Princípios Jurídicos norteadores do Direito de Família

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Fontesdo Direito de Familia
Transcrição da apresentação:

Princípios Jurídicos norteadores do Direito de Família

É importante entender que normatizar adequadamente a família e as relações a ela pertinentes é um grande desafio jurídico. No passado, o positivismo tentando resguardar ao direito o caráter científico, determinava que as decisões fossem decididas de forma lógica, não cabendo qualquer tipo de problematização. Tanto é que Hans Kelsen defendia a impossibilidade de interpretações subjetivas, pois eram consideradas arbitrárias. Ele defendia a existência de um quadro de interpretações possíveis, logo a solução deveria se encontrar no limite daquela moldura. Nos moldes do positivismo a idéia de completude era latente, não havia qualquer possibilidade de reconstrução normativa. Todos os problemas seriam solucionados de acordo com as regras postas no ordenamento jurídico.

Contudo, os próprios positivistas se depararam com a insuficiência de suas teorias. Superado o silogismo da subsunção do fato à norma verifica-se o raciocínio dialético: este leva-se em conta o valor da solução e sua conformidade com o direito. É assim, um processo intelectual do jurista que se propõe a interpretar o direito para determinar a norma jurídica adequada ao caso concreto e assim resolver um conflito de interesses. O intérprete, o juiz, o advogado, orientados por princípios e regras são atores da cena jurídica que determinam as normas adequadas à solução dos problemas que se lhes oferece.

Na fase pós-positivista o que se propõe é justamente reconhecer os princípios como integrantes do sistema jurídico tornando-os vinculantes. O direito brasileiro constitui-se não só de regras, mas também de princípios, desta forma, diante da solução dos casos concretos não somente deve-se recorrer ao que está positivado no ordenamento jurídico. Recorre-se também aos princípios que são normas assim como as regras postas. O direito hoje deve ser visto como uma comunidade de princípios abandonando a idéia mecânica do positivismo jurídico (subsunção do fato à norma) Passa-se a interpretar a partir de um sistema coerente de princípios. Os chamados hard cases são os casos em que uma simples regra do tipo lógico-dedutivo não é suficiente mais para dar solução. É preciso, portanto, recorrer aos princípios jurídicos.

O que são princípios? Ele diferencia os princípios da regras deixando claro que ambos estão no plano deôntico (dever-ser). Ensina ainda que as regras e princípios são espécies do gênero norma e que a validade e aplicação das regras estão previamente determinadas no sistema (a regra do tudo ou nada), enquanto que os princípios são mandados de otimização, permitindo gradação de aplicação (ora em grau maior, ora em grau menor) A lei da ponderação diante de uma colisão de princípios propostas por Alexy pressupõe hierarquia entre estes.

Habermas atribui uma normatividade aberta aos princípios, dotando-lhes de obrigatoriedade absoluta, ou seja, os princípios são normas cujo conteúdo se preencherá conforme o caso concreto (no momento da aplicação). Neste sentido também entende Dworkin ao defender que os princípios hão de levar a uma única decisão, adequada ao caso e não uma decisão que atenda maior ou menor grau. Uma norma jurídica, portanto, imperativa não pode ser mais ou menos cumprida e respeitada. Não há que se hierarquizar as regras e os princípios: ambos têm validade e normatividade no ordenamento jurídico.

Diferentemente dos valores, estes sim podem ser graduados, pois gravitam no plano da axiologia (ser). Não se podem confundir valores com princípios (é o que parece fazer Alexy). O que é bom ou ruim, melhor ou pior para um pode não o ser para o outro. E os princípios não podem ser objetos de preferência, pois são deônticos (dever-ser) e a todos vincula e obriga.

Princípios de Direito das Famílias Conforme já comentado anteriormente, os princípios se conformam e se preenchem diante do caso concreto (com todas as suas vicissitudes e particularidades), contudo, há que se determinar um substrato material mínimo. Didaticamente resolvemos comentar de alguns, destes, outros princípios se fundamentam:

1) Princípio do livre desenvolvimento da personalidade A idéia de dignidade está voltada especificamente para o propósito de proteção da pessoa humana (com toda sua complexidade e pluralidade). Atualmente a pessoa passa a ser compreendida como singularidade, como um ser idêntico apenas a si mesmo e, nessa medida, carecedor de cuidado peculiar. A pessoa humana passa a ser tomada como um fim e não como meio – como era até então posta para consecução dos objetivos patrimoniais. E a forma mais genuína de se proteger a o ser humano é protegendo o efetivo desenvolvimento de sua personalidade.

Ser pessoa não se constitui algo pronto e acabado Ser pessoa não se constitui algo pronto e acabado. É um constante “sendo” e como conseqüência deve-se entender que a defesa da dignidade pauta-se justamente no resguardo de sua personalidade garantindo-lhe pleno desenvolvimento. Na medida em que resguarda o desenvolvimento da personalidade, resguarda também o efetivo exercício da autonomia pessoal (autonomia privada). O princípio do livre desenvolvimento da personalidade talvez seja a primeira condição para que o indivíduo se constitua como pessoa.

2) Princípio da afetividade (?) O afeto é um valor, um fato de pode trazer conseqüências para o direito, contudo não parece ter natureza normativa (obrigatoriedade) Portanto soa dúbia a afirmação daqueles que lhe atribuem a qualidade de princípio jurídico. Os princípios jurídicos são normas e por isso de obrigatória observância. A afetividade é passível de cobrança? Pode-se impor a alguém que tenha afeto a outro? A conclusão é que embora a afetividade mereça atenção jurídica não pode ser considerada um princípio jurídico.

