O QUE É BELEZA João Francisco Duarte Jr.

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Transcrição da apresentação:

O QUE É BELEZA João Francisco Duarte Jr.

Necessidade, função e importância da experiência estética para o ser humano. Estética, hoje, designa qualquer conjunto de ideias (filosóficas) com o qual se procede a uma análise, investigação ou especulação a respeito da arte e da beleza; é uma parte da filosofia dedicada a buscar sentidos e significados para aquela dimensão da vida na qual o homem experiencia a beleza. Entre os antigos gregos o estudo do belo estava ligado à noção (divina) de Bem. As obras de arte eram objeto de consideração da poética, e apenas por volta de 1750 os conceitos de beleza e estética foram associados. Primeiramente Baumgarten, e depois Kant, passou também a empregar a denominação estética para o estudo da beleza.

Qual a nossa experiência face a determinados objetos que percebemos como belos? A experiência estética é aquela que temos diante de um objeto ao senti-lo como belo. Há dois tipos básicos de relacionamento que mantemos com o mundo: o prático e o estético. Na experiência prática com o mundo interessa-nos a função das coisas, e na experiência estética a sua forma, sua aparência. Beleza não diz respeito às qualidades dos objetos mensuráveis, quantificáveis e normatizáveis. Diz respeito à forma como nos relacionamos com eles. Beleza é relação (entre sujeito e objeto). A beleza é uma maneira de nos relacionarmos com o mundo, não tem a ver com formas, medidas, proporções, tonalidades e arranjos pretensamente ideais que definem algo como belo. A beleza, assim como a justiça, a liberdade, a democracia, o amor, etc., é, de certa forma, um conceito “ideal” (universal), um horizonte em direção ao qual caminham os objetos particulares que são “belos”.

Sentimento é sempre a primeira impressão que temos das coisas, é uma apreensão direta do mundo e de nós mesmos ainda não mediatizada pelos símbolos, pela linguagem. Sentimentos são evidências estruturadas da realidade, isto é, conscientizações da interação entre organismo e ambiente. São apreensões diretas da situação na qual nos encontramos, anteriores às significações lingüísticas e simbólicas, que fracionam tal situação em conceitos e os relacionam entre si.  Na experiência prática o sentimento acaba por subordinar-se aos processos intelectivos – simbólicos e conceituais. A experiência estética solicita uma mudança na maneira pragmática de se perceber o mundo. A experiência do belo é uma espécie de parêntese aberto na linearidade do dia-a-dia.

Os objetos estéticos são justamente aqueles construídos com o fim exclusivo de proporcionar ao seu “usuário” uma experiência estética. Não possuem nenhuma utilidade ou função a não ser esta: permitir a experiência da beleza.   O prazer estético que certos objetos utilitários nos fornecem está subordinado à sua verdade de uso (à sua função), e isto não configura uma experiência estética plena. A arte é sempre a criação (ou construção) de formas. Toda obra de arte é uma forma acabada, seja ela estática ou dinâmica. Tais formas são expressivas do sentimento (apreensão direta de uma situação, não mediada por símbolos lingüísticos ou quaisquer outros, expressão contida numa obra de arte). Nossa linguagem conceitual é impotente para descrever os sentimentos, nomeando-os apenas. Através da arte temos como que uma visão do mundo de nossos sentimentos, temos formas que os permitem “ver de fora” a inefável dimensão de nosso sentir. O que uma obra de arte nos exprime, o que ela nos permite é contemplar os sentimentos por meio de formas que guardam uma relação de analogia com eles.

Por isso a pergunta mais estúpida que se pode fazer a um artista é: o que você quis dizer com isso? Ora, ele não quis dizer, pois se o quisesse empregaria a linguagem (conceitual). Ele está justamente nos mostrando aquilo que não pode ser dito, que é inefável. O artista não diz, mostra.  Não se pode dizer o significado de uma obra, não se pode exprimir o que há nela de outra forma, a não ser por ela própria; não existem sinônimos no caso da arte. Se na linguagem o significado está “fora” das palavras, na arte ele está engastado, aderido à sua forma. A arte significa somente aquilo que existe em suas formas perceptivas, e que não pode ser expresso de nenhuma outra maneira. Por isso ela não nos transmite conceitos, que poderiam ser comunicados através de sinônimos, mas exprime sentidos a nível de sentimentos em suas formas mesmas. A arte seria melhor nomeada se disséssemos que ela é um “código expressivo”. Em essência, o que ocorre numa experiência estética é que nossos sentimentos são tocados, são despertados pelas formas do objeto e então vibram, dando-nos a conhecer a nós mesmos.

