EDMUND HUSSERL e a FENOMENOLOGIA

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Transcrição da apresentação:

EDMUND HUSSERL e a FENOMENOLOGIA EDMUND HUSSERL, juntamente com BERGSON, exerceu e continua ainda exercendo a influência mais profunda e duradoura sobre o pensamento contemporâneo, foi discípulo de BRENTANO e estudou o psicólogo CARL STUMPF (1848-1936). Desenvolveu sua atividade acadêmica nas universidades de Halle, Goettingen e Friburgo de Brisgóvia. Como escritor de filosofia, é modelo de precisão e, neste particular, faz recordar ARISTÓTELES. Quanto ao seu sistema, depende, em parte, de BRENTANO e de STUMPF. Nota-se, em sua obra, uma certa influência neokantiana. Como um bom discípulo de Brentano, Husserl começou sua carreira com os estudos da matemática, tendo com primeiro trabalho publicado a Filosofia da Aritmética, obra que não prefigura o caminho por onde sua filosofia iria enveredar. Nos anos 1900-1901 apareceu sua obra principal, Investigações lógicas, na qual dirige a atenção para os fundamentos da lógica. Esta importante obra divide-se em duas partes: a primeira, os Prolegômenos à lógica pura, contém uma critica do psicologismo e do relativismo, de um ponto de vista intelectualista e objetivista, e a segunda parte mostra a aplicação dos princípios enunciados na primeira a alguns problemas particulares da filosofia da lógica.

Em 1913, Husserl , publica as Idéias relativas a uma fenomenologia pura. Aqui a fenomenologia converte-se numa “filosofia primeira” e aplica-se ao estudo do conhecimento em geral, tornando-se já patentes as conclusões idealistas. Estas conclusões encontram seu pleno desenvolvimento nos dois livros seguintes: Lógica formal e transcendental (1929) e Experiência e Juízo (1939). Globalmente considerados o caminho seguido pelo pensamento de HUSSERL, pode resumir-se da seguinte maneira: partindo do estudo filosófico da matemática, desenvolve primeiramente um método objetivista e intelectual e, na aplicação deste método à consciência, desemboca no idealismo. A influencia de HUSSERL se faz presente em várias direções. Em primeiro lugar, as análises presentes suas Investigações lógicas representam um sério golpe no positivismo e no nominalismo, que imperavam no século XIX. Ao mesmo tempo, seu método, que sublinha o conteúdo e a essência do objeto, contribuiu para a elaboração de um pensamento antikantiano. Sob este aspecto, é um dos grandes pioneiros da nova filosofia. Por outro lado, criou um método (a fenomenologia), amplamente utilizado por grande parte dos filósofos do Século XX.

A CRÍTICA AO NOMINALISMO Husserl, em suas Investigações lógicas, submeteu à uma crítica rigorosa o nominalismo que, sob o nome de empirismo, de psicologismo, etc., invadia, desde Locke e Hume, quase toda a filosofia. Segundo os nominalistas, as leis lógicas seriam generalizações empíricas, e indutivas, comparáveis às leis das ciências da natureza, e o universal seria somente uma representação esquemática. Husserl mostra que as leis lógicas embora não são, em si, as regras gerais do pensamento, e que a lógica tampouco é ciência normativa, sirva de base a uma disciplina normativa. De fato, a lei lógica nada. diz sobre o "dever", mas diz alguma coisa sobre o "ser". O principio de contradição, por exemplo, não diz que não seja possível enunciar duas proposições contraditórias, mas afirma simplesmente que uma e a mesma coisa não pode possuir predicados que se contradigam. Partindo destes princípios, Husserl ataca o psicologismo, segundo o qual a lógica seria um ramo da psicologia. O psicologismo está equivocado, sob duplo aspecto, a saber: a) Primeiro, se ele fosse verdadeiro, as leis lógicas teriam o mesmo caráter vago que as leis psicológicas, seriam, quando muito, prováveis e pressuporiam a existência de fenômenos psíquicos - o que é absurdo. Pelo que, as leis lógicas pertencem a uma ordem inteiramente diferente: são leis ideais, aprióricas. b) Segundo, o psicologismo falseia completamente o sentido das leis lógicas. Ou seja, estas nada têm que ver com o pensamento, o juízo, etc., mas referem-se a algo objetivo. O objeto da lógica não é o juízo concreto de um homem, mas o conteúdo deste juízo, sua significação, que pertence a uma ordem ideal.

