Abordagens antropológica, linguística e sociológica curso de análise das interações verbais sessão 1 | 12 outubro 2012.

Slides:



Advertisements
Apresentações semelhantes
Capítulo 7 Direção.
Advertisements

Método Etnográfico Texto inicial de: Cristiane Rodrigues da Silva
Plano de Formação para os professores nas escolas
Renata S.S. Guizzardi Inteligência Artificial – 2007/02
Relembrando... A Investigação como processo tem seis etapas sucessivas: Construção do problema Entendimento do problema: a partir de quais perspectivas.
INTRODUÇÃO AO ESTUDO DA LINGUAGEM E DO DISCURSO
Metodologia de Pesquisa
CONCEITOS ELEMENTARES
Preparado por: Dr. Constantino W. Nassel
2. O objecto de estudo da Linguística
Técnicas eTipos de Requisitos
Reflexões teórico-metodológicas sobre a relação atividade de linguagem/ atividade de trabalho docente.
Alterações da norma OHSAS 18001:2007
Cristiane jonas Francisconi
RELAÇÕES: PEDAGOGIA, EDUCAÇÃO ESCOLAR E DIDÁTICA
- PROGRAMA DE PORTUGUÊS -
A SOCIOLOGIA ATÉ AOS ANOS 70 DO SÉCULO XX NOS EUA
Cefet/ RJ Centro Federal de Educação Tecnológica Celso Suckow da Fonseca Curso: Ensino de Línguas Estrangeiras Disciplina: Metodologia do ensino.
Explicitando informações de ajuda para a construção de sítios de e-GOV
Objectivos Definir o perfil ideal do Chefe de Equipa
Manuel Agostinho Matos Fernandes
Passado, Presente, Futuro – conjugação
SÉRIES INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL
INTRODUÇÃO ÀS CIÊNCIAS SOCIAIS
O PLANEJAMENTO ESCOLAR
Implementação do Projecto Competências TIC Fevereiro de 2009.
MÓDULO 10 Planeamento Anual e Estratégico
Análise da Interação Verbal
OS MODELOS O modo de implementação do trabalho de projecto, como metodologia de aprendizagem tem sido objecto de várias aproximações que se centram em.
_____________________________________
…pessoas...aptidões...potencial...atitudes...performance...acções... …pessoas...aptidões...potencial...atitudes...performance...acções... A Comunicação.
MÉTODOS DE INVESTIGAÇÃO EM ST NARRATIVAS SOBRE AS EXPERIÊNCIAS DO TRABALHO ISCSP 2011/2012 ST Carlos D. Botelho.
Pesquisa Científica Metodologia Científica na Ciência da Computação
19ª Mostra de Pôster – FATEC 2014
1 Workshop de introdução à responsabilidade País, Mês de 20XX A Viagem de Ahmed.
GÊNEROS TEXTUAIS: DEFINIÇÃO E FUNCIONALIDADE
METODOLOGIA DA PESQUISA CIENTÍFICA
Avaliação Externa - processo
AVALIAÇÃO EXTERNA DO DESEMPENHO DOCENTE
PLANEJAMENTO DA PESQUISA. 1. Planejamento da pesquisa/ Fases da pesquisa (projeto). 2. Execução da pesquisa. 3. Relatório final da pesquisa. 4. Exposição.
Fazer Sociologia 10 Figuras elaboradas por José Portela a partir do texto de A. Giddens (2000), Cap. 1, pp
O DESENVOLVIMENTO PROFISSIONAL DE PROFESSORES: A ARTE DE INVENTAR-SE E FAZER HISTÓRIA, MEDIANTE NARRATIVAS AUTOBIOGRÁFICAS Autor(a): Nívia Margaret Rosa.
A PESQUISA E SUAS CLASSIFICAÇÕES
PESQUISA CIENTÍFICA.
CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS PROFESSORA: LILIAN MICHELLE
Universidade Aveiro – DDTE – Doutoramento em Didáctica
Terapia comportamental
Adequação discursiva.
Perguntas de Modelação
Replicação Metas Curriculares de Português
Parte 4 Elaboração e comunicação da pesquisa
Matemática em Ambiente Computacional
O dever pessoal de cuidar da saúde: exigência para os indivíduos
ANÁLISE DA CONVERSAÇÃO
Computer & Education Tópicos Especializados em Engenharia de Software Alexandre Barbosa Cazeli Denis Colli Spalenza.
INTERACIONISMO SIMBÓLICO
Compreensão oral Expressão oral Competências da oralidade
NOÇÕES DE METODOLOGIA DAS CIÊNCIAS SOCIAIS
(Notas João Filipe Matos, 2004)
Cognição nas organizações
Conceitos e Modalidades
Letramento Letramentos Educação.
ANOTAÇÕES e DIÁRIO DE CAMPO
A sociologia como ciência
ELABORAÇÃO DE PROJETO CIENTÍFICO PROFESSORA: MARINEIDE PEREIRA ALMEIDA
BEHAVIORISMO RADICAL Behaviorismo Radical é uma filosofia do Comportamento Humano; Investigação, análise, discussão, formação e reflexão de idéias (ou.
PESQUISA - Ação de propor um projeto de conhecimento e empreender atividades que conduzam a esse conhecimento - Dispor-se a conhecer cientificamente alguma.
Deixis.
Especialização em Promoção da Saúde e Desenvolvimento Social ENSP/FIOCRUZ Comunicação, Informação, Território e Redes Regina Maria Marteleto Laces/Icict/Fiocruz.
PERSONALIDADE: por que estudar?
Transcrição da apresentação:

