CPI - A SSASSINATO DE JOVENS NO B RASIL Antonio Teixeira Lima Junior Coordenação de Gênero e Raça Diretoria de Estudos e Políticas Sociais Instituto de.

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Transcrição da apresentação:

CPI - A SSASSINATO DE JOVENS NO B RASIL Antonio Teixeira Lima Junior Coordenação de Gênero e Raça Diretoria de Estudos e Políticas Sociais Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea)

UM DIAGNÓSTICO PRELIMINAR DA VIOLÊNCIA E SUAS REPRESENTAÇÕES O crime é apenas uma das formas de manifestação de violência. Considerá-la de forma isolada tende a nos conduzir a conclusões, por vezes, trágicas: tendemos a representar a violência como conduta desviante; como um problema de indivíduos; ou como violação de uma norma; No Brasil, a violência foi historicamente representada como o desvio de um ponto ótimo, supondo-se a existência, em algum quadrante da nossa história, de um grau zero de violência; Sob esse pano de fundo ergueu-se um dos componentes do mito fundador da sociedade brasileira: o mito da cordialidade. Segundo essa imagem, o povo brasileiro seria gente ordeira e pacífica; a escravidão, um encontro feliz de raças; o racismo, um problema dissolvido pela miscigenação; e o crime seria um desvio individual, resultado da malandragem e da vadiagem. Este mito permitiu que a repressão fosse utilizada como forma de restituição da paz e da normalidade. Estas representações míticas fundaram instituições, legitimaram práticas e estruturaram os órgãos de repressão no Brasil.

O que tem tornado possível a violência letal de jovens, inclusive a policial, na escala em que ocorre no Brasil? A consolidação da questão social como um problema de segurança pública está no cerne da produção em série de violência letal contra a juventude negra. O Estado penal é convocado para “resolver” a violência difundida conjuntamente pelos sistemas econômico, político e social. Classicamente, a segurança pública no Brasil fora estruturada para debelar os inimigos internos. Ela orienta a classificação dos sujeitos a serem eliminados/controlados a partir do seu comportamento “desviante”; adota uma retórica estigmatizante e belicista que associa comunidades negras a um lugar de perigo e desordem, metáfora racista de uma natureza que precisa ser civilizada.

Civilizar esses territórios significa instituir políticas e medidas de controle social e de securitização da vida nos territórios urbanos, que tem no corpo negro o seu alvo preferencial. O sistema penal atualmente compreende não apenas o cárcere, mas as tecnologias de controle e vigilância que configuram uma gestão policial da vida. São exemplos concretos disso que chamamos de gestão policial da vida: cercamento de morros e favelas em algumas cidades brasileiras; aprovação de medidas de controle que tendem a reproduzir estigmas sociais (no Rio de Janeiro foi aprovada uma lei municipal que proíbe o uso de boné); modelos de política de segurança pública como as UPP’S. O que tem tornado possível a violência letal de jovens, inclusive a policial, na escala em que ocorre no Brasil?

A manipulação do medo tem sido utilizado como catalisador dos dispositivos de controle social, convertendo o afastamento do elemento selvagem no princípio ordenador de toda a sociedade brasileira.

C ONTRAPONTOS DO MITO - C RIMES VIOLENTOS LETAIS E MORTES POR AGRESSÃO Mortes por agressão (3) Ns. AbsolutosTaxas (5) ,927,4 27,129,026,9 Fonte: Sistema Nacional de Informações de Segurança Pública, Prisionais e sobre Drogas (SINESP) / Secretaria Nacional de Segurança Pública (Senasp) /Ministério da Justiça; Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE; Fórum Brasileiro de Segurança Pública.

Grupos de Estados segundo qualidade dos dados (2) Unidades da Federação CVLI - Crimes violentos letais intencionais (3) Ns. AbsolutosTaxas (4) 2012 (5) (5)2013 Variação (%) Brasil ,426,6 -2,6 Grupo 1 Alagoas ,867,5-0,5 Amazonas ,125,6-20,3 Bahia ,637,9-13,1 Ceará ,450,416,2 Distrito Federal ,926,8-18,4 Espírito Santo ,042,0-12,6 Goiás ,041,61,3 Mato Grosso ,636,17,4 Mato Grosso do Sul ,521,7-11,7 Minas Gerais ,821,64,0 Pará ,742,41,6 Paraíba (6) ,439,2-2,8 Paraná (7) ,124,5-21,0 Pernambuco ,233,6-9,7 Rio de Janeiro ,130,115,0 São Paulo (9) ,311,7-11,7 Grupo 2 Rio Grande do Norte ,024,3102,4 Roraima ,322,446,0 Sergipe ,042,25,4 Fonte: Sistema Nacional de Informações de Segurança Pública, Prisionais e sobre Drogas (SINESP) / Secretaria Nacional de Segurança Pública (Senasp) /Ministério da Justiça; Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE; Fórum Brasileiro de Segurança Pública.

