As Interrogativas em Ticuna: Propondo o Movimento Encoberto

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Transcrição da apresentação:

As Interrogativas em Ticuna: Propondo o Movimento Encoberto Rafael Saint-Clair Braga Mestrando POSLING-UFRJ Marília Facó Soares (Museu Nacional/Posling-UFRJ)

Os Ticunas - Magüta Ticuna, Magüta - aqueles que foram pescados Língua geneticamente isolada Grupo indígena que habita 3 países: Brasil: 35 mil(2008), Peru: 4.200 (1988), Colômbia: 4535 (1988), distribuído em 118 aldeias em 15 unidades territoriais. Língua tonal - materialização de 6 níveis fonéticos. Tipologia de Ordem Vocabular: SOV, SVO (clíticos), OVS Sistema [ACUS]-[OBJ]. TP como operador Aspectos Sintáticos (Aberta e Encoberta)

Interrogativas nas LIB KARAJÁ - Macro Jê (MAIA 1986) (1)Mo-bo kua weryry ritorunyre? PESS-QU aquele menino empurrou ‘Quem aquele menino empurrou’ XAVANTE - Macro Jê (OLIVEIRA 2003) (2) E wai-ma ma-i-tsõ tebe hã? Q-QU-PREP 3-2-dar peixe ENF ‘Para quem você deu o peixe?’ KAMAIURÁ - Tupí Guaraní (SEKI & BRANDON 2007) (3) Umam o’iran ere-o-n ? onde amanhã 2-ir-INTENT ‘Onde você vai amanhã’ TICUNA - Isolada (FACÓ SOARES 2000) (4) Peduro te’e-’ü̃ na-dau? Pedro quem-‘DAT’ 3-ver ‘Pedro viu quem?’

Diagnosticando palavras t- in-situ (Facó Soares 1992;2000) (1) Orações Relativas: estruturas nominalizadas (5) Yatü ya nü-’ü̃ tcha-dau-cü i ine rü ni-fene homem x 3P-DAT 1P-ver-NMLZR x ontem TOP 3P-caçar ‘O homem que eu vi ontem, foi caçar.’ (1.2) ya powae-cü x pescar-NMLZR ‘que pesca’ (pescador) (1.3) ga ngõ-cü x comer-NMLZR ‘que come’ (comedor) (1.4) ya ma-cü x matar-NMLZR ‘que mata’ (matador) n n v rootP  powae cü cü ngõ cü ma

Conclusão 1 Sendo construções nominais, não se pode estipular um nódulo CP para abrigá-las. Sem CP, não há um nódulo para o qual o NP possa ser movido ,e isso corrobora o fato de não haver extração desses NPs nas ‘orações relativas’ em Ticuna. (c.f.FACÓ SOARES 2000 : 149)

Sistema Interrogativo em Ticuna: diagnosticando palavras t- in-situ (6) Ta’cü i nü-’ü̃ qui-u-ü̃ i cuma? que x 3- ‘DAT’ 2-contar- NMLZR x 2P.S. ‘O quê você está dizendo?’ (7) Te’e ya ngema ngu-’e quem x DEIT chegar-NMLZR ‘Quem chegou aí?’ (8) ? Te’e-ü̃ nü-’ü̃ nai /j -dau-ü̃ [NPya Pedurui ] quem- ‘DAT’ 3- ‘DAT’ 3 - ver - NMLZR x Pedro ‘Quem foi que Pedro viu?’ ‘Quem foi que foi ver o Pedro?’ (9) Peduro te’e-ü̃ na-dau ? Pedro quem-‘DAT’ 3P-ver ‘Pedro viu quem’

-ü̃ Peduru te’e na-dau ? (8) [CPTe’e nü’ü̃i ] na-dau ti ya Pedurui ? [ Pedro quem-‘DAT’ 3P-ver Não pode haver dois constituintes na camada periférica (domínio do CP) portador de traço [+humano], “…podendo qualquer um dos dois ser tido como experienciador…”, neste caso o operador te’e e o clítico nü’ü̃. (ii) O clítico nü’ü̃ continua a exibir propriedades de co-indexação, não ao vestígio t, mas ao constituinte adjungido Peduru (Pedro) (iii) Omitindo-se o clítico nü’ü̃ temos o NP te’e imediatamente à esquerda do verbo. O Constituinte fica in-situ como em (8), portanto caso morfológico expresso através de morfema específico ü̃. (iv) Ocupando a posição de base, o constituinte te’ e checa Caso Acusativo-Objetivo que é o principal Caso estrutral da Língua Ticuna (vii) A própria opcionalidade da manifestação casual no constituinte /t-/.