Abordagens antropológica, linguística e sociológica curso de análise das interações verbais sessão 1 | 12 outubro 2012

Etnometodologia e Análise das interações verbais Michel G. J. Binet GIID-CLUNL FCSH-UNL,

Etnometodologia: Heranças e filiações Etnociências Erving Goffman ( ) Alfred Schütz ( ) Harold Garfinkel ( ) Harvey Sacks ( ) AC

Bibliografia Garfinkel, H., 1984 [1967]. Studies in Ethnomethodology, Cambridge: Polity Press. Garfinkel, H., Recherches en ethnométhodologie, Paris: PUF. Garfinkel, H. & Sacks, H., Les structures formelles des actions pratiques (1967). In Recherches en ethnométhodologie. Paris: PUF, pp

Bibliografia Alfred Schütz: o antecessor Schütz, A., Collected Papers (Vol. 1), The Hague: Martinus Nijhoff. Schütz, A., Collected Papers (Vol. 2), The Hague: Martinus Nijhoff. Schütz, A., Éléments de sociologie phénoménologique, Paris: LHarmattan. Schütz, A. & Luckmann, T., The Structures of the Life-World, London: Heinemann.

Bibliografia Erving Goffman: co-autoria / intertextualidade / Polifonia Goffman, E., Communication Conduct in an Island Community. Unpublished Ph.D. dissertation. Chicago: University of Chicago. Goffman, E., 1972 [1961]. Encounters: Two Studies in the Sociology of Interaction 2nd ed., Harmondsworth: Penguin Books. Goffman, E., 1999a. A situação negligenciada (1964). In Y. Winkin, ed. Os momentos e os seus homens. Lisboa: Relógio dÁgua, pp Goffman, E., Frame Analysis - An Essay on the Organization of Experience, Boston, Massachusetts: Northeastern University Press.

Bibliografia Harvey Sacks: aluno e continuador Sacks, H., Lectures on conversation (Vol. 1 & Vol. 2), Oxford: Blackwell. [ ] Sacks, H., Schegloff, E. & Jefferson, G., A Simplest Sistematics for the Organization of Turn-Taking for Conversation. Language, 50(4), pp Sacks, H., Schegloff, E. & Jefferson, G., The Preference for Self-Correction in the Organization of Repair in Conversation. Language, 53(2), pp Schegloff, E., Sequence Organization in Interaction - A Primer In Conversation Analysis I, Cambridge: Cambridge University Press.

Etnometodo logia A Ordem social: Níveis de organização e escalas de análise (Macro v/s Micro) Interaccionismo metodológico (Adriano Duarte Rodrigues) A situação negligenciada A Ordem da interação Etnométodos: os interactantes como metodólogos práticos Compreensão e Perspectiva émica: ciência objectiva da subjectividade dos actores (Max Weber) Tipificações: sociólogos profissionais & sociólogos profanos «Os analistas da conversação são os próprios falantes» (Adriano Duarte Rodrigues) Etnometodologia conversacional: ações concertadas e metodicamente organizadas Um saber de 2º Grau

Etnometodo logia Pano de fundo dos saberes partilhados Estruturadas e estruturantes mediante a sua incorporação cognitiva e disposicional (Bourdieu, 2001a: 204), padronizadas e padronizantes («standardized and standardizing»; Garfinkel, 1984: 36; 2007: 99), as estruturas objectivas são estruturas objectivadas em contexto situacional no e pelo discurso e na e pela acção dos agentes. Schütz: Atitude natural(izante) Saberes partilhados de um modo tácito formam o pano de fundo das interacções quotidianas, partilha postulada como dada à partida, mas interactivamente revista sempre que necessário. Membership Categorization Analysis (Sacks, 1995) A troca conversacional se efectua dentro de mundos cognitivos por ela convocados, partilhados em maior ou menor grau pelos falantes. Representações, categorizações e saberes configuram mundos ordenados mentalmente que funcionam na conversação como quadros ou contextos interpretativos.

