Farmacoterapia I Faculdade de Farmácia de Lisboa 2009 Manuel Caneira Farmacoterapia da dor Farmacoterapia I Faculdade de Farmácia de Lisboa 2009 Manuel Caneira
Dôr Motivo mais comum de consulta médica Função dos sistema sensitivo para estímulos dolorosos é de detectar, localizar e identificar estímulos nocivos Permite ao indivíduo desencadear medidas apropriadas à situação
Dôr Acompanha-se de ansiedade Carácter dual: sensação/emoção Pode acompanhar-se de outros sinais ou sintomas Aumento da pressão arterial Midríase Aumento da frequência cardíaca Contractura muscular, etc
Dôr Nocicepção Nervo periférico Neurónios sensoriais primários aferentes Neurónios motores Neurónios pós-ganglionares simpáticos Corpos celulares de células aferentes localizadas nos gânglios dorsais
Dôr Nocicepção Axónios de neurónios aferentes bifurcam-se Terminação para medula Terminação periférica Fibras aferentes classificadas de acordo com diâmetro, mielinização e velocidade de condução
Dôr Nocicepção Fibras A-beta Maior diâmetro Respondem ao toque suave e/ou movimento Nervos que inervam a pele Habitualmente não produzem dôr
Dôr Nocicepção Fibras A-delta (pequenas e mielinizadas) Fibras C (pequenas e não mielinizadas) Nervos cutâneos Habitualmente respondem com intensidade máxima a estímulos dolorosos Nociceptores primários aferentes
Dôr Nocicepção A percepção de estímulos dolorosos é abolida com o bloqueio de fibras A-delta e C Maioria dos nociceptores responde a estímulos mecânicos intensos (p.e. bliscadura), ao calor e químicos irritantes
Dôr Sensibilização Estímulos intensos, repetidos ou prolongados na presença de inflamação ou lesão tecidual Baixam limiar de excitação Aumentam resposta de nociceptores Bradicinina Prostaglandinas Sensibilização Leucotrienos
Dôr Sensibilização Nos tecidos sensibilizados estímulos inócuos podem produzir dôr Hiperalgesia p.e. queimadura solar Estruturas habitualmente indolores (p.e. articulações, vísceras) tornam-se excessivamente sensíveis às forças mecânicas Nociceptores silenciosos
Dôr Sensibilização Activação directa Pressão localizada (p.e.) conduz à lesão celular com libertação de K+ celular síntese de PGs, bradicinina e outros mediadores da dôr Podem ser responsáveis pela persistência da dôr após supressão do estímulo
Dôr Sensibilização
Dôr Sensibilização A maioria dos nociceptores tem função neuroefectora Contêm mediadores polipeptídicos que libertam dos terminais quando são estimulados p.e. Substância P Vasodilatador Desgranulante de mastocitos Quimiotático para leucocitos Aumenta produção e libertação de mediadores inflamatórios
Dôr Sensibilização Activação secundária Impulsos gerados produzem, a nível local, libertação de péptidos (p.e. substância P) Vasodilatação e edema neurogénico Libertação de histamina (mastocitos) e serotonina (plaquetas)
Dôr Sensibilização
Dôr Vias ascendentes Neurónio periférico Raíz medular posterior Massa cinzenta de corno posterior da medula Corno anterior contralateral Feixe espinotalâmico+espinoreticulotalâmico Interrupção leva a perda definitiva de sensibilidade dolorosa e temperatura Tálamo Córtex cerebral somato-sensorial e emocional (lobo frontal)
Dôr Vias ascendentes
Dôr Dôr referida Cada neurónio espinal (corno posterior da medula) recebe aferências de numerosos neurónios Convergência de estímulos gera dôr referida (p.e. diafragma central/ombro)