Palavras /t-/ in-situ (9) Peduro te’e-ü̃ na-dau ? Pedro quem-‘DAT’ 3P-ver ‘Pedro viu quem’ Facó Soares (2000) (10) Tacü ni-Ĩ i Mecüracü te’e-’ü̃ na-ngu-ẽ-ü̃ o que 3P-ser, existir x quem-’DAT’ 3P-estudar-CAUS-NMLZR (O que é, Mecüracü causa/faz estudar a quem?) ‘O que Mecüracü ensina para quem?’ Facó Soares (2010) (11) Wüitchigü ya yatü rü tacü-’ü̃ na-dau Cada um x homem TOP que-‘DAT’ 3P-ver (No que diz respeito a cada homem, o que ele viu?)

Para uma Sintaxe em Forma Lógica (LF)

Traços do núcleo C em LF Ginsburg (2009:16) CP C’ C (…) “atribui escopo à palavra wh-” F [+Wh] F [+Qu] “torna um constituinte um elemento interrogativo.” Ginsburg (2009:16) “A Qu- feature is responsible for a construction becoming an interrogative. A Wh- feature is responsible for a wh- phrase having scope.”

Traço propostos anteriormente em Katz & Postal (1964) e Aoun & Li (1993)

LF Movement

Agregando evidências: Questões t- Múltiplas Efeitos de Superioridade Movimento ou para especificadores múltiplos de CP ou para uma ou mais projeções de IP. Quantificadores, palavras wh e escopo

Agregando evidências: Questões WH- Múltiplas Efeitos de Superioridade: Inglês Who __ saw what? b. *What did who see __ ?

Agregando evidências: Questões t- Múltiplas Ticuna a) Quem viu o quê? Te’e nü-ü̃i ta-dau i ta’cüi ? [mais comum] Quem 3P-‘DAT’ 3P-ver x que (Quem oi viu, o quêi?) Te’e i ta’cüi nü-ü̃i dau-ü? Quem x que 3P-‘DAT’ ver-NMLZR Te’e ni’ĩ nü-ü̃i dau-ü̃ i ta’cü? Quem 3P-ser, existir 3P-‘DAT’ ver-NMLZR x que b) Quem escreveu o quê? Te’e na-ümatü-ü̃ i ta’cü? Quem 3P-desenhar-NMLZR x que Te’e ta’cü ta-ümatü? Quem que 3P-desenhar (Quem desenhou o quê?) Te’e i ta’cü i ümatü-’ü̃ Quem x que x desenhar-NMLZR Ta’cü i te’e i ümatü-ü̃ ? Que x quem x desenhar-NMLZR

Agregando evidências: Questões t- Múltiplas Ticuna Palavras WH- antepostas em Ticuna não estão sujeitas a um ordenamento rígido. Absorção em IP ou CP: movimento WH- múltiplo pode ter lugar ou para especificadores múltiplos de CP ou para uma ou mais projeções de IP. Importante: “Sob a suposição de que tanto a absorção em IP quanto o scrambling local envolvem ou a adjunção a IP ou o movimento para múltiplos especificadores em IP, esse resultado tem um apelo intuitivo; se uma língua permite essa espécie de movimento, ela o usa para o scrambling e para o movimento wh-; se não, nem scrambling, nem absorção em IP serão encontrados”. RICHARDS (2001:16).

Scramblig local

Quantificadores, palavras t- e escopo Ticuna Extensão de opções interpretativas ao se tomar quantificadores como exemplos canônicos de operadores (SOARES, 2005) a) Wü‘itchigü i ngueü̃, nguerüü̃ na-wai Cada um x estudante professor(a) 3P-beijar (Cada estudante, professora beijou) Tradução: ‘Cada estudante beijou uma professora’. b) Wü‘i i ngueü̃ nguerüü̃ na-wai Um/ (cada) um x estudante professor(a) 3P-beijar Tradução: ‘Cada estudante beijou uma professora’. Quantificadores, palavras t- e escopo Os dados mostram que a extensão de opções interpretativas não é ilimitada em Ticuna. Dadas como sentenças sinônimas, (a) e (b) apresentam um quantificador que tem no seu escopo apenas o nominal que a ele se encontra ligado por uma das partículas que assinalam estruturas em adjunção.