Etnometodo logia Harold Garfinkel « empiriciza » a fenomenologia, retraduzindo-a em instruções de pesquisa permitindo a localização de situações e de comportamentos que possibilitam a observação dos processos de microconstrução da ordem social. A cunhagem de acções reconhecíveis é um processo activo de produção endógena da ordem da interacção. Garfinkel desloca o foco da análise, convertendo um problema de método do observador (como reconhecer o valor accional dos comportamentos observados ?) num problema de método (ou etnométodo) de co-produção da interacção, problema atendido pelos seus participantes (como tornar reconhecível o valor accional do meu comportamento ?), por meio de competências interaccionais e comunicativas a investigar. John Gumperz: Pistas de contextualização (contextualization cues)

Etnometodo logia Esta deslocação do foco da análise operada por Garfinkel tem o mérito de converter uma abordagem inicialmente cognitivista numa abordagem comportamentalista centrada na acção situada, proporcionando um programa de investigação empírica que converte a fenomenologia numa ciência observacional do comportamento humano em contexto situacional. Empenhado em estranhar frente a um «mundo teimosamente familiar» (2007: 101) ao ponto de arriscar passar despercebido, Garfinkel também explorou com a ajuda dos seus alunos técnicas de observação reactiva em contextos naturais, breaching experiments (Garfinkel, 2007: 120–6) consistindo em violações deliberadas de normas tácitas inferidas mais do que directamente observadas, para quebrar as expectativas que formam o pano de fundo das interacções, gerando espanto, vergonha, desconforto, irritação, confusão, perturbando situações e desorganizando interacções, no intuito de provocar a explicitação endógena das expectativas, normas e rotinas de fundo, pela via de protestos e de pedidos de explicação que as tornam então visíveis, operando a sua transferência do campo inferencial para o campo observacional.

O saber de 1º grau não se articula no discurso sobre a prática, mas, sim, dentro da própria prática no curso da sua realização A ação situada e a sua organização metódica são o nicho ecológico da fala

Etnometodo logia Reflexividade: os membros ordenam a sua interacção se observando, descrevendo, interpretando e tipificando mutua e continuamente. Garfinkel escreve: «(…) os inquéritos dos membros são elementos constitutivos das situações que analisam» (2007: 61). Os etnométodos, objecto de estudo da etnometodologia, são práticas observacionais, descritivas e interpretativas «omnipresentes», realizadas de dentro de cada uma das situações de interacção que contribuem em constituir, pelos membros que nelas participam reflexivamente. Indexicalidade: a âncora situacional da ação concertada Os valores referenciais dos pronomes e dos nomes bem como as orientações no espaço e no tempo operadas na e pela linguagem usada in situ, são fixados e organizados em redor de uma âncora situacional, axis mundi de toda a actividade enunciativa. O comportamento se indexicaliza ancorando-se numa situação tornada « familiar » por um processo já mencionado de tipificação-padronização que remete para dimensões da organização social. A analisabilidade da acção como acção ocorrendo num micro-contexto em construção que incorpora na sua definição interactiva uma representação estruturada e estruturante da ordem social.

Etnometodo logia Incompletude das regras sociais e práticas ad hoc : ceteris paribus, factum valet e et cetera Incompletas e genéricas, as regras introduzidas localmente pelas pré-definições socio-institucionais das situações precisam de serem completadas por um trabalho interactivo de co-ordenamento da interacção, atento às contingências e singularidades da mesma. Esta tese potencia o retorno do actor na agenda da investigação sociológica. Um actor situado, a quem compete agir em contextos inacabados, incompletamente definidos e regulamentados. «A ordem social (...) não é uma "ordem encontrada", mas sim "realizada" [practical accomplishment]»(Wolf, 1979: 147).

