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Possibilidades de organização do ensino de Língua Portuguesa

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Apresentação em tema: "Possibilidades de organização do ensino de Língua Portuguesa"— Transcrição da apresentação:

1 Possibilidades de organização do ensino de Língua Portuguesa
1º encontro de formação 2012 Possibilidades de organização do ensino de Língua Portuguesa

2 Dimensões do ensino de LP
Os estudiosos e a literatura da didática do ensino de língua materna apontam duas dimensões axiais articuladas (eixos do ensino) desejáveis: USO e REFLEXÃO. Os documentos oficiais brasileiros (p. ex., PCN), e as propostas de ensino elaboradas a partir deles, têm procurado endossar essas dimensões, expressando-as da seguinte forma: PCN – Língua Portuguesa EF II, p. 35

3 Essa tendência de conceber o ensino da língua materna por meio desses dois eixos principais se estabelece a partir dos anos 1960, por conta dos avanços dos estudos da Linguística. No Brasil, ela ganha força, ao menos nas recomendações e estudos teóricos, ao longo dos anos 1980 e torna-se “oficial” quando aparece claramente formulada nos PCN. No entanto, conforme os próprios PCN: “A maioria dos guias curriculares em vigor já não organiza os conteúdos de Língua Portuguesa em alfabetização, ortografia, pontuação, leitura em voz alta, interpretação de texto, redação e gramática, mas, na prática da sala de aula, essa estruturação é a que ainda prevalece” (PCN – Língua Portuguesa EF I, p. 35 – grifos nossos). É verdade que os PCN de língua portuguesa datam de 1997, e de lá para cá, tem havido esforços no sentido de aproximar a prática dos professores (quer dizer, o que de fato acontece na sala de aula) daquilo que prevêem os documentos oficiais. Porém, a afirmação destacada dos PCN é ainda atual e representa a realidade do ensino de português.

4 Cada eixo se traduz em dimensões mais específicas:
Uso: Práticas de leitura (“LEITURA”) Práticas de escuta e produção oral (“ORALIDADE”) Práticas de produção escrita (“ESCRITA”) Reflexão: “ANÁLISE LINGUÍSTICA” LEITURA, ORALIDADE, ESCRITA E ANÁLISE LINGUÍSTICA constituem, assim, as quatro dimensões do ensino da língua portuguesa.

5 USO Os conteúdos que constituem o eixo USO dizem respeito aos aspectos que caracterizam o processo de interlocução. São eles: historicidade da linguagem e da língua; 2. constituição do contexto de produção, representações de mundo e interações sociais: sujeito enunciador; interlocutor; finalidade da interação; lugar e momento de produção. 3. implicações do contexto de produção na organização dos discursos: restrições de conteúdo e forma decorrentes da escolha dos gêneros e suportes. 4. implicações do contexto de produção no processo de significação: representações dos interlocutores no processo de construção dos sentidos; articulação entre texto e contexto no processo de compreensão; relações intertextuais. PCN – EF II – p. 35

6 Historicidade da linguagem e da língua
É preciso não confundir historicidade com História. Historicidade não quer dizer que a língua ou a linguagem têm uma história, nem que essa história tem consequências no presente e, menos ainda, que a língua e a linguagem são produtos de uma evolução histórica – ainda que todas essas afirmações possam ser válidas em determinados contextos. Historicidade da linguagem e da língua quer simplesmente dizer que qualquer prática de linguagem de um grupo social emerge, em determinado momento, a partir de outras práticas de linguagem já existentes (em outras palavras: não é possível fabricar uma prática de linguagem). Para entender isso, sem confundi-lo com a noção de História, basta pensarmos numa prática de linguagem que só recentemente emergiu em nossa sociedade, tal como o diálogo escrito em tempo real (p. ex.: a conversa escrita via MSN). Antes da existência e difusão da Internet, o diálogo em tempo real só podia existir oralmente (jamais por escrito). Hoje, a tecnologia possibilita que dois interlocutores conversem por escrito em tempo real. Essa prática de linguagem só pôde surgir porque o diálogo oral (quer dizer, um modo de comunicação marcado pela troca de turnos de fala, isto é, um fala, o outro ouve e depois os papéis se invertem) já existia como prática de linguagem. Quando surgiu, o diálogo escrito em tempo real valia-se dos mesmos expedientes de linguagem (a troca de turnos, por exemplo). À medida que se foi desenvolvendo, essa prática de linguagem adquiriu características peculiares e, hoje, é possível dizermos que o diálogo escrito em tempo real (a prática nova) e o diálogo oral (a prática mais antiga) são claramente distintos. Mas sem a prática antiga, a prática nova não se teria constituído como tal e hoje não teria as características que tem.

