, e tal foi a dor que não vi mais nada; atirei-me ao doente, pus-lhe as mãos ao pescoço, lutamos, e esganei-o. Quando percebi que o doente expirava, recuei aterrado, e dei um grito; mas ninguém me ouviu. Voltei à cama, agitei-o para chamá-lo à vida, era tarde; arrebentara o aneurisma, e o coronel morreu. Passei à sala contígua, e durante duas horas não ousei voltar ao quarto. Não posso mesmo dizer tudo o que passei, durante esse tempo. Era um atordoamento, um delírio vago e estúpido. Parecia-me que as paredes tinham vultos; escutava uma vozes surdas. Os gritos da vítima, antes da luta e durante a luta, continuavam a repercutir dentro de mim, e o ar, para onde quer que me voltasse, aparecia recortado de convulsões. Não creia que esteja fazendo imagens nem estilo; digo-lhe que eu ouvia distintamente umas vozes que me bradavam: assassino! assassino! Tudo o mais estava calado. (...)”

Naturalismo e as ciências No século XIX, exigiu novas técnicas e novas ferramentas para desvendar velhos mistérios da natureza: O que levou a um afastamento/corte/cisão definitiva entre o chamado racionalismo e a religiosidade. As principais formas científicas desenvolvidas à época foram: O Evolucionismo ou darwinismo > Charles Darwin O Determinismo ou tainismo > Hyppolyte Taine O Positivismo ou comtismo > Augusto Comte

O Naturalismo e o darwinismo: Com a publicação de “A evolução das espécies” de Charles Darwin, velhos conceitos religiosos, que sustentavam o poder da igreja e do estado – mesmo um estado burguês como o da França – foram abalados: A existência de um Deus criador do universo, da terra e do homem. A primazia do homem > o homem como finalidade da criação, alheio às “leis animais”. O homem participou e participa do processo de seleção natural > conceito aplicado às regras e hierarquias sociais.

O Naturalismo e o determinismo: Segundo Taine, o homem era condicionado moralmente e fisicamente por três fatores externos a ele, que são: Raça > “seu sangue é sua marca” Meio > “onde se cria é onde se vive” Momento > “você é marcado pelo que faz”

O Naturalismo e o Positivismo: Segundo Comte, o verdadeiro conhecimento é aquele que traz, materialmente, benefícios ao homem, esses benefícios (saberes, produtos, técnicas, etc.) tem de ser comprovados metodologicamente, cientificamente. O que afasta o homem do saber como que inspirado por Deus, valoriza-se o resultado do trabalho e não da religião. A idéias e os valores morais (idealização) são válidos apenas quando comprovados metodologicamente.

Naturalismo > Darwin > Freud O naturalismo, assim como o darwinismo e a psicanálise freudista revelam que o homem quase sempre é movido por: Desejos Instintos Sentimentos Esses aspectos superam a capacidade do homem de se controlar pela razão e de compreender-se, verdadeiramente, pelo saber científico.

A Estética Naturalista: do ambiente para a sociedade; da sociedade para o homem. Além das características já reveladas no realismo, pode-se dizer: O romance naturalista é considerado de tese, ou seja, ele emprega toda a sua narrativa (escolha de personagens, cenários, tempo, etc.) para provar que uma idéia determinista. A narrativa pode ser entendida como uma lâmina de estudos > junta-se os materiais necessários, sob as condições necessárias para provar determinada tese esperada.

Émile Zola, o pai do naturalismo: Zola é considerado o pai do Naturalismo, observe como se dá a sua literatura: Romance experimental Objetivos: Compreender o comportamento humano. Atuar na transformação do indivíduo. Para alcançar um melhor estado social

A personagem naturalista: No jogo de tese e experimentação, o personagem naturalista PERDEM O TRAÇO INDIVIDUAL: é apenas um animal de laboratório, que deve seguir um caminho pré-determinado para provar uma idéia determinista. As pessoas perdem a humanidade quando... Por seus instintos naturais. Personagem Naturalista Submetidas a condições (MOMENTOS E MEIOS) sub-humanas de vida e de trabalho Ao perder a humanidade, as pessoas são dominadas...

As técnicas do romance naturalista: O foco narrativo é em 3ª pessoa, um narrador quase sempre observador, ainda que não se exclua narradores participantes (1ª pessoa). O olhar é objetivo, descrevendo em minúcias as cenas, ações e personagens > a personagem é comparada com animais, sem profundidade psicológica.