O S CONTRAPONTOS DO MITO – VIOLÊNCIA SISTÊMICA São assassinadas no país em média pessoas por ano, cometem suicídio e são vitimadas de forma violenta por causa indefinida pelo Estado; A mortalidade violenta vem se agravando nas ultimas décadas e as taxas de homicídio estão se concentrando cada vez mais nos mais novos entre os jovens de 15 a 29 anos. Em 1980, a taxa máxima de homicídios era de 27,7/ habitantes, com pico aos 25 anos de idade. Em 2010, a taxa máxima de homicídios foi de 70,6 / habitantes, com pico aos 21 anos de idade. A taxa máxima variou, portanto, 154% em 20 anos.

H OMICÍDIOS E O USO DE ARMAS DE FOGO Taxa máxima de homicídios por arma de fogo era de 14,4 por habitantes em 1980, com pico aos 25 anos de idade. Em 2010, a taxa máxima de homicídios por arma de fogo era de 59,3 por habit., com pico aos 21 anos de idade. O que significa dizer que houve um crescimento de 314,7% na taxa máxima de homicídios por arma de fogo.

Fonte: Ipea com base em dados do Sistema de informações sobre Mortalidade (SIM/MS) e no Censo Demográfico do IBGE de 2010.

A SELETIVIDADE SISTÊMICA – O LUGAR DA RAÇA NA VIOLÊNCIA BRASILEIRA De acordo com o Mapa da Violência 2014, no período houve queda da taxa de homicídios da população branca e incremento da vitimização da população negra. Enquanto entre os brancos houve queda de 24,8% na taxa de vitimização, entre os negros houve aumento de 38,7% no mesmo período supracitado. Como a taxa nacional de homicídios permaneceu estável no período (passou de 28,9/100 mil habitantes para 29/100 mil), pode-se falar que a lógica da violência socialmente produzida teve um elevado incremento do seu caráter seletivo (Waiselfisz, 2014). Traduzindo em números, no período morreram 72% mais negros que brancos.

O UTRAS VIOLÊNCIAS SISTÊMICAS Faixas de salário mínimo Faixas Etárias BrancosNegros BrancosNegros Até ¼ 16 a 1720,139,9 8,818,3 18 a 2415,333,4 6,313,8 25 a 2915,533,2 5,512,8 30 e mais10,325,6 3,79,4 1/4 a ½ 16 a 1723,531,4 17,429,8 18 a 2420,029,3 12,123,4 25 a 2920,727,7 11,322,5 30 e mais17,527,5 9,218,9 1/2 a 1,5 16 a 1738,024,4 49,942,9 18 a 2442,230,8 46,848,5 25 a 2939,731,6 41,946,0 30 e mais44,237,0 44,350,9 1,5 a 3 16 a 1711,93,3 16,77,4 18 a 2414,14,9 24,011,4 25 a 2914,35,5 25, e mais15,77,1 25,415 Mais de 3 16 a 176,51,1 7,21,7 18 a 248,41,5 10,82,9 25 a 299,82,0 16,14,7 30 e mais12,42,8 17,45,7 Tabela - Porcentual de jovens e da população com 16 anos de idade ou mais por raça, segundo a renda per capita domiciliar e faixas etárias selecionadas. Brasil, 1992, 2002 e Fonte: Microdados PNAD/IBGE Nota: Todos os dados com base no salário mínimo de setembro de 2012 foram ajustados pelo INPC.