7 Constituição do contexto de produção, representações de mundo e interações sociais
Isso está ligado ao que os estudiosos de linguagem chamam de “Enunciação”, o ato de colocar a linguagem em funcionamento. O sujeito enunciador é a pessoa que, em dado momento (tempo) e em dado lugar (espaço), produz seus discursos (“falas”). O interlocutor (ou sujeito enunciatário) é a outra pessoa a quem o sujeito enunciador dirige seus discursos (suas “falas”). A “interação” é esse ato que acontece quando enunciador e enunciatário se comunicam. O contexto de produção é marcado pelo tempo e pelo espaço no qual o discurso é produzido. Completa o quadro da enunciação a finalidade dos discursos. O texto é o produto material desse processo de comunicação. Implicações do contexto de produção na organização dos discursos A finalidade da comunicação e o contexto em que ela ocorre determinam a “configuração” do discurso. Essa configuração tem recebido vários nomes nos estudos de linguagem, mas aquele mais difundido atualmente talvez seja “gênero”. A configuração, por sua vez, depende do suporte, isto é, o meio (material) que permite a concretização do discurso, isto é, a produção dos textos. Por exemplo, para um indivíduo fazer uma reclamação formal (finalidade) junto à prefeitura de sua cidade (contexto de produção), ele é obrigado a fazer uma carta de solicitação. Caso contrário, sua finalidade não será atingida. A carta de solicitação é um exemplo de gênero.

8 Implicações do contexto de produção no significado
Quando um adulto conversa com uma criança de 3 anos ele o faz de forma totalmente diferente de quando conversa com outro adulto e isso afeta a forma e o conteúdo da conversa. Isso significa que, ao nos comunicarmos, moldamos nossa comunicação a partir de uma imagem da pessoa com quem nos comunicamos. Essa imagem é a representação do interlocutor, e tem profunda influência no significado da comunicação. Essa representação depende daquilo que imaginamos que o interlocutor é capaz de compreender. Por exemplo: não adianta explicar para essa criança de três anos que a reprodução humana ocorre através do ato sexual – essa criança, por mais inteligente que seja, ainda não teve contato com discursos e textos anteriores que lhe permitam compreender o que é um ato sexual. Esse contato com textos anteriores, necessário à comunicação, é o que chamamos de intertextualidade – a relação que o texto que eu produzo tem com textos já produzidos anteriormente. A representação do interlocutor define as relações intertextuais que o enunciador deve mobilizar para produzir o seu próprio discurso e construir significados.

9 Pelo que propõem os PCN, saber USAR a língua (nas situações públicas) é condição necessária para a cidadania. Saber USAR a língua e a linguagem significa ter controle de todos os componentes do processo de interlocução (anteriormente apresentados). É esse processo, e seus componentes, que a escola deve ensinar quando trabalha o eixo do USO. Aprender a controlar esse processo só é possível se o sujeito for capaz de REFLETIR SOBRE SEUS COMPONENTES, e essa ação constitui a REFLEXÃO SOBRE A LÍNGUA. Como as práticas de USO SOCIAL da língua são complexas e multifacetadas, não é possível aprender a USAR a língua em contextos de prática social de comunicação sem REFLETIR SOBRE ELA.

10 REFLEXÃO Os conteúdos do eixo REFLEXÃO, desenvolvidos sobre os do eixo USO, referem-se à construção de instrumentos para análise do funcionamento da linguagem em situações de interlocução, na escuta, leitura e produção, privilegiando alguns aspectos linguísticos que possam ampliar a competência discursiva do aluno. São estes: variação linguística: modalidades, variedades, registros; 2. organização estrutural dos enunciados; 3. léxico e redes semânticas; 4. processos de construção de significação; 5. modos de organização dos discursos. PCN – EF II – p. 36

11 Variação linguística A variação linguística está ligada às diferentes manifestações discursivas dependentes dos diversos contextos de uso e está ligada às modalidades (oral, escrita, formal, informal, etc.), aos registros (público, semi-público, íntimo, espectral, etc.) e às variedades (intra/interdialietal, regional, arcaico, literário, solene, etc.). É fácil entender essa idéia com alguns exemplos. Situação 1: A conversa entre marido e mulher sobre a programação do fim de semana Situação 2: A carta de comunicação bancária, do banco ao seu cliente. Situação 3: Um artigo científico Situação 4: A negociação das regras de um jogo num grupo de crianças Situação 5: A conversa telefônica entre dois parentes que moram em diferentes regiões do país.