3) Princípio da pluralidade de entidades familiares O conceito atual da família sugere uma variedade de concretizações possíveis. Hoje não cabe mais falar em família única. A família contemporânea compreende uma pluralidade de formações. Daí falar-se em famílias. Essa multiplicidade não é atual, embora sua tutela sim. No passado já se vislumbrava diferentes modelos familiares, porém o direito ignorava sua existência. A CF/88 enuncia em seu art. 226 as entidades familiares tuteladas pelo Estado. O rol é exemplificativo, ou seja, não se esgota ali.

4) Princípio da Monogamia (?) No passado, direito e religião se misturavam, ainda que de forma disfarçada. Essa interferência acabou por normatizar uma série de regras jurídicas recheadas de cunho religioso. Além de atribuir somente tutela para a família formada à partir do casamento ( diante da benção divina) e de caráter indissolúvel ( o que Deus uniu o homem não separa). A igreja estabeleceu a exclusividade conjugal, ou seja, a monogamia. Diante, porém, de toda reformulação sociojurídica pela qual passou a família, superando a preponderância do teor patrimonialista a diante da instalação de um Estado laico fica a dúvida sobre a possibilidade de ainda hoje se defender a monogamia como um pilar sustentador da formação familiar, imposto juridicamente.

Se entendermos a monogamia como um princípio devemos entender que a fidelidade é algo obrigatório, ou seja, um imperativo que a todos vincula. Onde fica a liberdade entre os conviventes, a autonomia privada? Isso não deveria ficar a cargo das partes e o Estado nesse ponto deveria se abster de qualquer manifestação? A monogamia é um valor que não alcança o status de princípio jurídico. E sendo um valor, a aferição de bom ou ruim é relativo e pessoal.

5) Princípio da Solidariedade A constituição da pessoa requer invariavelmente sua interação com o outro. As pessoas não são apenas responsáveis pela formação de si próprias, mas também pela formação dos demais integrantes da sociedade, portanto, é preciso impeli-las a ofertar esse auxílio. Trata-se de mais uma forma de garantir a realização da tutela dos homens e de sua humanidade. Ao lado do Estado todos os integrantes da sociedade também são, a partir do imperativo constitucional, juridicamente responsáveis uns pelos outros. A idéia atual de solidariedade é outra. É considerada como dever jurídico

A solidariedade alcança duas faces complementares entre si: uma positiva e outra negativa. Negativa: se explica pela ordem de respeito e tolerância frente à forma eleita pelo outro para sua realização pessoal. Positiva: explica-se pelo imperativo de sanar as carências do outro a fim de conceder-lhe situação adequada ao seu livre e pleno desenvolvimento. A finalidade da solidariedade é contribuir para a autodeterminação. O fato de que a sociedade tem por base a família, é de ser deduzir ser este o primeiro núcleo no qual a solidariedade deve imperar. Originária e preferencialmente, os familiares hã de ser solidários entre si, a fim de auxiliar a promoção do livre desenvolvimento da personalidade de todos.

6) Princípio da Igualdade Há três versões principais do conceito de igualdade. Essas versões são sucessivas no tempo e se complementam. Igualdade formal: traduz-se na máxima “todos são iguais perante a lei”. Tal igualdade desmerecia qualquer peculiaridade econômica ou pessoal. A referida igualdade perdurou por vários períodos na história que com o tempo foi verificada a necessidade de sua alteração visto que não se atingia os objetivos almejados. Igualdade material: consiste num suplemento à primeira idéia. Trata então os desiguais de acordo com as suas desigualdades. Assim não há discrepância entre um consumidor e fornecedor, por exemplo.

Igualdade material identitária: é a versão mais atual da igualdade material. Complementa-a, mas sua materialidade afeta a ordem pessoal, não só patrimonial. Questões pessoais de gênero, idade, raça orientação sexual são consideradas de tal modo que se respeitem as diferenças. A CF/88 arremata esse processo. O princípio da igualdade nela previsto impõe um tratamento legal que seja a todos similar estando atentas as suas próprias diferenciações, tanto de ordem econômica como identitária. Proíbe-se a desigualdade nas relações de gênero (masculino e feminino), nas relações de filiação (de todas as origens) e entre as entidades familiares (matrimoniais e não matrimoniais).

Isso não quer dizer que todo tratamento jurídico dos homens e mulheres, dos filhos e das famílias há de ser idêntico. A igualdade proposta é atenta às diversidades existentes. Ex: licença maternidade X licença paternidade

7) Princípio da proteção especial Ganha relevo o tratamento jurídico dispensado a alguns sujeitos, ora porque situados em fases especiais do processo de auto-formação (criança e adolescente, idosos), ora porque portadores de delicada condição pessoal (doentes e deficientes mentais) O que todos têm em comum é a carência de habilidade para o exercício de sua autonomia e nessa feita para a realização de escolhas atinentes à construção de sua personalidade

O problema daí derivado é como coordenar essa tentativa de preservação de capacidade, de autodeterminação entre estes indivíduos. É preciso priorizar o exercício da autonomia da maior forma possível, principalmente tratando de direitos fundamentais. Isso vale pra todos, especialmente para as crianças, adolescentes, idosos, doentes e deficientes mentais.