Dôr Modulação endógena da dôr Indivíduos diferentes reagem de forma diferente a estímulos semelhantes Por vezes fenómenos de antecipação Resposta varia no mesmo indivíduo em diferentes períodos Evidência de substâncias endógenas com capacidade de modulação da dôr através de via descendente
Dôr Modulação endógena da dôr Substâncias envolvidas Encefalinas, beta-endorfina Actuam em receptores opioides Receptor m: principal local de acção dos morfinomiméticos Receptores d e k
Dôr Modulação endógena da dôr Via descendente Cortex frontal Hipotálamo Mesencéfalo (substância periaquedutal) Projecção directa no corno posterior da medula ou através de sinapses intermediárias. Vias noradrenégicas ou serotoninérgicas que podem ser activadas por met-encefalina Medula espinal
Dôr Modulação endógena da dôr
Dôr Modulação endógena da dôr Dôr prolongada ou medo são estímulos importantes para actuação de opióides endógenos Modulação é bidireccional Analgesia ou aumento da dôr Percepção da dôr pode existir na ausência de estímulo (sugestão)
Dôr Neuropática Lesões do sistema nervoso periférico Dôr pouco usual Trauma, neuropatia diabética, herpes zoster Raramente por lesão do SNC (p.e. tálamo) Dôr pouco usual Sensação de queimadura, choque eléctrico Associa-se a déficite sensorial correspondente Terminações nervosas lesadas tornam-se muito sensíveis
Dôr Neuropática
Dôr Tratamento Remoção da causa é o tratamento ideal Tratamento sintomático é frequente Durante investigação diagnóstica Causa intratável Durante remissão da causa
Dôr AINEs Particularmente úteis na dôr de origem musculo-esquelética e cefaleias moderadas Actuam, na sua maioria, por inibição da síntese de PGs Problema limitante mais comum: efeitos gástricos Muitos disponíveis sem prescrição
AINEs Grupo heterogénio Diversos grupos não quimicamente relacionados Maioria são ácidos orgânicos Protótipo: Aspirina
AINEs - História As propriedades medicinais da casca de salgueiro são reconhecidas há séculos Em meados do século XVIII o reverendo Edmund Stone dirige carta à Royal Society referindo o sucesso da casca de salgueiro no tratamento de febre Componente activo, um glicósido denominado salicina, foi isolado em 1829 (Leroux)
AINEs - História Hoffman, um químico empregado da Bayer, produz ácido acetilsalicílico Após demonstração das propriedades anti-inflamatórias foi introduzido na medicina em 1899 por Dreser sob o nome de aspirina Pensa-se que o nome derive de Spiraea, uma planta de onde o ácido salicílico teria sido uma vez preparado
AINEs Efeitos terapêuticos Dôr Baixa ou moderada intensidade Ausência de efeitos depressores do SNC Ausência de dependência física Não alteram outras percepções para além da dôr Dôr pós-operatória inflamatória pode ser particularmente bem controlada Dôr visceral mal aliviada
AINEs Efeitos colaterais Ulceração e intolerância gastrointestinal Bloqueio da agregação plaquetária Inibição da motilidade uterina Inibição da função renal mediada por PGs Reacções de hipersensibilidade
AINEs Efeitos colaterais Ulceração gástrica e intestinal Perda sanguínea - anemia Administração crónica aumenta risco (3x) Variação entre os diferentes AINEs
AINEs Efeitos colaterais Ulceração gástrica e intestinal Irritação local Administração oral Inibição da síntese de PGs (PGI2 e PGE2) citoprotectoras Inibem secreção ácida Aumentam fluxo sanguíneo local Promovem secreção de muco
AINEs Efeitos colaterais Ulceração gástrica e intestinal Todos os AINEs excepto derivados do para-aminofenol PGE1 (misoprostol) com AINEs minimiza efeito