12 Nesses exemplos, é possível perceber que o contexto impõe a cada situação certas combinações de variação linguística: Situação 1: modalidade oral informal, registro íntimo, variedade intradialetal Situação 2: modalidade escrita formal, registro público, variedade intradialetal Situação 3: modalidade oral formal, registro público, variedade língua de especialidade Situação 4: modalidade oral informal, registro íntimo, variedade língua de especialidade Situação 5: modalidade oral informal, registro íntimo, variedade interdialetal (o número de combinações possíveis entre modalidade, registro e variedade é virtualmente infinito)

13 Organização estrutural dos enunciados
Está ligada aos níveis de análise linguística: O nível macrossintático (“nível do texto”) – relacionado à organização das partes que compõem os textos – blocos textuais (como o parágrafo, a estrofe, a coluna, etc.), elementos peri/paratextuais (títulos, ilustrações, legendas, etc.), os períodos, etc. O nível microssintático (nível da frase) – relacionado à organização sintática dos períodos. O nível morfológico – relacionado à estrutura interna das palavras (classes, componentes léxicos e flexionais, ligados à derivação e à composição, etc.). O nível fônico – relacionado à estrutura fônica (os sons da língua e suas representações.).

14 Nível macrossintático (a integralidade do texto)
Nível microssintático Nível morfológico PUBLICADAS = PUBLIC+AD+A+S Nível fônico [p bli ’ka dəz]

15 O nível macro-sintático (exemplos)
A simples visualização revela que esse texto tem uma estrutura icônico-verbal, baseada em tópicos e não em parágrafos. A leitura não pode ser linear, e sim circular (o olho fixa o centro informativo da página – o título “Custo de estádio do DF...” – e a escaneia em sentido horário, seguindo a diagonal principal).

16 O nível macro-sintático (exemplos)
Já este segundo exemplo revela uma organização macro-sintática hierárquica (com título, parágrafos, ilustrações e legendas). A leitura é linear, de cima para baixo e da esquerda para a direita, acompanhando a disposição dos parágrafos no espaço gráfico.

17 O nível macro-sintático (exemplos)
Jogo de Bola  A bela bola  rola:  a bela bola do Raul.  Bola amarela,  a da Arabela.  A do Raul,  azul.  Rola a amarela  e pula a azul.  A bola é mole,  é mole e rola.  A bola é bela,  é bela e pula.  É bela, rola e pula,  é mole, amarela, azul.  A de Raul é de Arabela,  e a de Arabela é de Raul.  Neste terceiro exemplo, a organização é por estrofes. A leitura é linear, e tem de ser, ao mesmo tempo, visual e sonora: o gênero (poema) impõe uma leitura em voz alta – a sucessão das rimas, a alternância entre consoantes bilabiais (“b” e “m”) e líquidas (“l” e “r”) e o ritmo, acompanhados da sequência visual das estrofes, imitam os movimentos de um jogo de bola. Há, então, dois níveis macro-sintáticos: o dos sons (da leitura em voz alta) e o das estrofes (visual). Só é possível entender o poema quando esses dois níveis macro-sintáticos são compreendidos ao mesmo tempo.

18 O nível micro-sintático (exemplos)
As relações de sentido existentes, por exemplo, num pequeno trecho argumentativo como o exemplo ao lado: expressão da hipótese sobre o passado, em vermelho; caracterização, em marrom; conseqüência plausível sobre o presente, em azul claro; concessão, em verde só são possíveis porque são manifestadas, no texto, por elementos micro-sintáticos, como a subordinação sintática marcada pelo emprego das diferentes conjunções, pronomes e tempos verbais. Sem esses elementos, não seria possível construir relações de sentido entre palavras, frases e textos e a comunicação seria, simplesmente, impossível. Saber usar a língua para, por exemplo, argumentar, significa ter consciência dessas relações e estruturas linguísticas. “Se tivesse marcado com “seu” José na saída da Avenida Atlântica, o hotel em que ficava o cabeleireiro não permitiria que “essa gente” se aproximasse. Mas na Avenida Copacabana tudo era possível: pessoas de toda a espécie.”

19 O nível morfológico (exemplos)
“Se tivesse marcado com “seu” José na saída da Avenida Atlântica, o hotel em que ficava o cabeleireiro não permitiria que “essa gente” se aproximasse. Mas na Avenida Copacabana tudo era possível: pessoas de toda a espécie.” Nesse exemplo, há duas palavras que pertencem a um mesmo paradigma: TiveSSE AproximaSSE Ambas são formas do mesmo tempo verbal. Se o aluno percebe que a identidade na forma (duas formas verbais com a terminação “sse”), traduzem a mesma idéia (ação irreal no passado), ele saberá valer-se dessa consciência em outras situações de uso. Esse é um exemplo de trabalho com o nível morfológico.