“Casa de Pensão”, Aluísio de Azevedo Sentia a boca amarga e o corpo moído. Assentou-se na cama e circunvagou em torno os olhos assombrados, com a estranheza de um doido ao recuperar o entendimento. O sujeito magro da véspera lá estava no mesmo sítio; agora, porém dormia, amortalhado a custo num insuficiente pedaço de chita vermelha. Do lado oposto, no chão, sobre um lençol encardido e cheio de nódoas, a cabeça pousada num jogo de dicionários latinos, jazia o Paiva, a sono solto, apenas resguardado por um colete de flanela. Mais adiante, em uma cama estreita de lona, viam-se dois moços, ressonando de costas um para o outro, com as nucas unidas, a disputarem silenciosamente o mesmo travesseiro. O quarto respirava todo um ar triste de desmazelo e boêmia. Fazia má impressão estar ali: o vômito de Amâncio secava-se no chão, azedando a ambiente; a louça, que servira ao último jantar, ainda coberta de gordura coalhada, aparecia dentro de uma lata abominável, cheia de contusões e comida de ferrugem. (...) Num dos cantos amontoava-se roupa suja; em outro repousava uma máquina de fazer café, ao lado de uma garrafa de espírito de vinho. Nas cabeceiras das três camas e ao comprido das paredes, sobre jornais velhos e desbotados, dependuravam-se calças e fraques de casimira: em uma das ombreiras da janela havia umas lunetas de ouro, cuidadosamente suspensas de um prego. Por aqui e por ali pontas esmagadas de cigarro e cuspalhadas ressequidas. No meio do soalho, com o gargalo decepado, luzia uma garrafa. A luz franca e penetrante da manhã dava a tudo isso um relevo ainda mais duro e repulsivo: o coração de Amâncio ficou vexado e corrido, como se todos os ângulos daquela imundície o espetassem a um só tempo. Ergueu-se cautelosamente, para não acordar os outros, e foi à janela. O vasto panorama lá de fora estremulhou-lhe os sentidos com o seu aspecto.

“O Ateneu”, Raul Pompéia “Vais encontrar o mundo, disse-me meu pai, à porta do Ateneu. Coragem para a luta.” Bastante experimentei depois a verdade deste aviso, que me despia, num gesto, das ilusões de criança educada exoticamente na estufa de carinho que é o regime do amor doméstico, diferente do que se encontra fora, tão diferente, que parece o poema dos cuidados maternos um artifício sentimental, com a vantagem única de fazer mais sensível a criatura à impressão rude do primeiro ensinamento, têmpera brusca da vitalidade na influência de um novo clima rigoroso. Lembramo-nos, entretanto, com saudade hipócrita, dos felizes tempos; como se a mesma incerteza de hoje, sob outro aspecto, não nos houvesse perseguido outrora e não viesse de longe a enfiada das decepções que nos ultrajam. Eufemismo, os felizes tempos, eufemismo apenas, igual aos outros que nos alimentam, a saudade dos dias que correram como melhores. Bem considerando, a atualidade é a mesma em todas as datas. Feita a compensação dos desejos que variam, das aspirações que se transformam, alentadas perpetuamente do mesmo ardor, sobre a mesma base fantástica de esperanças, a atualidade é uma. Sob a coloração cambiante das horas, um pouco de ouro mais pela manhã, um pouco mais de púrpura ao crepúsculo — a paisagem é a mesma de cada lado beirando a estrada da vida. Eu tinha onze anos. Freqüentara como externo, durante alguns meses, uma escola familiar do Caminho Novo, onde algumas senhoras inglesas, sob a direção do pai, distribuíam educação à infância como melhor lhes parecia. Entrava às nove horas, timidamente, ignorando as lições com a maior regularidade, e bocejava até às duas, torcendo-me de insipidez sobre os carcomidos bancos que o colégio comprara, de pinho e usados, lustrosos do contato da malandragem de não sei quantas gerações de pequenos. Ao meio-dia, davam-nos pão com manteiga. Esta recordação gulosa é o que mais pronunciadamente me ficou dos meses de externato; com a lembrança de alguns companheiros — um que gostava de fazer rir à aula, espécie interessante de mono louro, arrepiado, vivendo a morder, nas costas da mão esquerda, uma protuberância calosa que tinha; outro adamado, elegante, sempre retirado, que vinha à escola de branco, engomadinho e radioso, fechada a blusa em diagonal do ombro à cinta por botões de madrepérola. Mais ainda: a primeira vez que ouvi certa injúria crespa, um palavrão cercado de terror no estabelecimento, que os partistas denunciavam às mestras por duas iniciais como em monograma.