Etnometodo logia Accountability As acções são activamente cunhadas como observáveis, descritíveis, relatáveis, analisáveis, intencionais, consequentes, justificáveis, numa palavra: racionais. Esta racionalidade, reivindicada de dentro (e não atribuída de fora por um observador exterior) e incorporada numa prática ciosa da sua descritibilidade e justificabilidade, projecta e performa uma ordem social ordenando a prática (Garfinkel, 2007:95). Cada interactante, guardião zeloso da racionalidade das suas acções na interacção com os outros, antecipa qualquer eventual incompreensão fornecendo informações e justificações prévias à realização de um acto ou à produção de uma fala susceptível de não ser compreendido; ou, em caso de mal interpretação não antecipada, investe em dar conta e responder a posteriori pela sua conduta ou pelas suas palavras. A trama da interacção é composta passo a passo por acções auto-justificadas ou auto-justificáveis.

Etnometodo logia a «temporalidade interna» (organização sequencial) dos cursos de acção como dimensão-chave da ordem interaccional: decomposição analítica, sob a forma de uma estrutura multi-operacional (Garfinkel, 2007: 91), caminho investigativo continuado e aprofundado por Harvey Sacks, que, sob a designação de Análise da Conversação (Sacks, 1995), se tornou uma corrente de investigação de âmbito internacional.

Etnometodo logia A etnometodologia, i.e. o estudo dos métodos práticos de organização do curso temporal das acções concertadas à escala situacional, encontra nas interacções conversacionais um terreno privilegiado de observação e análise da produção social e cultural de eventos e de identidades reconhecidos porque tornados localmente reconhecíveis. As identidades são «realizações práticas e contingentes» (Garfinkel, 2007: 286), que, longe de operar num vazio social, convocam, ratificam e incoproram «expectativas socialemente padronizadas» (Garfinkel, Op. Cit.: 289), no decurso de um «trabalho de organização invisível [aos próprios membros da sociedade]» (Op. Cit.: 288), por uma parte importante de teor conversacional, passível de descrição detalhada mediante o seu registo por observação directa ou gravação, vasto programa investigativo que define a Análise da Conversação.

«Posso…..?» Os próprios interactantes subordinam a realização de certos actos a um «pedido de licença» prévio: Trecho 1 – 5.2.(02 ) 469Técnica1posso pôr aqui dentro? 470Utentepode pode claro Trecho 2 – 5.2.(02) 1955Técnica1posso lhe fazer uma pergunta? 1956Utentepode 1957Técnica1quem é que faz a sua higiene pessoal?

A prova administrada pelos próprios falantes Trecho 3 – 5.2.(02) 249 Técnica1não gosto nada de abrir as 250coisas

Bibliografia Amiel, P., Ethnométhodologie appliquée. Éléments de sociologie praxéologique, Paris: Presses du LEMA (Laboratoire dEthnométhodologie Appliquée - Université Paris 8). Coulon, A., Lethnométhodologie, Paris: PUF. Fornel (de), M. & Léon, J., Lanalyse de conversation: de lethnométhodologie à la linguistique interactionnelle. Histoire Épistémologie Langage, 22(I), pp Heritage, J., Ethnomethodology. In A. Giddens & J. Turner, eds. Social Theory Today. Cambridge: Polity Press, pp Heritage, J., Harold Garfinkel. In R. Stones, ed. Key Sociological Thinkers. Basingstoke: Palgrave Macmillan, pp Wolf, M., Sociologias de la vida cotidiana 2nd ed., Madrid: Cátedra.

Abordagens antropológica, linguística e sociológica curso de análise das interações verbais

Sessão 1 12 outubro Introdução geral à análise da conversação A abordagem etnometodológica Sessão 2 19 outubro Modalidades espontâneas, institucionais e mediatizadas das interacções verbais Problemas inerentes à constituição de corpora Fundamentos e convenções de transcrição Sessão 3 26 outubro A ordem da interacção e a lógica da sociabilidade Sessão 4 2 novembro A organização local das interacções verbais: sistema de alternância de vez Sessão 5 9 novembro A organização local das interacções verbais: os pares adjacentes Sessão 6 16 novembro Organização preferencial e relevância condicional Sessão 7 23 novembro Condicionamentos, regras e normas das interacções verbais Sessão 8 30 novembro Programação e orientação dos trabalhos dos participantes Sessão 9 7 dezembro Sessão dezembro A organização global das interacções verbais: a ordem sequencial. Sessão dezembro O contributo da análise das interacções verbais, em geral, e da conversação, em particular, para as ciências sociais e humanas. Sessões-satélite: trabalho prático com ferramentas de registo e anotação de dados 2 horas / semana