20 O nível fônico (exemplos)
Observando as estruturas fônicas de: Tivesse Aproximasse Possível Pessoas E de: Quisesse Apesar Pose É notável que a seqüência –ss– nunca aparece no início nem no fim das palavras, mas sempre no meio e sempre entre duas vogais e que, nessas condições, sempre transcreve o mesmo fonema /s/. Também é notável que, nas mesmas condições, isto é, entre duas vogais e no interior da palavra, a seqüência –s– NUNCA transcreve o fonema /s/, mas sempre o fonema /z/. Trabalhar essas características fônicas é algo que pode levar os alunos a entenderem que palavras como “passo” ou “massa” (ambas com o fonema /s/) nunca poderiam ser grafadas “paso” ou “masa” (erros ortográficos MUITO freqüentes, até nos alunos que já passaram do ciclo de alfabetização). “Se tivesse marcado com “seu” José na saída da Avenida Atlântica, o hotel em que ficava o cabeleireiro não permitiria que “essa gente” se aproximasse. Mas na Avenida Copacabana tudo era possível: pessoas de toda a espécie.” “Tradição de quê? De nada, se se quisesse apurar. Tinha a seu favor apenas o fato de que os habitantes tinham uma longa linhagem atrás de si, o que, apesar de linhagem plebéia, bastava para lhes dar uma certa pose de dignidade.”

21 O nível fônico (exemplos)
Neste poema, a chave da interpretação depende inteiramente do nível fônico: Da percepção da alternância entre consoantes oclusivas (que parecem uma pequena explosão, como o “b” de bola, ou o “m” de mole) e consoantes líquidas (que parecem “deslizar” quando são pronunciadas, como o “l” de pula ou o “r” de rola) – as primeiras,imitam o som que a bola faz ao quicar, e as outras, o som que a bola faz ao rolar. Da percepção da alternância entre as vogais abertas (com o “ó” de bola e o “é” de bela) e as vogais fechadas (como o “u” de azul) – essa alternância imita o vai e vem característico dos jogos de bola. Perceber isso é fundamental para mostrar aos alunos que a forma, nos textos literários, está sempre relacionada com os sentidos, e que essa relação nunca ocorre por acaso, mas é conseguida pelo trabalho do autor. Só assim os alunos conseguirão desenvolver a capacidade de fruição do texto literário (o prazer de ler) e poderão se tornar leitores competentes de literatura. Jogo de Bola  A bela bola  rola:  a bela bola do Raul.  Bola amarela,  a da Arabela.  A do Raul,  azul.  Rola a amarela  e pula a azul.  A bola é mole,  é mole e rola.  A bola é bela,  é bela e pula.  É bela, rola e pula,  é mole, amarela, azul.  A de Raul é de Arabela,  e a de Arabela é de Raul. 

22 Léxico e redes semânticas
O léxico é o conjunto de palavras da língua. O léxico se organiza a partir dos significados das palavras, pelos quais é possível estabelecer relações entre as palavras da língua. Essas relações formam as redes semânticas. As redes semânticas se estruturam, fundamentalmente, a partir de: Campos semânticos (sinônimos, hipo/hiperônimos, antônimos, etc.) “Na noite de ontem, uma onça pintada foi capturada no quintal da casa de Maria de Lourdes de Jesus, em Itaquaquecetuba. Segundo a polícia militar, o felino estava desidratado (...)” [“onça pintada” é hipônimo de “felino” – são unidades lexicais do mesmo campo semântico] 2. Domínios da experiência (maneiras pelas quais a realidade é fabricada pela língua) “Acertou bem na mosca.” “Prendeu o bolso da calça com uma mosca bem firme, para evitar esgarçá-lo.” “A cozinha do restaurante estava infestada de moscas”. [Nesses exemplos, a mesma palavra pode estar ligada a diferentes domínios da experiência – esportes (no primeiro exemplo), vestuário (no segundo exemplo) e entomologia (no terceiro exemplo). O falante da língua deve ser capaz de identificar esses domínios da experiência para compreender e fazer cálculos corretos de sentido dos enunciados. Não identificar esses domínios pode levar a cálculos de sentido inadequados ou insólitos].

23 Domínios da experiência para “mosca” (alguns exemplos)
Campos semânticos felinos entomologia vestuário onça esportes

24 Processos de construção de significação
Os processos de construção de significados são muito variados, mas funcionam a partir de duas dinâmicas principais: 1. Denotação – entre o referente (“coisa ou objeto do mundo”) e as palavras, há uma relação direta: “A gata Diva, no estado americano do Wisconsin, entrou para o livro dos recordes por ter dado à luz de uma só vez quinze filhotes.” (“gata” refere-se ao felino doméstico – a relação entre a palavra e o referente é direta). 2. Conotação – entre o referente e as palavras a relação é indireta: “O que a cantora australiana Kylie Minogue, a primeira dama francesa Carla Bruni e a atriz Cameron Diaz têm em comum? Além da carreira de sucesso, gordas contas bancárias, elas lideram uma nova tendência entre as personalidades – a turma das gatas: um grupo de mulheres que, devido às mais diversas intervenções estéticas, ganharam feições felinas – sobrancelhas levantadas, bochechas redondinhas com o formato que lembra o de uma maçã, testa lisa e os famosos olhos puxados.” [“gatas”, nesse caso, não se refere diretamente ao felino, mas a uma característica da feição de determinadas mulheres que lembra a dos felinos].