Finalmente, o fundador da fenomenologia entra também em conflito com o nominalismo em sua teoria da abstração. Mostra ele que o universal nada tem que ver com uma representação generalizada. O que podemos nos representar, quando apreendemos um termo matemático por exemplo, quase não tem importância. Locke, Hume e seus sucessores, incapazes de compreender objetos ideais, hipostasiaram o universal, convertendo-o falsamente em mera imagem. Mas não existe tal coisa. O universal é, na realidade, um objeto de natureza muito peculiar, um conteúdo ideal universal.

A DOUTRINA DA SIGNIFICAÇÃO A crítica ao nominalismo é uma das maiores contribuições de Husserl à filosofia do século XX e, ao mesmo tempo, um retorno aos grandes pensamentos ontológicos da Antigüidade e da Idade Média. Ela serve de fundamento à tese de que a lógica possui domínio próprio, a saber, o domínio das significações. Quando compreendemos um nome ou uma proposição, o que uma ou outra expressão enuncia não é propriamente o equivalente de uma parte do ato intelectual correspondente. È, antes, a significação. Diante da diversidade infinita das experiências individuais, há sempre aquilo que nestas é expresso, ou seja, um Idêntico no sentido estrito da palavra. Mas o termo "exprimir" é equívoco. Podemos distinguir nele pelo menos três funções diferentes: O que a expressão "põe de manifesto" (a saber, o psíquico, as vivências psíquicas); O que "’significa", com uma nova distinção: a) o sentido, o conteúdo do conceito; b) o que o termo designa. 3. Por último, os atos que atribuem a significação e os atos que a preenchem). Estes últimos conferem ao ato a plenitude intuitiva; os primeiros contém unicamente o essencial da expressão, mas não subministram “preenchimento” intuitivo da intenção de significação.

Com a teoria da significação Husserl prende-se a uma gramática pura, a teoria filosófica da gramática. Neste, como em muitos outros domínios, Husserl introduziu valiosos enriquecimentos que a lógica matemática permite hoje apreciar. Esta deve-lhe, entre outras coisas, a noção da categoria semântica

O MÉTODO FENOMENOLÓGICO Ao propor o Método Fenomenológico, Husserl pretende livrar-se de todas as pressuposições dogmáticas para estabelecer uma base segura para todas as ciências e, de modo especial, para a filosofia. Nesta direção, a primeira e mais fundamental fonte de todas as afirmações racionais é a visão, ou também, como ele desígna, “a consciência doadora originária”. Da visão (ou da consciência doadora originaria) avançamos as próprias coisas. Esta é a regra primeira e fundamental do método fenomenológico. Por “coisas” entende-se simplesmente os dados que se apresentam à consciência, ou seja, aquilo que vemos ante nossa consciência. Esta “coisa” dada chama-se fenômeno, no sentido de que aparece diante da consciência, o que não significa que algo desconhecido se encontre encoberto atrás do fenômeno. O fenômeno é a própria coisa que se revela, que se mostra à consciência. A fenomenologia não se ocupa disso, só visa o dado, sem querer decidir se este dado é uma realidade ou uma aparência: haja o que houver, a coisa está aí, é dada à consciência, é um fenômeno. O método fenomenológico não é dedutivo nem empírico indutivo. Consiste em mostrar o que é dado e em esclarecer este dado. Não explica, indutivamente, mediante leis e nem deduz a partir de princípios pressupostos aprioristicamente, mas considera imediatamente o que está perante a consciência, procurando pela compreensão do objeto que se dá à consciência.