AINEs Efeitos colaterais Bloqueio da agregação plaquetária Por prevenção da formação de tromboxano A2 (TXA2) TXA2 é um potente agregante plaquetário Aspirina particularmente efectiva por inibição irreversível da COX
AINEs Efeitos colaterais Inibição da motilidade uterina PGs da série E e F são uterotrópicas Aumentam horas antes do parto Papel major no início e progressão do trabalho de parto Os AINEs já foram utilizados como tocolíticos na ameaça de parto pré-termo
AINEs Efeitos colaterais Inibição da função renal dependente das PGs AINEs com pouca interferência em indivíduos normais Causam diminuição de filtração glomerular quando esta é mais dependente das PGs Insuficiência cardíaca congestiva Cirrose hepática com ascite Insuficiência renal crónica (IRC) Hipovolémia Podem precipitar IR aguda
AINEs Efeitos colaterais Outros efeitos renais Retenção de sódio e água Edema em alguns doentes Redução de eficácia de anti-hipertensores Hipercaliémia (K+) por aumento de reabsorção de potássio Por diminuição de Na+ a nível tubular distal Por diminuição da produção de renina induzida pelas PGs Nefrite intersticial (raro)
AINEs Efeitos colaterais Reacções de hipersensibilidade Rinite vasomotora, pólipos nasais Edema angioneurótico Urticária Broncoconstrição Edema laríngeo Choque
AINEs Efeitos colaterais Reacções de hipersensibilidade Raro na criança Mais frequente nos adultos de meia idade Hipersensibilidade cruzada existe
AINEs Efeitos colaterais Reacções de hipersensibilidade Devido a derivação do ácido araquidónico para a via das lipo-oxigenases (leucotrienos)?
AINEs Selecção Largamente empírica Grande variabilidade de resposta individual Em doenças inflamatórias crónicas (p.e. artrite reumatóide) devem ser prescritas doses baixas inicialmente
AINEs Selecção Evitar administração combinada de AINEs (efeitos adversos aditivos) Nas crianças utilizar apenas fármacos amplamente testados neste grupo Não são recomendados na gravidez Paracetamol provavelmente o mais seguro
AINEs Selecção Prever interações com outros fármacos Custo Varfarina: potenciam por ligação à albumina e por acção directa nas plaquetas Ligação à albumina (salicilatos, fenilbutazona) Custo Terapêutica a longo prazo
AINEs Paracetamol Acetanilida Acetaminofeno Fenacetina Anilina NHCOCH3 Acetanilida OH NH3 OC2H5 NH2 O R COOCH3 Acetaminofeno Fenacetina Anilina Acetaminofeno conjugado Para-fenetidina Metabolitos formadores de metahemoglobina e outros
AINEs Paracetamol Acetaminofeno, N-acetil-p-aminofenol Derivado do para-aminofenol Alternativa à aspirina como antipirético e analgésico (não difere significativamente) Actividade anti-inflamatória pouco intensa Bem tolerado Muito menos efeitos adversos que aspirina e maioria dos AINEs (plaquetas, gástricos, acidose) Toxicidade hepática pode ser fatal
AINEs Paracetamol Baixa capacidade anti-inflamatória não completamente esclarecida Fraco inibidor da COX na presença de altas concentrações de peróxidos encontrados nos tecidos inflamatórios ? Não inibe activação de neutrófilos como outros AINEs
AINEs Paracetamol Uma pequena porção é hidroxilada a nível hepático dando origem a composto muito reactivo que reage com grupos sulfidril de glutatião Grandes doses causam depleção de glutatião reduzido Na ausência de glutatião o metabolito liga-se a grupos sulfidril proteicos com necrose hepática Efeito contrariado por administração de N-acetilcisteína (oral, e.v.)