25 Modos de organização dos discursos
Enquanto o gênero diz respeito a uma configuração “exterior” dos textos, os modos de organização dos discursos referem-se a configurações “interiores” e prototípicas, ligadas a determinados propósitos comunicativos. Os teóricos, em geral, concordam que haja quatro modos básicos: O narrativo (apresentação/representação de ações, com implicação de atores envolvidos – agente, paciente, beneficiário, etc.) O descritivo (caracterização) O argumentativo (expressão e defesa de opinião, apreciação subjetiva, explicação) O dialogal (troca verbal em turnos de fala) Esses modos não estão ligados a nenhum tipo ou gênero específico de texto. Isso quer dizer que podem existir, isolados ou combinados, em todas as espécies de textos. Em geral combinam-se de diferentes formas e em variados graus na composição dos tipos e gêneros textuais. São as estruturas discursivas mais estáveis e caracterizáveis dos textos e seu número é limitado: por essa razão seu estudo é tão importante – conhecer esses modos e saber agir linguística e discursivamente a partir deles implica virtualmente conhecer o funcionamento discursivo de qualquer gênero ou tipo textual.

26 Exemplos (trecho do Conto A Bela e a Fera, de Clarice Lispector)
“Ela tinha um nome a preservar: era Carla de Sousa e Santos. Eram importantes o “de” e o “e”: marcavam classe e quatrocentos anos de carioca. Vivia nas manadas de mulheres e homens que, sim, que simplesmente “podiam”. Podiam o quê? Ora, simplesmente podiam. E ainda por cima, viscosos pois que o “podia” deles era bem oleado nas máquinas que corriam sem barulho de metal ferrugento. Ela, que era uma potência. Uma geração de energia elétrica. Ela, que para descansar usava os vinhedos do seu sítio. Possuía tradições podres mas de pé. E como não havia nenhum novo critério para sustentar as vagas e grandes esperanças, a pesada tradição ainda vigorava. Tradição de quê? De nada, se se quisesse apurar. Tinha a seu favor apenas o fato de que os habitantes tinham uma longa linhagem atrás de si, o que, apesar de linhagem plebéia, bastava para lhes dar uma certa pose de dignidade. Pensou assim, toda enovelada: “Ela que, sendo mulher, o que lhe parecia engraçado ser ou não ser, sabia que se fosse homem, naturalmente seria banqueiro, coisa normal que acontece entre os “dela”, isto é, de sua classe social, à qual o marido, porém, alcançara com muito trabalho e que o classificava de “self made man” enquanto ela não era uma “self made woman”. No fim do longo pensamento, pareceu-lhe que – que não pensara em nada. [continua] Modo descritivo Modo argumentativo

27 Modo narrativo Modo argumentativo Modo dialogal
Um homem sem uma perna, agarrando-se numa muleta, parou diante dela e disse: Moça, me dá um dinheiro para eu comer? “Socorro!!!” gritou-se para si mesma ao ver a enorme ferida na perna do homem. “Socorre-me, Deus”, disse baixinho. Estava exposta àquele homem. Estava completamente exposta. Se tivesse marcado com “seu” José na saída da Avenida Atlântica, o hotel em que ficava o cabeleireiro não permitiria que “essa gente” se aproximasse. Mas na Avenida Copacabana tudo era possível: pessoas de toda a espécie. Pelo menos de espécie diferente da dela. “Da dela?” “Que espécie de ela era para ser ‘da dela’?” Ela – os outros. Mas, mas a morte não nos separa, pensou de repente e seu rosto tomou ar de uma máscara de beleza e não beleza de gente: sua cara por um momento se endureceu. Pensamento do mendigo: “essa dona de cara pintada com estrelinhas douradas na testa, ou não me dá ou me dá muito pouco”. Ocorreu-lhe então, um pouco cansado: “ou dá quase nada”. Ela espantada: como praticamente não andava na rua – era de carro de porta à porta – chegou a pensar: ele vai me matar? Estava atarantada e perguntou: Quanto é que se costuma dar? O que a pessoa pode dar e quer dar - respondeu o mendigo espantadíssimo. Modo narrativo Modo argumentativo Modo dialogal

28 Pelo exemplo pode-se ver que, num texto qualquer, convivem simultaneamente os quatro modos de organização do discurso, distribuídos ao longo do texto. Ao analisar outros exemplos de textos, seria possível observar o mesmo: os modos de organização do discurso se distribuem em todos os gêneros e tipos de textos.

