CONCEPÇÕES DE DOENÇA NA HISTÓRIA

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Transcrição da apresentação:

CONCEPÇÕES DE DOENÇA NA HISTÓRIA Profa. Melissa Rodrigues de Almeida Psicologia e Saúde I - UFPR

O QUE É SAÚDE? O QUE É DOENÇA?

Doença Para Canguilhem: povos variaram entre duas concepções na história Como ontogênica Doença como entidade (ontos) com vida própria que entra no corpo (sociedades primitivas, idade média) Como dinâmica Doença como alteração do estado de equilíbrio do corpo e busca do corpo pelo re-equilíbrio (gregos, medicina chinesa)

Histórico das concepções de saúde-doença Idade Média Doença como possessão , castigo divino, expiação de pecados (ontogênica) Transição feudal e capitalismo Medicina das espécies ou Medicina botânica ou Medicina classificatória: iniciam estudos de cadáveres, doença como entidade, nomeia e descreve (pneumonia, cirrose)

Histórico das concepções de saúde-doença Início século XVIII Alemanha: tendência de centralização da administração e da economia POLÍCIA MÉDICA John Peter Frank (1748-1821): clínico, educador médico e administrador de hospitais Estado se organiza para colocar a vida econômica e social a serviço de sua política de poder. Para isso, necessidade de conhecimento completo da população.

Histórico das concepções de saúde-doença Primeira metade século XIX Engels na Inglaterra, Virchow e Neumann na Alemanha, Guerin na França MEDICINA SOCIAL Estudos mostram inter-relações entre saúde e condições de vida Condições de vida aparecem como fator mais relevante

Histórico das concepções de saúde-doença Segunda metade do século XIX Deslocamento dos aspectos sociais para individuais da doença DOENÇA Descoberta de agentes etiológicos específicos (bacteriologia): UNICAUSALIDADE como paradigma explicativo Preocupação com biológico-individual: nova concepção de corpo Novas investigações: anátomo-patologia com visão qualitativa, localiza doença no corpo (Bichat), normal e patológico como opostos e fisiologia com visão do patológico como variação quantitativa do normal (Claude Bernard) Implantação de ações curativas na reparação de segmentos isolados da máquina corporal)

Histórico das concepções de saúde-doença Fim século XIX e Início século XX Crise do capitalismo + Movimentação de setores marginalizados + Condições de saúde precárias + Insuficiência do paradigma unicausal ENFOQUE MULTICAUSAL: Busca por fatores mais fáceis de atacar com medidas pouco custosas e implementação de medidas de controle Não busca causas necessárias, não toca nas causas estruturais, mas busca cortar cadeia causal

Histórico das concepções de saúde-doença Anos 50 MODELO DA HISTÓRIA NATURAL DA DOENÇA Causas se ordenam em três possíveis fatores Agente (substâncias ou elementos cuja presença ou ausência iniciam ou perpetuam processo patológico), Hóspede (ser humano e suas características) e Ambiente (condições e influências externas que afetam vida e desenvolvimento) Dois períodos Pré-patogênico: agente potencial, hospedeiro e ambiente em interação Patogênico: hospedeiro produz patogênese precoce que pode ser diagnosticada clinicamente → comparecimento da doença precoce → doença avançada → convalescença com recuperação, invalidez, estado crônico e morte Muitas críticas: estudos latino-americanos da Medicina Social

Histórico das concepções de saúde-doença Anos 70 MEDICINA SOCIAL: Causas da doença devem ser buscadas nos processos sociais, na produção e reprodução social Breilh, Laurell, Arouca, Vasco Uribe, Barros, Castelhanos

Doença tem um caráter social Tanto do ponto de vista macro quanto do indivíduo

DOENÇA COMO PROCESSO HISTÓRICO-ESTRUTURAL Natureza social da doença Não no caso clínico, mas no modo característico de adoecer e morrer nos grupos humanos Perfis patológicos Serão expressão das transformações na sociedade (Laurell)

Causação social da doença Três categorias: Causas sociais básicas Elementos sócio-estruturais da sociedade (classe, raça, sexo, educação) Causas sociais próximas Vizinhança, migração, ambiente de trabalho Causas sociais mediadoras Apoio social, redes sociais, estado civil

