Hospital Regional da Asa Sul (HRAS) Residência Médica em Pediatria Relato de Caso Bárbara Lalinka de Bilbao Basilio Médica-residente Pediatria Hospital Regional da Asa Sul Orientadora: Dra. Denize Bomfim Estado de Mal Epiléptico
Identificação e História DTB Sexo feminino 1 ano e 3 meses 10kg QP: “Convulsão há 2 horas”
Identificação e História HDA: 30/08/11: Febre (paracetamol) 31/08/11: Vômitos iniciados na madrugada. Levada ao Santa Luzia, admitida com febre (38,5ºC), examinada e prescrito Dipirona, Dimenidrinato e Pedialyte 45 01/09/11: Dois picos febris durante o dia 02/09/11: 04h00min: Reiniciaram vômitos, associados a irritabilidade (“parecia que estava vendo coisas”). Novamente levada ao Santa Luzia, examinada e prescrito Pedialyte 45 09h30min: Levada ao pediatra que a acompanha, examinada e prescrito Pedialyte 90 Meio-dia: Em casa, iniciou convulsão tônica 13h49min: Admitida no HRAS
Identificação e História AFEPS: Nascida de parto cesáreo (cesáreas prévias), 38 semanas 3660g, 49cm, PC: 35cm, Apgar 9/10 A positivo Ortolani negativo Reflexo Vermelho normal EOA (08/06/10): normal Vacinas de 15 meses desatualizadas (porém, vacinada contra Pneumo 10, Meningo C e Varicela) APP: Nega patologias prévias. Nega alergias medicamentosas
Identificação e História HF: Pai, 58, hígido Mãe, 35, hígida Irmã, 11, hígida Irmã, 9, hígida
Manifesta por contração muscular Admissão no HRAS Admitida às 13h49min, apresentando convulsão tônica, em postura de descerebração, pupilas midriáticas Convulsão Tônica Manifesta por contração muscular
Condução do Caso - HRAS Acesso venoso periférico Fase rápida de 200mL (20mL/kg) Colhidos exames, gasometria e hemocultura Glicemia Capilar: 150mg/dL Ceftriaxona (100mg/kg/dia) Aciclovir (10mg/kg/dose)
Condução do Caso - HRAS Duas dose de Diazepam Uma dose de Fenitoína (15mg/kg) Atropina, Midazolam (3 doses) e Rocurônio Intubação Orotraqueal Midazolam e Fentanil contínuos Manitol
Exames Realizados Hm: 3,98 Hg: 10,9 Ht: 32,1 VCM: 80,7 HCM: 27,4 CHCM: 34 2.400 (0/0/0/0/9/76/11/4) Plaquetas: 183.000 VHS: 23 Ca: 8,4 Mg: 2,5 Na: 145 K: 4,4 Cl: 109 Uréia: 32 Creatinina: 0,4 DHL: 660 Glicemia: 123 TGO: 50 TGP: 21 TC de Crânio
Exames Realizados Gasometria Arterial: pH: 7,328 pO2: 153mmHg pCO2: 34,9mmHg [HCO3]: 18,8mEq/L BE: -7 sO2: 99,6% Cloro: 119 Ânion Gap: Na – (Bic + Cl) = 146 – (18,8 + 119) = 8,2 Osmolalidade Sanguínea: 2Na + Glicemia/18 + Uréia/6 = 2x145 + 123/18 + 32/6 = 302 Lactato: 2,7 Acidose Metabólica Hiperclorêmica Ânion Gap Normal
Condução do Caso - HRAS Às 18h00min foi transferida à UTI do HBDF Óbito ocorreu às 13h33min do dia 07/09/11, no 6º DIH
Estado de Mal Epiléptico Status Epilepticus Estado de Mal Convulsivo
Estado de Mal Epiléptico Classificação Internacional de Crises Epilépticas: Crise epiléptica que dura 30 minutos ou mais Repetidas crises sem recuperação da consciência entre elas Shinnar et al. demonstrou que uma crise epiléptica que dure mais de 5 minutos tem grande chance de durar 30 minutos ou mais O atraso no início do tratamento tem impacto na sua resposta
Causas de Crises Epilépticas em Crianças e Adolescentes Etiopatogenia Causas de Crises Epilépticas em Crianças e Adolescentes Infecciosas Meningite, encefalite, neurocisticercose, abscesso cerebral, crise febril Neurológicas Lesões de parto, anomalias congênitas, doença cerebral degenerativa, encefalopatia hipóxico-isquêmica não progressiva, síndromes neuro-cutâneas, disfunção de derivação ventrículo-peritoneal Metabólicas Hipercarbia, hipocalcemia, hipoglicemia, hipomagnesemia, hipoxemia, erros inatos do metabolismo, deficiência de piridoxina Traumáticas ou Vasculares Concussão cerebral, acidente vascular encefálico, abuso à infância, trauma de crânio, hemorragia intracraniana Toxicológicas Álcool, anfetaminas, anti-histamínicos, anticolinérgicos, cocaína, monóxido de carbono, isoniazida, chumbo, lítio, hipoglicemiantes orais, fenotiazinas, salicilatos, simpatomiméticos, antidepressivos tricíclicos, teofilina, anestésicos tópicos, síndrome de abstinência a álcool e anticonvulsivantes Idiopáticas Epilepsia Obstétricas Eclâmpsia Oncológicas Tumores do SNC, metástases, hiperviscosidade
