S. and Marper v. The United Kingdom 4 de Dezembro de 2008

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S. and Marper v. The United Kingdom 4 de Dezembro de 2008 Combate ao crime, dados pessoais e vida privada: a jurisprudência do TEDH S. and Marper v. The United Kingdom 4 de Dezembro de 2008

Os factos Os demandantes, S. e M. Marper, são nacionais do Reino Unido (RU), nascidos em 1989 e 1963, respectivamente. Em 19 de Janeiro de 2001, S., de 11 anos de idade, havia sido detido e acusado de tentativa de furto. Fora libertado em 14 de Junho de 2001. Marper fora detido em 13 de Março de 2001 acusado de assédio à sua companheira. O caso seria depois descontinuado, tendo-se o casal reconciliado. Em ambos os casos, foram recolhidas pelas autoridades do RU impressões digitais, amostras celulares e de ADN, posteriormente armazenadas, com base numa legislação de 1984 autorizando a sua retenção sem limite de tempo (S64 (1A) The Police and Criminal Evidence Act 1984 (as amended in 2001).

S. e Marper solicitaram, sem sucesso, a destruição das suas impressões digitais, amostras celulares e perfis de ADN. S. e Marper apresentaram queixa contra a retenção desses elementos após o arquivamento dos processos, com fundamento no Art. 8.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem (interferência com a vida privada não justificada pelas excepções do Art. 8.º, 2). O Tribunal de 1ª instância recorrido deu razão à polícia e o mesmo se passou como resultado dos recursos para o Court of Appeals e a House of Lords.

Art. 8.º da CEDH Direito ao respeito pela vida privada e familiar 1. Qualquer pessoa tem direito ao respeito da sua vida privada e familiar, do seu domicílio e da sua correspondência. 2. Não pode haver ingerência da autoridade pública no exercício deste direito senão quando esta ingerência estiver prevista na lei e constituir uma providência que, numa sociedade democrática, seja necessária para a segurança nacional, para a segurança pública, para o bem-estar económico do país, a defesa da ordem e a prevenção das infracções penais, a protecção da saúde ou da moral, ou a protecção dos direitos e das liberdades de terceiros.

O Governo britânico e a House of Lords entenderam não existir violação do Art. 8.º CEDH: A informação retida seria neutra envolvendo pouca ou mesmo nenhuma interferência na vida privada. O perigo de mau uso dessa informação seria irrelevante e estaria limitado pelo sistema judicial. No entanto, a Baronesa Hale discordou da opinião da maioria, considerando que os dados genéticos representam uma “intimate part of a person’s private life”.

A decisão do Tribunal A natureza da informação O Tribunal considerou que as amostras celulares contêm informação sensível sobre o indivíduo, incluindo sobre a sua saúde. Além disso, contêm um código genético de características únicas, de grande relevância quer para o indivíduo em causa, quer para os seus parentes. Sendo assim, a sua retenção deve ser considerada per se como uma interferência no direito ao respeito da vida privada dos indivíduos em causa.

A capacidade dos perfis de ADN para permitir a identificação de relações genéticas entre indivíduos é em si suficiente para concluir que a sua retenção interfere com o direito à vida privada dos mesmos. O facto de os perfis de ADN permitirem inferir a origem étnica confere à sua retenção uma maior sensibilidade ainda, que é de molde a interferir com o direito à vida privada.

As impressões digitais dos demandantes haviam sido recolhidas no contexto de procedimentos criminais e subsequentemente armazenadas numa base de dados de âmbito nacional a fim de serem conservadas e processadas permanentemente por meios automáticos de identificação criminal. O Tribunal considerou que, dada a natureza da informação, o impacto da retenção de amostras celulares e perfis de ADN comporta uma maior interferência com a vida privada do que as impressões digitais.