29 Por que articular os eixos do uso com os da reflexão?
“As práticas de linguagem são uma totalidade; não podem, na escola, ser apresentadas de maneira fragmentada, sob pena de não se tornarem reconhecíveis e de terem sua aprendizagem inviabilizada. Ainda que didaticamente seja necessário realizar recortes e descolamentos para melhor compreender o funcionamento da linguagem, é fato que a observação e análise de um aspecto demandam o exercício constante de articulação com os demais aspectos envolvidos no processo. Ao invés de organizar o ensino em unidades formatadas em “texto”, “tópicos de gramática” e “redação”, fechadas em si mesmas de maneira desarticulada, as atividades propostas no ambiente escolar devem considerar as especificidades de cada uma das práticas de linguagem em função da articulação que estabelecem entre si.” PCN – Língua Portuguesa – EF II – p. 36

30 O que fazer? “A seleção de textos para leitura ou escuta oferece modelos para o aluno construir representações cada vez mais sofisticadas sobre o funcionamento da linguagem (modos de garantir a continuidade temática nos diferentes gêneros, operadores específicos para estabelecer a progressão lógica), articulando-se à prática de produção de textos e à de análise linguística. O texto produzido pelo aluno, seja oral ou escrito, permite identificar os recursos linguísticos que ele já domina e os que precisa aprender a dominar, indicando quais conteúdos precisam ser tematizados, articulando-se às práticas de escuta e leitura e de análise linguística. Nessa perspectiva, os conteúdos de língua e linguagem não são selecionados em função da tradição escolar que predetermina o que deve ser abordado em cada série, mas em função das necessidades e possibilidades do aluno, de modo a permitir que ele, em sucessivas aproximações, se aproprie dos instrumentos que possam ampliar sua capacidade de ler, escrever, falar e escutar.” PCN – Língua Portuguesa – EF II – p

31 Isso não significa eliminar a seleção prévia do que deve ser ensinado, porque:
A seleção e priorização deve considerar, pois, dois critérios fundamentais: as necessidades dos alunos e suas possibilidades de aprendizagem. Estes, articulados ao projeto educativo da escola, que se diferencia em função das características e expectativas específicas de cada comunidade escolar, de cada região do país, devem ser as referências fundamentais para o estabelecimento da sequenciação dos conteúdos. As necessidades dos alunos definem-se a partir dos objetivos colocados para o ensino. As possibilidades de aprendizagem, por sua vez, definem-se a partir do grau de complexidade do objeto e das exigências da tarefa proposta. Ambas, necessidades e possibilidades, são determinadas pelos conhecimentos já construídos pelos alunos. O grau de complexidade do objeto refere-se, fundamentalmente, à dificuldade posta para o aluno ao se relacionar com os diversos aspectos do conhecimento discursivo e linguístico nas práticas de recepção e produção de linguagem [...] PCN – Língua Portuguesa – EF II – p. 37

32 O trabalho em cada dimensão (leitura, escrita, oralidade, análise linguística)

33 Na leitura... “De certa forma, é preciso agir como se o aluno já soubesse aquilo que deve aprender. Entre a condição de destinatário de textos escritos e a falta de habilidade temporária para ler autonomamente é que reside a possibilidade de, com a ajuda do professor e de outros leitores, desenvolver a competência leitora, pela prática de leitura. Nessas situações, o aluno deve pôr em jogo tudo o que sabe para descobrir o que não sabe. Essa atividade só poderá ocorrer com a intervenção do professor, que deverá colocar-se na situação de principal parceiro, favorecendo a circulação de informações. Para considerar a diversidade dos gêneros, não ignorando a diversidade de recepção que supõem, as atividades organizadas para a prática de leitura devem se diferenciar, sob pena de trabalharem contra a formação de leitores. Produzir esquemas e resumos pode ajudar a apreensão dos tópicos mais importantes quando se trata de textos de divulgação científica; no entanto, aplicar tal procedimento a um texto literário é desastroso, pois apagaria o essencial, o tratamento estilístico que o tema recebeu do autor. Também não se formará um leitor de textos de imprensa, do qual se espera, senão uma leitura diária, ao menos uma leitura regular dos jornais, lendo-se notícias apenas no primeiro bimestre. Além disso, se os sentidos construídos são resultados da articulação entre as informações do texto e os conhecimentos ativados pelo leitor no processo de leitura, o texto não está pronto quando escrito: o modo de ler é também um modo de produzir sentidos. Assim, a tarefa da escola, nestes ciclos, é, além de expandir os procedimentos básicos aprendidos nos ciclos anteriores, explorar, principalmente no que se refere ao texto literário, a funcionalidade dos elementos constitutivos da obra e sua relação com seu contexto de criação.” PCN – Língua Portuguesa – EF II – p