Etiopatogenia DeLorenzo et al demonstraram: 52% por infecções sistêmicas 21% baixos níveis de drogas antiepilépticas 38% causas remotas Em crianças no 1º ano de vida, as principais causas foram distúrbios metabólicos e infecções do SNC Medicamentos de venda livre e chás
Etiopatogenia - Glutamato - Aspartato - Acetilcolina - Ácido Gama-aminobutírico (GABA) - Cálcio dependente da corrente de potássio - Bloqueio dos canais N-metil-d-aspartato pelo magnésio (NMDA)
Por que é tão importante? A cada episódio ocorre perda neuronal! Com a despolarização neuronal, o cálcio entra pelos canais NMDA, causando lesão Hipóxia Liberação excessiva de aminoácidos excitatórios Aumento de várias proteínas (apoptose) Alterações nos receptores neuronais Alterações no lobo temporal
Marcadores de Lesão Neuronal RM: Edema leve Atenuação diminuída com apagamento dos sulcos Perda da diferenciação branca-cinzenta Enolase Neurônio-específica: Isoforma gama liberada no líquor e correlaciona-se com a duração e extensão da isquemia
Classificação Parcial Simples Parcial Complexa Generalizada Convulsiva Convulsões focais motoras ou sensoriais, contínuas ou repetidas SEM alteração da consciência Parcial Complexa Episódios contínuos ou repetidos de convulsões focais motoras, sensoriais ou cognitivas COM alteração da consciência Generalizada Convulsiva Tônico-clônica, tônica ou clônica, SEMPRE com alteração da consciência Generalizada Não-convulsiva (Pequeno mal) Caracterizada por alteração da consciência, mas não necessariamente inconsciência
Classificação Etiológica Reacional Febre ou alterações metabólicas (hiponatremia/hipocalcemia) Sintomática Aguda ou Remota Aguda: infecção, hipóxia, alterações glicêmicas ou eletrolíticas, trauma, hemorragia ou AVE Remota: injúria hipóxico-isquêmica perinatal, malformação cerebral congênita Idiopática
Complicações Sistêmicas Hipoxemia Ventilação deficiente, aumento do consumo de oxigênio, salivação excessiva, secreções traqueobrônquicas Acidemia Acidose láctica ou respiratória Alterações Glicêmicas Glicemia elevada no início do quadro, mas posteriormente ocorre queda (consumo)
Complicações Sistêmicas Alterações na Pressão Arterial No início do quadro há elevação da PA, FC, PVC e fluxo sanguíneo cerebral (este em 200-700%) Com o decorrer do tempo, ocorre diminuição da PA e do fluxo sanguíneo cerebral Aumento da Pressão Intracraniana Resultando em edema cerebral Outras Alterações Leucocitose Pleiocitose no líquor Contrações musculares: aumento da temperatura corporal, rabdomiólise (hipercaliemia), aumento de enzimas musculares, mioglobinúria, insuficiência renal aguda
Manejo Exame físico e neurológico “breves” Anamnese Doença sistêmica atual, febre ou infecção Sintomas neurológicos, infecções prévias Trauma Ingestão de medicamentos ou tóxicos Vacinação recente Doenças crônicas
Manejo Posição neutra da cabeça Estabelecer via aérea adequada Ventilação e circulação adequadas Oferecer oxigênio suplementar Acesso venoso Monitor cardíaco, oximetria e pressão arterial
