Aborto O argumento pró-escolha de Michael Tooley Pedro Galvão Departamento de Filosofia Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa.

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Transcrição da apresentação:

Aborto O argumento pró-escolha de Michael Tooley Pedro Galvão Departamento de Filosofia Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa

Segundo Tooley, uma condição necessária para ter o direito à vida é ser consciente de si. Ora, como nem mesmo na fase final da gravidez o nascituro possui esta capacidade mental, segue-se que nenhum feto tem o direito à vida. Na verdade, nenhum recém-nascido tem ainda o direito à vida. Introdução

Tooley começa por examinar o próprio conceito de direito moral, afirmando a existência de uma conexão conceptual entre ter direitos e ter certos desejos: Direitos morais Atribuir um direito a um indivíduo é afirmar algo sobre obrigações prima facie que outros indivíduos têm no sentido de agir, ou de se abster de agir, de certa maneira. No entanto, as obrigações em questão são condicionais, estando dependentes da existência de certos desejos do indivíduo a quem se atribui o direito. Assim, se um indivíduo nos pedir para destruirmos uma coisa a que ele tem direito, não violaremos o seu direito a essa coisa caso a destruamos. Isto sugere a seguinte análise: «A tem direito a X» significa aproximadamente o mesmo que «Se A deseja X, então os outros estão sob uma obrigação prima facie de se abster de realizar acções que o privariam de X».

Os desejos, acrescenta Tooley, são estados de indivíduos dotados de consciência ou vida mental. Assim, se A deseja X, A é um sujeito de experiências e de outros estados mentais que tem a capacidade de desejar X. Direitos morais

Tooley elucida o conceito mais específico de direito moral à vida. Este direito está ligado ao desejo de continuar a viver. Mas desejar continuar a viver não é desejar simplesmente que o nosso organismo permaneça vivo: – Aquilo que desejamos realmente é que a nossa vida consciente não deixe de fluir, que continuemos a existir enquanto sujeitos de experiências e de outros estados mentais. O direito à vida, então, é o direito a continuar a existir desta forma (e não, por exemplo, em estado vegetativo persistente). Mais precisamente, «A tem o direito à vida» significará aproximadamente o mesmo que «Se A deseja continuar a existir enquanto sujeito de experiências e de outros estados mentais, então os outros estão sob uma obrigação prima facie de não o impedir de continuar a existir desta forma». Direito à vida

Coloca-se agora a questão de saber o que é necessário para ter o desejo em causa. A resposta de Tooley é a seguinte: Consciência de si Aqui a ideia básica é que os desejos que uma coisa pode ter estão limitados aos conceitos que ela possui.  …  Aplicar isto ao presente caso resulta na conclusão de que uma entidade não pode ser o tipo de coisa capaz de desejar que um sujeito de experiências e de outros estados mentais exista a não ser que possua o conceito de um sujeito desse género. Além disso, uma entidade não pode desejar que ela própria continue a existir enquanto sujeito de experiências e de outros estados mentais a não ser que acredite que ela própria é agora um sujeito desse género. Isto completa a justificação da tese segundo a qual uma condição necessária para uma coisa possuir um forte direito à vida é essa coisa possuir o conceito de um eu enquanto sujeito contínuo de experiências, e acreditar que ela própria é uma entidade desse género.

Ser consciente de si implica precisamente ser um indivíduo que se concebe a si mesmo como um sujeito contínuo de estados mentais — como alguém que existe ao longo tempo. Deste modo, os indivíduos destituídos de consciência de si não têm o desejo de continuar a existir enquanto sujeitos de estados mentais — o desejo sem o qual não há razão para lhes atribuir o direito à vida. E os fetos, manifestamente, não têm consciência de si. Portanto, os fetos não têm o direito moral à vida. Consciência de si

Tooley admite que o seu argumento exige algumas qualificações. Pensemos em pessoas que não desejam continuar a viver porque estão muito deprimidas, porque ficaram temporariamente em coma ou porque sofreram uma «lavagem cerebral». Tooley considera inaceitável julgar que estas pessoas, pelo facto de não terem agora o desejo relevante, estão privadas do direito à vida. Isso leva-o a qualificar a sua perspectiva inicial sobre o conceito de direito. Qualificações

 O  direito de um indivíduo a X pode ser violado não só quando ele deseja X, mas também quando ele agora desejaria X caso não se verificasse uma das seguintes situações: (i) ele está emocionalmente desequilibrado; (ii) ele está temporariamente inconsciente; (iii) ele foi condicionado para desejar a privação de X.

Ao introduzir estas qualificações, Tooley sujeita-se a uma objecção importante. Pois imagine-se que introduzimos apenas mais uma qualificação: Ora, normalmente os fetos desejariam continuar a viver se crescessem, tornando-se seres humanos adultos. Assim, com esta qualificação, obtém-se a conclusão de que afinal os fetos têm também o direito à vida. O desafio que agora se coloca a Tooley é explicar por que razão haveremos de aceitar as qualificações (i)-(iii), mas não a qualificação (iv). Qualificações O direito de um indivíduo a X pode ainda ser violado quando é verdade que (iv) ele desejaria X se crescesse, tornando-se um membro adulto da espécie racional a que pertence.