34 Na oralidade... “Ensinar língua oral não significa trabalhar a capacidade de falar em geral. Significa desenvolver o domínio dos gêneros que apóiam a aprendizagem escolar de Língua Portuguesa e de outras áreas (exposição, relatório de experiência, entrevista, debate, etc.) e, também, os gêneros da vida pública no sentido mais amplo do termo (debate, teatro, palestra, entrevista, etc.). Já que os alunos têm menos acesso a esses gêneros nos usos espontâneos da linguagem oral, é fundamental desenvolver, na escola, uma série de atividades de escuta orientada, que possibilitem a eles construir, progressivamente, modelos apropriados ao uso do oral nas circunstâncias previstas. É condição fundamental para que o trabalho possa ser realizado a constituição de um corpus de textos orais correspondentes aos gêneros previstos, a partir dos quais as atividades de escuta (e também de produção de textos orais) sejam organizadas, de modo a possibilitar aos alunos a construção de referências modelizadoras. Esse corpus pode ser organizado a partir de registros audiovisuais (cassete, videocassete) e da promoção de debates, entrevistas, palestras, leituras dramáticas, saraus literários organizados pela escola ou por outra instituição, que envolvam aspectos temáticos de projetos em andamento em Língua Portuguesa ou em outras áreas.” PCN – Língua Portuguesa – EF II – p

35 Na produção escrita... “A produção escrita constitui a dimensão mais complexa dentro do eixo do USO. Opera em dois sentidos: o plano do conteúdo e o da forma. Diferentes atividades devem ser organizadas para trabalhar esses planos. Uma não é melhor que a outra, cumprem apenas objetivos de aprendizagem diferentes: PCN – Língua Portuguesa – EF II – p. 76

36 Na produção escrita... Atividades de transcrição exigem do aluno que as realiza atenção para garantir a fidelidade do registro e domínio das convenções gráficas da escrita. O que dizer e o como dizer já estão determinados pelo texto original. Atividades que envolvam reproduções, paráfrases, resumos permitem que o aluno fique, em parte, liberado da tarefa de pensar sobre o que escrever, pois o plano do conteúdo já está definido pelo texto modelo. A atividade oferece possibilidades de tratar de aspectos coesivos da língua, de aspectos do plano da expressão, como dizer. As práticas de decalque funcionam quase como modelos lacunados: as questões formais já estão em parte definidas pelo caráter altamente convencionalizado dos gêneros, como nos requerimentos ou cartas. Nas atividades de produção que envolvem autoria ou criação, a tarefa do sujeito torna-se mais complexa, porque precisa articular ambos os planos: o do conteúdo (o que dizer) e o da expressão (como dizer). Não se trata de estabelecer uma progressão linear entre essas categorias didáticas, privilegiando inicialmente a transcrição, depois a reprodução, o decalque e, finalmente, o texto de autoria. É em função do que os alunos precisam aprender que se selecionam as categorias didáticas mais adequadas. PCN – Língua Portuguesa – EF II – p

37 Na análise linguística...
“Durante os últimos anos, a crítica ao ensino de Língua Portuguesa centrado em tópicos de gramática escolar e as alternativas teóricas apresentadas pelos estudos linguísticos, principalmente no que se refere à consciência dos fenômenos enunciativos e à análise tipológica dos textos, permitiram uma visão muito mais funcional da língua, o que provocou alterações nas práticas escolares, representando, em alguns casos, o abandono do tratamento dos aspectos gramaticais e da reflexão sistemática sobre os aspectos discursivos do funcionamento da linguagem. Para ampliar a competência discursiva dos alunos, no entanto, a criação de contextos efetivos de uso da linguagem é condição necessária, porém não suficiente, sobretudo no que se refere ao domínio pleno da modalidade escrita. Além da escuta, leitura e produção de textos, parece ser necessária a realização tanto de atividades epilinguísticas, que envolvam manifestações de um trabalho sobre a língua e suas propriedades, como de atividades metalinguísticas, que envolvam o trabalho de observação, descrição e categorização, por meio do qual se constroem explicações para os fenômenos linguísticos característicos das práticas discursivas. Por outro lado, não se podem desprezar as possibilidades que a reflexão linguística apresenta para o desenvolvimento dos processos mentais do sujeito, por meio da capacidade de formular explicações para explicitar as regularidades dos dados que se observam a partir do conhecimento gramatical implícito.” PCN – Língua Portuguesa – EF II – p. 78