Manejo Exames Laboratoriais Glicemia Glicemia Capilar Se hipoglicemia, push IV com Glicose 10% (5-10mL/kg) Eletrólitos, Cálcio e Magnésio Gasometria Arterial Hemograma e Bioquímica Toxicológicos de sangue e urina Nível sérico de drogas antiepilépticas
Manejo Em RN e crianças com intoxicação por isoniazida: Hemocultura Piridoxina (50-100mg IV ou IM) Hemocultura Punção Lombar (PL) Sinais de irritação meníngea Período pós-ictal prolongado ou alteração mantida da consciência Crises no período neonatal Indicações específicas nas crises febris Estudos metabólicos para Erros Inatos do Metabolismo
Manejo TC (realizada antes da PL) História ou sinais externos de trauma Doença neurocutânea Pacientes portadores de derivação ventrículo-peritoneal Sinais clínicos de hipertensão intracraniana Crises parciais Déficits neurológicos focais Pós-ictal prolongado Estados hipercoaguláveis (anemia falciforme, síndrome nefrótica) Doenças hemorrágicas (hemofilias ou outras deficiências de fatores de coagulação, plaquetopenia ou disfunção plaquetária) Estados de imunossupressão
Manejo RM Eletroencefalograma (se possível dentro de 2 horas após o controle da crise) Na primeira crise convulsiva não-provocada EME Não-convulsivo Atividade de crise refratária Desnecessário corrigir hiperglicemia Acidose metabólica normalmente se resolve com o controle das convulsões
Tratamento Medicamentoso Lorazepam (IV ou IM 0,05-0,1mg/kg/dose, DM: 4mg/dose) Diazepam (IV 0,2-0,4mg/kg, DM: 10mg/dose) (VR 0,5-1mg/kg/dose) Midazolam (IV 0,05-0,1mg/kg/dose, DM: 10mg/dose) (IM 0,1-0,2mg/kg/dose, DM: 5mg/dose) (IN 0,2-0,3mg/kg/dose, DM: 7,5mg/dose) Repetir até 3 vezes Fenitoína ou Fosfofenitoína (Ataque IV 10-20mg/kg) (Se uso crônico: 5-10mg/kg) (Infundir 50mg/min e não diluir em glicosado / Início de ação em 10-30min) Manutenção: 5-7mg/kg/dia (iniciar 12 horas após o ataque) Fenitoína Dose adicional de 5-10mg/kg Preferencialmente após IOT Fenobarbital (Ataque IV ou IM 20mg/kg, em 10 minutos) (Leva 15 a 20min para o início de ação) Manutenção: 3-5mg/kg/dia (iniciar 12 a 24 horas após o ataque)
Tratamento Medicamentoso Fenobarbital Dose adicional de 5-10mg/kg Em UTI Midazolam (IV contínuo: 1-18mcg/kg/min) (Iniciar com 1mcg/kg/min e aumentar, conforme a necessidade, de 1 em 1 a cada 5 minutos) Tiopental (IV em bolo 5mg/kg, DM: 500mg/dose) (IV contínuo 1-3mg/kg/hora) ou Propofol (5mg/kg/hora) (Não usar em crianças com dieta cetogênica) EME Refratário Alguns pacientes podem requerer anestesia geral e bloqueio neuromuscular
Manejo Algumas drogas antiepilépticas podem desencadear o estado de mal epiléptico (EME) ou piorá-lo: Fenitoína, carbamazepina, gabapentina, vigabatrina e lamotrigina Fenitoína x Cocaína
Estado Pós-ictal Sonolência Ataxia Confusão mental Irritabilidade Déficit focal (paresia de Todd)
Morbimortalidade Mortalidade segundo DeLorenzo et al. Morbidade: Mortalidade geral: 22% 2,5% em crianças Morbidade: Déficit motor focal Retardo mental Desordens comportamentais Epilepsia crônica
Referências Bibliográficas GRASSIOTTO, Cristina Quagio. Crise Epiléptica. In: SCHVARTSMAN, Claudio; REIS, Amélia Gorete; FARHAT, Sylvia Costa Lima. Pronto-socorro. 1. ed. Barueri: Manole, 2009. p. 297-307. MENDES, Mirian Fabíola Studart Gurgel. Crises Convulsivas e Estado de Mal Epiléptico. In: SILVA, Ana Cristina Simões e; NORTON, Rocksane de Carvalho; MOTA, Joaquim Antônio César; PENNA, Francisco José. Manual de Urgências em Padiatria. Rio de Janeiro: Medsi, 2003. p. 168-174. WILFONG, Angus. Management of status epilepticus in children. In: Disponível em: http://www.uptodate.com . Acesso em: 25 setembro 2011. WILFONG, Angus. Clinical features and complications of status epilepticus in children. Disponível em: http://www.uptodate.com . Acesso em: 25 setembro 2011.