Quantificadores, palavras wh- e escopo Ticuna ( i ) Wü‘i eü̃ na-wai Um/ (cada) um alguém 3P-beijar (Um/ (cada) um alguém beijou) ‘Cada um beijou alguém’ Inglês (ii) a. Everyone kissed someone b. Everyonex [someoney [ x kissed y]] c. Someoney [everyonex [x kissed y]] As possibilidades de uma dupla leitura de (iia) – possibilidades mostradas em (iib) e (iic) – derivam do fato de que um operador pode estar no escopo de outro, podendo-se inverter, sem restrições, a posição dos operadores. O Ticuna, entretanto, não apresentaria esse caráter de irrestrição ilimitada quanto a operadores, e uma sentença como (i) não seria ambígua.

Inglês: Escopo em LF  C CP QPk C’ TP  someone QPi T’ vP  everybody ti v’ v kissed tk

Inglês: Escopo em LF  C CP QPk C’ TP  someone QPi T’ vP  everybody ti v’ v kissed tk

Obrigado!

Referências Bibliográficas: BORER, Hagit (1981).Parametric variation in clitic constructions. PhD.MIT. Cambridge. CHOMSKY, Noam (1981). Lectures on Government and Binding. Mounton de Gruyter. _______________ (1995). The Minimalist Program.Cambridge. MIT Press. _______________ (2001). ‘Derivation by phase. In: M. Kenstowicz (ed.), Ken Hale: A Life in Language, Cambridge, MA: MIT Press, 1-52. FACÓ SOARES, Marília (2000). O Supra-segmental em Tikuna e a Teoria Fonológica. Volume I: Investigação de Aspectos da Sintaxe Tikuna. 1. Ed. CAMPINAS: UNICAMP, v.1.185p. (Livro baseado na Tese de Doutorado de Facó Soares, publicada em 1992) ______________, Marília(2008) . Língua/linguagem e tradução cultural: algumas considerações a partir do universo Ticuna. Boletim do Museu. Paraense. Emílio Goeldi. Ciências Humanas, Belém, v. 3, n. 1, p. 51-63, jan.-abr. _______________. Aspects de la modalité épistémique en ticuna. In: LANDABURU, J. & GUENTCHEVA, Z. (eds.) L’énonciation médiatisée II. Le traitement épistemologique de l’information: illustrations amérindiennes et caucasiennes. Louvain et Paris : Éditions Peeters, 2007. p. 219-240

_________________. Subespecificação tonal e tom default : o caso Tikuna. In : CABRAL, A.S.A.C. & RODRIGUES, A.D. (org.) Estudos sobre línguas indígenas I. Belém: UFPA, 2001. _______________. (2005) .Da representação do Tempo em Tikuna. In: CABRAL, A.S.A.C. & RODRIGUES, A.D. (orgs.) Novos Estudos sobre Línguas Indígenas.Brasília,Editora da Universidade de Brasília, 2005. p. 153-167. MAIA, M., FRANCHETTO, B., LEITE, Y., SOARES, M. Facó, VIEIRA, M. D. A (1999) estrutura da oração em líguas indígenas brasileiras. DELTA. Documentação de Estudos em Lingüística Teórica e Aplicada , p.1 - 26, MAIA, M., FRANCHETTO, B., LEITE, Y., SOARES, M. Facó, VIEIRA, M. D. Comparação de aspectos da gramática em líguas indígenas brasileiras. DELTA. Documentação de Estudos em Linguística Teórica e Aplicada , p.349 - 375, 1998. RICHARDS, Norvin (2001). Movement in language: interactions and architectures. Oxford University Press - OUP: Oxford Linguistics SEKI,L. & BRANDON, F.R. Uma reconstrução parcial do sistema interrogativo Tupi. In: CABRAL, A.S.A. e RODRIGUES, A. [org.] (2007). Línguas e Culturas Tupi. Campinas, Editora Curt Nimuendajú.