38 Na análise linguística...
Ao organizar atividades de análise linguística para possibilitar aos alunos a aprendizagem dos conteúdos selecionados, alguns procedimentos metodológicos são fundamentais para o planejamento do ensino: isolamento, entre os diversos componentes da expressão oral ou escrita, do fato lingüístico a ser estudado, tomando como ponto de partida as capacidades já dominadas pelos alunos: o ensino deve centrar-se na tarefa de instrumentalizar o aluno para o domínio cada vez maior da linguagem; construção de um corpus que leve em conta a relevância, a simplicidade, bem como a quantidade dos dados, para que o aluno possa perceber o que é regular; análise do corpus, promovendo o agrupamento dos dados a partir dos critérios construídos para apontar as regularidades observadas; organização e registro das conclusões a que os alunos tenham chegado; apresentação da metalinguagem, após diversas experiências de manipulação e exploração do aspecto selecionado, o que, além de apresentar a possibilidade de tratamento mais econômico para os fatos da língua, valida socialmente o conhecimento produzido. Para esta passagem, o professor precisa possibilitar ao aluno o acesso a diversos textos que abordem os conteúdos estudados; exercitação sobre os conteúdos estudados, de modo a permitir que o aluno se aproprie efetivamente das descobertas realizadas; reinvestimento dos diferentes conteúdos exercitados em atividades mais complexas, na prática de escuta e de leitura ou na prática de produção de textos orais e escritos. PCN – Língua Portuguesa – EF II – p. 78

39 Observações: Corpus – conjunto de exemplares (de textos, de frases, de enunciados, etc.) que servem de ponto de partida para uma análise qualquer. Atividade epilinguística – aquela que se realiza no interior de uma prática de linguagem – por exemplo, ao fazer um discurso, o orador se interrompe e pergunta à platéia se todos estão ouvindo o que ele diz. Atividade metalinguística – aquela na qual o sujeito é levado a pensar a respeito da língua, tentando compreender como ela funciona.

40 Como articular os eixos do USO e da REFLEXÃO?
Segundo os PCN, duas formas básicas de organização didática favorecem a articulação dos eixos do uso e da reflexão: os projetos de leitura e escrita e os módulos didáticos. Em ambos, o trabalho com o texto têm papel organizativo, porque todas as atividades de leitura, oralidade, produção de textos e reflexão sobre a língua devem convergir para o texto.

41 1. Os projetos 2. Os módulos didáticos
“A característica básica de um projeto é que ele tem um objetivo compartilhado por todos os envolvidos, que se expressa num produto final em função do qual todos trabalham e que terá, necessariamente, destinação, divulgação e circulação social internamente na escola ou fora dela. Além disso, os projetos permitem dispor do tempo de forma flexível, pois o tempo tem o tamanho necessário para conquistar o objetivo: pode ser de alguns dias ou de alguns meses. [...] São situações em que as atividades de escuta, leitura e produção de textos orais e escritos, bem como as de análise linguística se inter-relacionam de forma contextualizada, pois quase sempre envolvem tarefas que articulam essas diferentes práticas, nas quais faz sentido, por exemplo, ler para escrever, escrever para ler, decorar para representar ou recitar, escrever para não esquecer, ler em voz alta, falar para analisar depois etc. [...]” 2. Os módulos didáticos “Módulos didáticos são sequências de atividades e exercícios, organizados de maneira gradual para permitir que os alunos possam, progressivamente, apropriar-se das características discursivas e linguísticas dos gêneros estudados, ao produzir seus próprios textos. O planejamento dos módulos didáticos parte do diagnóstico das capacidades iniciais dos alunos, permitindo identificar quais instrumentos de ensino podem promover a aprendizagem e a superação dos problemas apresentados.” PCN – Língua Portuguesa – EF II – p

42 Um exemplo de planejamento de um projeto, com módulos didáticos

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45 Série/ano: oitava série/nono ano do Ensino Fundamental
Objetivo principal – Estudar a argumentação e o modo de organização argumentativo Tempo de duração estimado – dois bimestres (aproximadamente 80 aulas) As atividades deste projeto organizam-se de forma vertical e horizontal: Verticalmente, todas as atividades convergem para o estudo da argumentação e as características do modo de organização argumentativo. Horizontalmente, selecionam-se alguns gêneros argumentativos para serem trabalhados, cada um, ao longo de mais ou menos três ou quatro semanas. Nesse exemplo, o que “organiza” o ensino é, ao mesmo tempo, LEITURA e PRODUÇÃO ESCRITA


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