O UTRAS VIOLÊNCIAS SISTÊMICAS AnoRaça Metropolitana Urbana não metropolitana Rural 16 a a a e mai s 16 a a a e mais 16 a a a e mais 2002 Branco s 21,545,048,064,3 11,525,032,347,7.3,24,73,4 Negro s 22,724,527,940,2 4,59,713,822,2.0,90,11, Branco s 47,368,168,378,1 45,849,955,063,0 28,44,411,99,1 Negro s 41,647,553,262,2 33,234,436,343,0 10,54,66,75,0 Tabela 2 - Porcentual de moradias adequadas segundo a raça para a população com 16 anos ou mais segundo o local da residência. Brasil, 2002 e 2012 Fonte: PNAD 2002 e 2012/IBGE Notas: - Até 2001, exclusive a população da área rural de Rondônia, Acre, Amazonas, Roraima, Pará e Amapá. Resultados para domicílios particulares permanentes.

Taxa de desocupação da população de 10 anos ou mais de idade segundo Cor/Raça, e Faixa Etária - Brasil, 1995, 2003 e 2013 BrancaNegra Total5,78,85,46,710,77,5 10 a 15 anos10,815,719,19,41214,6 16 a 17 anos14,12522,513,723,223,1 18 a 24 anos10,216,911,511,219,215,2 25 a 29 anos5,89,36,76,511,59,2 30 a 44 anos3,96,14,14,885,8 45 a 59 anos2,54,72,42,75,23,3 60 anos ou mais 1,32,51,81,732 Fonte: IBGE/PNAD Elaboração: IPEA/DISOC **a taxa de desocupação é o quociente entre a população desocupada e a população economicamente ativa, na faixa etária determinada.

O UTRAS VIOLÊNCIAS SISTÊMICAS Rendimento Médio Mensal de Todas as Fontes da População Ocupada de 16 anos ou mais de idade, por Sexo, segundo Cor/Raça e Localização do Domicílio - Brasil e Regiões, 1995 a 2013 Cor/Raça Região e Localização do Domicílio Total Branca Brasil1.741, , ,60 Norte1.673, , ,40 Nordeste1.096,10961,11.525,00 Sudeste2.044, , ,20 Sul1.476, , ,20 Centro-Oeste1.763, , ,40 Urbano2.005, , ,40 Rural631,8673,91.118,00 Negra Brasil820,9731,91.228,10 Norte1.073,40799,21.146,30 Nordeste592,8539,5952,7 Sudeste1.023, ,50 Sul835,9779,81.329,00 Centro-Oeste1.007,60963,51.624,80 Urbano992,1838,51.353,40 Rural375,1347,1687,4 Fonte: IBGE/PNAD Elaboração: IPEA/DISOC *a população negra é composta por pretos e pardos **rendimento de todas as fontes deflacionado com base no INPC, período de referência set./2013 RENDA

Distribuição Percentual da População Ocupada de 16 anos ou mais de idade, segundo Cor/Raça e Faixa de Rendimento no Trabalho Principal - Brasil, 1995, 2003 e 2013 Cor/Raça Faixa de Rendimentos Total Branca Até 1 SM46,650,123,6 Mais de 1 a 3 SM34,134,954,0 Mais de 3 a 5 SM9,48,110,2 Mais de 5 a 8 SM4,63,46,4 Mais de 8 SM5,33,55,8 Total100,0 Negra Até 1 SM69,973,441,5 Mais de 1 a 3 SM23,722,449,3 Mais de 3 a 5 SM3,92,75,3 Mais de 5 a 8 SM1,50,92,4 Mais de 8 SM1,10,61,4 Total100,0 Fonte: IBGE/PNAD Elaboração: IPEA/DISOC * a PNAD não foi realizada nos anos de 2000 e 2010 ** em 2004 a PNAD passa a contemplar a população rural de Rondônia, Acre, Amazonas, Roraima, Pará e Amapá *** a população negra é composta por pretos e pardos **** rendimento do trabalho principal deflacionado com base no INPC, período de referência set./2013

As continuidades históricas: o direito penal no Brasil foi fundado não no crime, mas no criminoso. E o criminoso é um oponente racializado; O sistema penal não foi instituído para conter delitos, mas para perseguir indivíduos. É nesse contexto que podemos compreender toda a legislação contra a vadiagem no período imperial; a arquitetura do sistema policial contemporâneo, instituído em 1825 para coibir a vadiagem, reprimir os quilombos, instituir os açoites em locais públicos e cadastrar capitães do mato; a repressão a formas autônomas de produção do espaço pelos negros (quilombos, terreiros e cantos de trabalho); o controle da circulação e permanência em espaços públicos; o controle da atividade profissional na rua; o controle das diversões públicas dos negros e medidas higienistas. O que tem tornado possível a violência letal de jovens, inclusive a policial, na escala em que ocorre no Brasil?