Relação entre Status sócio-econômico e Saúde Baixo status sócio-econômico está associado às 14 principais causas de morte Vários estudos (exemplos doenças infecciosas e coronarianas) Perfil epidemiológico sofre intensas alterações mantendo coerência com transformações sócio-econômicas associadas às conquistas químicas e farmacêuticas, melhora ou deterioração das condições ambientais e ampliação das práticas médico-assistenciais

Relações com o mundo do trabalho Dejours Condições de trabalho: condições químicas, físicas e biológicas do ambiente de trabalho Organização do trabalho: divisão técnica e social do trabalho Laurell Processo de trabalho Reprodução social

Doença como processo simbólico Estudos sobre percepção, atitudes, conhecimentos, crenças e representações Minayo: representações sociais de saúde podem abordar: Saúde-doença como expressão social e individual Saúde-doença como expressão das contradições sociais Saúde como campo de luta política

Muitos fatores interagindo DIMENSÕES ESTRUTURAL E SIMBÓLICA Crises interpessoais Relação com o trabalho Formas de apoio social Dimensão temporal na percepção dos sintomas

Conceito de Saúde da OMS É um estado de completo bem estar físico, mental e social e não meramente a ausência de doença. (1948) No entanto, “se sentir bem não é estado estático e depende de como o indivíduo se relaciona e interage com o meio ambiente social e natural”. “A percepção da própria doença é também influenciada pela cultura, pelo trabalho, pela riqueza” (Giovanni Berlinger)

Normal e Patológico: Canguilhem Normal não pode ser somente o estatisticamente prevalente e o patológico o que desvia Normal como valor da normatividade Capacidade que todo ser vivo tem de não apenas responder de maneira adequada às solicitações, mas de poder inventar novas normas de funcionamento para si quando a vida o exigir Patológico não é negação da saúde, mas uma normatividade reduzida Uma restrição na capacidade do indivíduo de agir criativamente face ás incertezas e acasos da vida.

Há graus de normatividade, não apenas saúde ou patologia Ter saúde não é igual a não ter sintomas. Saúde engloba a doença, é poder adoecer e se recuperar. Saúde significa a capacidade de suportar embates, sofrimentos, quedas, limitações e ir adiante, construindo novas formas de existência

Processo Saúde-Doença Seres humanos qualificam como patológicos certos estados ou comportamentos apreendidos em relação à polaridade dinâmica da vida sob a forma de valor negativo. Relação entre valores positivos e negativos no âmbito da vida se expressam nos pólos antagônicos da contradição normal-patológico. Critérios de normatividade são determinados pela vida concreta dos homens e grupos, expressa nos diferentes “modos de andar a vida”. (Canguilhem)

Processo Saúde-Doença Processo saúde-doença da coletividade É o modo específico pelo qual ocorre no grupo o processo biológico [psicológico] de desgaste e reprodução, destacando como momentos particulares a presença de um funcionamento biológico [psicológico] diferente para o desenvolvimento regular das atividades cotidianas, isto é, o surgimento da doença. Não qualquer grupo, mas construído conforme suas características sociais Processo saúde-doença adquire historicidade porque está socialmente determinado (Laurell)

Processo Saúde-Doença Processo biológico é também social (normalidade e anormalidade se definem em função do social) Caráter social e biológico não são contraditórios: PROCESSO ÚNICO Processo saúde-doença coletiva determina as características básicas sobre as quais assenta-se a variação biológica individual História social condiciona biologia do indivíduo e determina certa probabilidade de que se adoeça de um modo particular Efetivação ou não depende da análise do caso clínico, que tem sua especificidade

Determinação social do processo saúde-doença Insuficiências dos modelos Monocausal: doença como efeito de um único agente Multicausal: agnóstica, impossibilidade de conhecer a essência dos fenômenos Social com hierarquia distinta do biológico Cada formação social cria determinado padrão de desgaste e reprodução Esse padrão determina marco dentro do qual a doença é gerada Para compreender processo: classe social e processo de trabalho

Referências bibliográficas NUNES, Everardo Duarte. A doença como processo social. In: CANESQUI, Ana Maria (org.). Ciências Sociais e Saúde para o Ensino Médico. São Paulo: Hucitec, 2000. Leitura complementar: LAURELL, Asa. A produção social da saúde. (La salud-enfermedad como proceso social. Revista Latinoamericana de Salud, México, 2, 1982, pp. 7-25. Trad. E. D. Nunes) LUZ, Madel. Natural, Racional, Social: razão médica e racionalidade científica moderna. (Capítulo 5) 2. ed. rev. São Paulo: Hucitec, 2004.