AINEs Paracetamol Utilizações terapêuticas Efeitos tóxicos Antipirético, analgésico Situações em que aspirina está contraindicada Efeitos tóxicos Hepatotoxicidade Hipersensibilidade Neutropénias hematológicas
Dôr Opioides São os agentes mais potentes no alívio da dôr Morfina, diamorfina (heroína), codeína, levorfanol, meperidina (petidina), fentanil… Depressores respiratórios Reverssível com naloxona Dependência física Prurido, obstipação, náuseas, vómitos
Dôr Opioides Erro mais comum: sub-terapêutica Possibilidade de auto-administração Aparelho libertador de dose pré-estabelecida Limite de dose máxima Administração Oral Endovenosa Intratecal, epidural (menos efeitos acessórios) Intranasal (p.e. butorfanol) Rectal Transdérmico (fentanil)
Dôr Opioides e Inibidores da ciclo-oxigenase Podem ter efeitos aditivos Mecanismos de acção distintos Permitem baixar dose de cada grupo Sem efeitos secundários aditivos
Dôr Opioides e Inibidores da ciclo-oxigenase
Dôr Crónica Avaliação Causa conhecida e intratável Artrite, neoplasia, neuropatia diabética Dôr persistente após tratamento da causa Lesão de nervo sensorial, distúrbio simpático Perturbações psicológicas
Dôr Crónica -Tratamento Estabelecer objectivos definidos Retomar actividade profissional? Dormir? Passear? Abordagem multidisciplinar Medicação Psicoterapia Fisioterapia Bloqueio nervoso Cirurgia
Dôr Crónica -Tratamento Antidepressivos tricíclicos Muito úteis nestes doentes Produzem analgesia por mecanismo desconhecido Doses mais baixas que as usadas como antidepressivas Alívio também verificado em doentes não deprimidos Alguma evidência de potenciação de opiodes
Dôr Crónica -Tratamento Antidepressivos tricíclicos Utilidade na dôr de diversas etilogias Neoplasias (adjunto de opioides) Dôr neuropática (diabetes, herpes) Artrite reumatóide (alívio mas não analgesia)
Dôr Crónica -Tratamento Anticonvulsivos, antiarrítmicos e outros Na dôr neuropática Fenitoína, carbamazepina, lidocaína, mexiletina Gabapentina Mecanismo de acção exacto desconhecido Estruturalmente relacionado com o GABA (ácido gama-aminobutírico)
Dôr Crónica -Tratamento Medicação opioide crónica Aceite para patologia maligna Controverso noutra patologia Única opção possível em muitos doentes Ocorre dependência a longo prazo Preparações de longa duração Levorfanol, metadona, morfina de libertação lenta
Indicações passíveis de automedicação Odontalgias Estomatites (excluindo graves) e gengivites Odinofagia, faringite (excluindo amigdalite) Hemorróidas (diagnóstico confirmado) Anestesia tópica em mucosas e pele nomeadamente mucosa oral e rectal
Indicações passíveis de automedicação Sintomatologia associada a estados gripais e constipações Cefaleias ligeiras a moderadas Enxaqueca com diagnóstico médico prévio
Indicações passíveis de automedicação Dores musculares ligeiras a moderadas Contusões Dores pós-traumáticas Dores reumatismais ligeiras moderadas (osteartrose/osteoartrite) Dores articulares ligeiras a moderadas Tratamento tópico de sinovites, artrites (não infecciosa), bursites, tendinites Inflamação moderada de origem músculo-esquelética nomeadamente pós-traumática ou de origem reumática
Indicações passíveis de automedicação Dismenorreia primária
MNSRM - Dor Bufexamac (topical) Diclofenac (topical) Etofenamate (topical) Flurbiprofen (oral topical) Ibuprofen (topical) Indomethacin (topical) Ketoprofen (topical) Niflumic acid (topical) Piroxicam (topical)
MNSRM - Dor Acetylsalicylic acid Benzydamine Codeine Dihydrocodeine Glucosamine Ibuprofen Naproxen Paracetamol
MNSRM - Dor LOCAL ANAESTHETICS (tópicos) Benzocaine Cinchocaine Lidocaine Oxetacaine Oxybuprocaine Prilocaine