A questão do sentido (não-discursivo) expresso pela arte, desta maneira, passa fundamentalmente pelo espectador. Quer dizer: ele o apreende a partir de seu próprio jeito de sentir, a partir de seus gostos, cultura, preconceitos, etc. A percepção prática interroga o objeto em termos de utilidade. Já a percepção estética busca a verdade do objeto (não sobre ele), e a busca nele próprio, em suas formas, no seu aparecer. É no sensível – e não no conceitual, no intelectual – que reside o ser do objeto estético. Desta maneira é que a arte não possui utilidade: ela não a possui no mundo prático. A obra serve apenas para ser fruída, desfrutada, serve para despertar em nós a consciência e a vivência de aspectos do nosso sentir, com relação ao mundo. Langer: saber que o que está à nossa frente não tem significação prática no mundo é o que nos permite dar atenção à sua aparência como tal. Este é o motivo pelo qual alguns autores chamam a percepção estética de “desinteressada”, ou seja, por não haver nenhum interesse prático a guiá-la e orientá-la. No momento da experiência estética a imaginação não é livre para vaguear a seu bel prazer, ela segue os caminhos propostos pela forma estética, preenchendo-a com os sentidos provenientes do sentimento do espectador.

  Nossa percepção procura sempre compor, com os estímulos que lhe chegam, uma figura qualquer, uma “gestalt” que se torna o foco de nossa atenção. Gestalt = palavra alemã que se refere ao processo de dar forma, de configurar, ou seja, perceber as coisas numa configuração articulada. A mente humana diferencia, no campo perceptivo duas regiões, ou dois elementos, denominados “figura” e “fundo”. A figura é aquela forma sobre a qual se focaliza nossa atenção e que é percebida com a melhor estrutura possível, enquanto o que está à sua volta, o cenário que a circunda, constitui-se no fundo, que é percebido de maneira vaga e imprecisa, percebido como suporte para a figura. Ehrenzweig: há uma percepção inconsciente paralela à consciente; a experiência estética é uma espécie de jogo entre as duas. As formas percebidas inconscientemente mostram-se desarticuladas em relação às percebidas pela mente consciente, ou, pelo menos, possuem um tipo de articulação que não segue as tendências (gestálticas) da percepção consciente. Todos os seus elementos são apreendidos no mesmo plano de importância. A percepção consciente trabalha no sentido de eliminar uma série de elementos considerados como “perigosos” (desestabilizadores), que tendem a se transformar em representações (símbolos) de forças emocionais poderosas que vivem no inconsciente.

Ao percebermos algo (visual ou auditivamente) estas duas percepções trabalham juntas, porém só nos damos conta da percepção de superfície, gestáltica e articulada, enquanto todo o simbolismo projetado pelo inconsciente nas formas inarticuladas fica fora de nossa consciência (é reprimido). A percepção inconsciente não apenas capta elementos inarticulados com ainda pode fundir e justapor as formas dos objetos e as formas de suas partes, criando configurações ausentes de nossa realidade consciente, criando formas “sem coisas”. O prazer estético, o sentimento de beleza, advém desse conflito de percepções. Advém do trabalho redobrado da mente de superfície que buscando manter na consciência apenas os elementos não perigosos, constrói formas mais bem acabadas e plenas com a finalidade de, por elas e nelas, prender a atenção.

O sentimento de beleza surge em nós a partir do trabalho da mente de superfície para criar uma gestalt plena o bastante para ofuscar e subtrair do campo perceptivo as formas inarticuladas. Enquanto o sentimento plástico, que confere às coisas percebidas seu caráter de solidez e volume (seu caráter de “realidade”), provém da ação da consciência para se sobrepor à ausência de coisa verificada na percepção inconsciente. Sentimento do feio: feio por ultrapassado (a arte produzida antes mostra-se pálida e sem vida; os elementos inarticulados ali presentes se tornaram perceptíveis à mente da superfície e as obras deixaram de gerar tensão nos espectadores); feio por novidade (traz elementos já parcialmente articulados que geram uma enorme tensão no espectador). Langer: a obra de arte provoca em nós uma formulação de nossas concepções de sentimento e nossas concepções da realidade visual, factual e audível, em conjunto. Ela nos dá formas de imaginação e formas de sentimentos, inseparavelmente; quer dizer, ela clarifica e organiza a própria intuição.   Tem-se o caso de desprazer, ou de não-prazer (de indiferença), face a uma obra de arte devido a um não aprendizado anterior de seu código.