A BORDAGEM POLICIAL E RACISMO Estudo feito pelo Grupo de Estudos sobre Violência e Administração de Conflitos (GEVAC/ UFSCAR) sobre mortes provocadas por policiais do Estado de São Paulo entre 2009 e 2011 aponta que: 61% das vítimas eram negras e jovens entre 15 e 29 anos no Estado. Os policiais autores das mortes eram majoritariamente brancos (79%) e, dos inquéritos instaurados, nada menos que 94% foram concluídos sem indiciamento. Entre argumentos inscritos nos inquéritos, 73% consideravam não haver homicídio cometido por policiais. Este mesmo estudo aponta que é sobre a população negra que recai a maior vigilância policial, em consonância com a associação do corpo negro à criminalidade. No Estado de São Paulo, no ano de 2012, para cada 100 mil negros, 35 foram presos em flagrante (Sinhoretto, Silvestre e Schilittler, 2014).

A POLÍCIA COMO UM DOS PRINCIPAIS VETORES DE VIOLENCIA Nos Estados Unidos, entre 1983 e 2012, pessoas foram mortas pelas policias norte-americanas. No Brasil, entre 2009 e 2013, pessoas morreram. Sabemos, porém, que esses números são nitidamente subnotificados no Brasil; No Brasil 80% dos crimes promovidos por grupos de extermínio têm a participação de policiais ou de ex- policiais, segundo o Relatório Final da Comissão Parlamentar de Inquérito do Extermínio no Nordeste;

V ITIMIZAÇÃO POLICIAL X VÍTIMAS DA POLÍCIA Fonte: Secretarias Estaduais de Segurança Pública e/ou Defesa Social; Sistema Nacional de Informações de Segurança Pública, Prisionais e sobre Drogas (SINESP)/ Secretaria Nacional de Segurança Pública (Senasp) /Ministério da Justiça; Fórum Brasileiro de Segurança Pública.

A VITIMIZAÇÃO POLICIAL E AS VÍTIMAS DA POLÍCIA

Os autos de resistência Parte significativa das mortes é produto de uma espécie de pena de morte socialmente consentida e legalizada desde a ditadura militar, quando fora instituído oficialmente o auto de resistência nas rotinas operacionais da força policial (Souza, 2010). Os autos de resistência constituem uma espécie de licença legítima para matar e, embora já existissem como prática desde o século XIX, foram legalizados pela ordem de serviço n o 803 de 02 outubro de A sua regulamentação fez parte de um conjunto de medidas autoritárias e excepcionais, da mesma natureza da lei de segurança nacional (Decreto Lei 898/1969), da legalização da pena de morte, prisão perpétua e da prática clandestina de extermínio. Em suma, os autos de resistência serviram historicamente para mascarar execuções sumárias, chegando a ser utilizados, entre os anos 1995 e 1999, no Rio de Janeiro, como critério para obtenção de gratificação de desempenho (Souza, 2010). O que tem tornado possível a violência letal de jovens, inclusive a policial, na escala em que ocorre no Brasil?

O SISTEMA PRISIONAL Um importante componente para entendermos a violência no Brasil e sua expressão são os dados sobre população carcerária. Porque elas revelam outras formas de morrer na sociedade brasileira hoje. A população carcerária brasileira, segundo o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), atingiu presos, dos quais estão em prisão domiciliar. Deste total, o número de presos provisórios- aqueles que aguardam julgamento definitivo – é de 32% (CNJ, 2014b); 61% do total de presos o no Brasil são negros (pretos e pardos), segundo o CNJ; Estes números colocam o Brasil em terceiro lugar no ranking de países com maior população prisional, atrás apenas dos Estados Unidos e China. Se considerarmos ainda o numero de mandados de prisão em aberto, este número pode saltar para pessoas em cárcere ou passível de encarceramento (op cit.). Lembremos que em 9 estados da federação há mais presos provisórios do que condenados, submetidos a condições degradantes e sem direito a ampla defesa, dado que 95,4% das comarcas do Brasil não possuem defensor público ou o possuem em número insuficiente, segundo o mapa das defensorias públicas no pais (Moura et al, 2013).