Deste modo, a Fenomenologia não pretende explicar o mundo e as coisas do mundo, mas compreender o mundo e suas realidades fenomênicas. Assim, a fenomenologia tem uma tendência orientada totalmente para a realidade objetiva dos fenômenos. Interessa-lhe não o conceito subjetivo, nem uma atividade do sujeito (se bem que esta atividade possa igualmente tornar-se em objeto da investigação), mas aquilo que é sabido, posto em dúvida, amado, odiado, etc. Mesmo nos casos em que se trata de uma representação pura, é preciso distinguir entre o imaginar e o imaginado: quando, por exemplo, nos representamos um centauro, este centauro é um objeto que importa distinguir cuidadosamente de nossos atos psíquicos. De igual modo, uma nota musical, o número 2, uma figura geométrica, etc., são objetos, não atos psíquicos. Mas os positivistas cometem, segundo Husserl, erros grosseiros, dos quais temos que nos livrar, se quisermos chegar à verdadeira realidade. Eles confundem o ver em geral com o ver meramente sensível e experimental. Não compreendem que cada objeto sensível e individual possui uma essência. Sendo o individual, enquanto real, acidental, ao sentido deste acidental corresponde precisamente uma essência ou, como diz Husserl, um eidos que precisa ser captado diretamente.

Existem, portanto, duas espécies de ciências: ciências dos fatos, ou fácticas, que se limitam à experiência sensível, e ciências de essências ou eidéticas, às quais compete a intuição essencial, a visão do eidos. Mas todas as ciências de fatos se baseiam em ciências de essências, porque, em primeiro lugar, todas utilizam a lógica e em geral também a matemática (ciências eidéticas) e, em segundo lugar, cada fato alberga uma essência permanente. As ciências matemáticas são manifestamente ciências eidéticas. A filosofia fenomenológica pertence à mesma espécie: seu objeto é constituído não por fatos contingentes, mas por conexões essenciais. É puramente descritiva, e seu método consiste, antes de mais nada, em descrever a essência. Seu processamento é um esclarecimento gradual, que progride de etapa em etapa mediante a intuição intelectual da essência. Ao abordar os fundamentos da ciência ela é “filosofia primeira” e procede com uma ausência total de preconceitos. Ao mesmo tempo, é ciência exata e apodíctica. Seu exercício não é fácil; todavia, Husserl e seus discípulos mostraram que o método fenomenológico abre vasto campo a investigações extraordinariamente fecundas.

A EPOCHÉ E A REDUÇÃO EIDÉTICA Para alcançar seu objeto próprio, o eidos, a fenomenologia deve praticar não a dúvida cartesiana, mas a denominada epoché. Isto quer dizer que a fenomenologia “coloca entre parêntesis” certos elementos do dado e se desinteressa deles. Importa distinguir várias espécies destas reduções. Em primeiro lugar, a epoché prescinde de todas as doutrinas filosóficas; ao fenomenólogo não interessam as opiniões alheias; ele investe contra as próprias coisas. Após esta eliminação preparatória, temos a redução eidética, mediante a qual a existência individual do objeto estudado “é colocada entre parêntesis” e eliminada, porque para a fenomenologia não interessa outra coisa que não seja a essência. Eliminando a individualidade e a existência, eliminam-se igualmente todas as ciências da natureza e do espírito. O próprio Deus, enquanto fundamento do ser, deve ser eliminado, igualmente a lógica e as demais ciências eidéticas ficam submetidas à mesma condição. Assim, a fenomenologia considera tão somente a essência pura e põe de lado todas as outras fontes de informação. À redução eidética acrescenta-se a redução transcendental. Esta consiste em por entre parêntesis não só a existência, senão tudo o que não é correlato da consciência pura. Como resultado desta última redução, nada mais resta do objeto além do que é dado ao sujeito. Para bem compreender a teoria da redução transcendental, é necessário que examinemos agora a doutrina da intencionalidade, que lhe serve de base.