Em qualquer caso, por as impresssões digitais conterem igualmente informação sobre características únicas do indivíduo, a sua retenção sem o seu consentimento prévio não pode ser considerada como neutra ou sem significado, podendo também interferir com a vida privada individual.

Dados pessoais e o seu regime Impressões digitais, perfis de ADN, amostras celulares constituem dados pessoais na acepção da Convenção 108. A retenção dessa informação encontra apoio na legislação do RU. Mas esta tem de respeitar as garantias decorrentes do Art. 8.º da Convenção. De facto, a legislação é pouco precisa quanto às condições do armazenamento e utilização da informação pessoal. Ora, essas garantias devem ser reforçadas particularmente quando os dados se destinam a uso policial.

Limitações à protecção dos dados pessoais Os interesses dos indivíduos e da comunidade no seu todo na protecção dos dados pessoais poderão, em certas circunstâncias, ter de ceder perante o interesse legítimo na prevenção do crime (Art. 9.º da Convenção 108). No entanto, a natureza intrinsecamente privada da informação requer do Tribunal um escrutínio cuidadoso das medidas dos Estados autorizando a sua retenção e utilização pelas autoridades sem o consentimento da pessoa.

A questão central: ponderar interesses e valores conflituantes Saber se a retenção das impressões digitais e dados de ADN dos demandantes, pessoas suspeitas, mas não condenadas, por determinadas ofensas criminais, é necessária numa sociedade democrática. Saber se essa retenção é proporcionada em relação ao fim da recolha e limitada no tempo. (cf. Convenção 108 e Recommendation No. R (87) 15 regulating the use of personal data in the police sector )

Factores a ponderar: (1) a prática dos Estados A maioria das partes contratantes permite a recolha de amostras celulares no quadro de procedimento criminal apenas quanto a indivíduos suspeitos de ofensas de certa gravidade. A grande maioria dos Estados que dispõem de bases de dados de ADN e de amostras e perfis daí decorrentes requerem a sua remoção ou destruição, ou imediatamente ou passado um período de tempo limitado após ao arquivo do processo. Alguns Estados autorizam algumas excepções a este princípio. Apenas o RU permitia a retenção ilimitada de impressões digitais e ADN de qualquer pessoa de qualquer idade. 13

Factores a ponderar: (2) a necessidade das medidas A protecção conferida pelo Art. 8.º CEDH ficaria enfraquecida de forma inaceitável se o uso de tecnologias modernas no sistema de justiça/criminal fossem permitidas sem uma avaliação e ponderação cuidadas dos potenciais benefícios da sua utilização extensiva sobre a vida privada individual. Qualquer Estado que aspire a um papel pioneiro no desenvolvimento de novas tecnologias é especialmente responsável por “striking the right balance in this regard”. 14

Factores a ponderar: (3) as condições da retenção No caso, o Tribunal observou: A natureza indiscriminada do poder de retenção, independente da natureza e gravidade da ofensa e da idade do suspeito; A não fixação de um limite temporal à retenção; A escassa possibilidade de a pessoa obter a supressão da informação uma vez declarada inocente.

O Tribunal observou ainda: O risco de estigmatização, resultante do facto de pessoas não condenadas por qualquer crime, com direito à presunção de inocência, serem tratadas da mesma forma que pessoas condenadas Sendo verdade que a retenção não significa, em si mesma, uma suspeição, a percepção pelos indivíduos em causa de que não estavam sendo tratados como inocentes resultou reforçada em razão da retenção indefinida dos dados, tal qual a de pessoas condenadas. A importância de proteger os jovens, garantindo a sua integração na sociedade.

Em conclusão Nas circunstâncias, qualquer retenção de elementos de informação constitui uma interferência desproporcionada no direito dos demandantes ao respeito da sua vida privada e não pode ser considerada como necessária numa sociedade democrática. O Tribunal concluiu pela violação do Art. 8.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem.

Qual é a vossa opinião sobre esta decisão? Que implicações mais gerais pode ter a decisão do TEDH?