A REDUÇÃO TRANSCENDENTAL E A INTENCIONALIDADE DA CONSCIÊNCIA A redução transcendental é a aplicação do método fenomenológico ao próprio sujeito e a seus atos, pois o domínio da fenomenologia precisava ser constituído com diferentes regiões do ser. Uma destas regiões do ser é a própria consciência pura. Chega-se a esta consciência pura mediante o conceito de intencionalidade, que Husserl recebeu de Brentano e da escolástica. Entre as vivências da consciência sobressaem algumas que possuem a propriedade essencial de ser vivências de um objeto. Estas vivências recebem o nome de “vivências intencionais”, e na medida em que são consciência (amor, apreciação, percepção, valoração, etc.) de alguma coisa, diz-se que tem uma “relação intencional” com esta coisa. Aplicando a redução transcendental (ou redução fenomenológica) a estas vivências intencionais, chegamos, por um lado, a captar a consciência como um puro centro de referência da intencionalidade, ao qual o objeto intencional é dado, e, por outro lado, chegamos a um objeto que, depois da redução, não tem outra existência senão a de ser dado intencionalmente a este sujeito. Na própria vivência, considera-se o ato puro, que parece ser, simplesmente, a referência intencional da consciência pura ao objeto intencional.

Assim, a consciência é sempre “consciência intencional”, isto é: não há consciência que não seja consciência de um objeto, do mesmo modo, não há objeto que não seja objeto para uma consciência. Deste modo, a fenomenologia se converte na ciência da essência das vivências puras. A realidade inteira aparece como corrente das vivências concebidas como atos puros. È importante observar que esta corrente nada tem em si de psíquico, pois trata-se unicamente de puras estruturas ideais. Portanto, a consciência pura (que no estado de atualização se chama “cogito“) não é um sujeito real, nem seus atos são mais do que relações meramente intencionais, e o objeto não é mais do que um ser dado a este sujeito lógico. Husserl opera ainda na corrente das vivências uma distinção entre a matéria e a forma visada. Chama “noese” àquilo que configura a matéria das vivencias intencionais, e “noema” à multiplicidade dos dados (a forma) que se podem mostrar na intuição pura. No caso de uma árvore, por exemplo, distinguimos o sentido da percepção da árvore (seu noema) e o sentido da percepção como tal (noese); de igual modo, distingue-se no juízo o enunciado do juízo (isto é, a essência dêste enunciado, a noese do juízo) e o juízo enunciado (o noema do juízo). Este último poderia ser denominado “proposição em sentido puramente lógico”, se o noema não contivesse, além de sua forma lógica, uma essência material.

O mais importante em todas estas análises é que nelas fica solidamente estabelecido o caráter bipolar da vivência intencional: o sujeito aparece como essencialmente referido ao objeto, e o objeto como essencialmente dado ao sujeito puro. Quando estamos ante a realidade - o que nem sempre é o caso, porque um ato intencional pode apresentar-se sem objeto real - sua existência não é, entretanto, necessária para o ser da consciência pura; por outro lado, o mundo das “coisas” transcendentes depende totalmente da consciência atual. A realidade é essencialmente privada de autonomia, carece do caráter do absoluto, é somente algo que, em princípio, não é senão intencional, cônscio, algo que aparece. Deste modo, a filosofia de Husserl desemboca num idealismo transcendental que, em muitos aspectos, se assemelha ao dos neokantianos. A diferença entre ele e a escola de Marburgo consiste essencialmente em que Husserl não reduz o objeto a leis formais e admite uma pluralidade de sujeitos aparentemente existentes. Prof. Dr. Donizeti Goulart Taubaté, setembro de 2010