Questão social, pobreza e famílias

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Transcrição da apresentação:

Questão social, pobreza e famílias Profª Elizabete Rosa

Separação entre o Econômico e o Social A expressão "questão social" começa a ser empregada maciçamente a partir da separação positivista, no pensamento conservador, entre: o econômico e o social. Dissociado as questões tipicamente econômicas das "questões sociais“, o "social" pode ser visto como "fato social", como algo natural, a-histórico, desarticulado dos fundamentos econômicos e políticos da sociedade, portanto, dos interesses e conflitos sociais. Assim, se o problema social (a "questão social") não tem fundamento estrutural, sua solução também não passaria pela transformação do sistema.

A origem desta separação A origem desta separação são os acontecimentos de 1830-48.

Revolução de 1848 Também chamada de Primavera dos Povos, este conjunto de revoluções, de caráter liberal, democrático e nacionalista, foi iniciado por membros da burguesia e da nobreza que exigiam governos constitucionais, e por trabalhadores e camponeses que se rebelaram contra as práticas capitalistas.

A crise se agravou atingindo a industria e as finanças. Os anos de 1845 e 1846 foram de péssimas colheitas, desencadeando uma crise agrícola em todo o continente. A má colheita de trigo desencadeou em 1846 uma série de revoltas camponesas. Essa crise desencadeou uma alta vertiginosa do custo de vida, atirou à miséria grandes setores da população rural e reduziu drasticamente a sua capacidade de consumo de produtos manufaturados A crise se agravou atingindo a industria e as finanças. A crise atingiu de forma diferente cada região. Foi predominantemente industrial na Inglaterra e na França, mas sobretudo agrícola na Irlanda e na Itália. De qualquer modo, atingiu duramente a massa popular, que, em 1848, conquistaram grande nitidez no cenário europeu.

Cerra o ciclo progressista Da compreensão dos nexos entre economia e sociedade. Há uma interdição da compreensão da relação entre desenvolvimento capitalista e pauperização.

A origem desta separação A origem desta separação são os acontecimentos de 1830-48. No momento em que a classe burguesa perde seu caráter crítico-revolucionário perante as lutas proletárias (cf. Lukács, 1992, p. 109 e ss.). Surge um tipo de racionalidade que, procurando a mistificação da realidade, cria uma imagem fetichizada e pulverizada desta. É o que Lukács chama de "decadência ideológica da burguesia".1 Segundo ele (1992, p. 123), "após o surgimento da economia marxista, seria impossível ignorar a luta de classes como fato fundamental do desenvolvimento social, sempre que as relações sociais fossem estudadas a partir da economia. Para fugir dessa necessidade, surgiu a sociologia como ciência autônoma [...]".

Questão social e suas manifestações Começa-se a se pensar então a "questão social", a miséria, a pobreza, e todas as manifestações delas, não como resultado da exploração econômica, mas como fenômenos autônomos e de responsabilidade individual ou coletiva dos setores por elas atingidos. A "questão social", portanto: passa a ser concebida como "questões" isoladas, e ainda como fenômenos naturais ou produzidos pelo comportamento dos sujeitos que os padecem.

A partir de tal pensamento, as causas da miséria e da pobreza estariam vinculadas a pelo menos três tipos de fatores 1) A pobreza está vinculado a um déficit educativo (falta de conhecimento das leis "naturais" do mercado e de como agir dentro dele). 2) A pobreza é visto como um problema de planejamento (incapacidade de planejamento orçamentário familiar). 3)Por fim, esse flagelo é visto como problemas de ordem moral-comportamental (malgasto de recursos, tendência ao ócio, alcoolismo, vadiagem etc.).

“Cultura” da Pobreza Surgem com essas 3 bases: a "cultura da pobreza", onde a pobreza e as condições de vida do pobre são tidas como produto e responsabilidade do limites culturais de cada indivíduo. Com esta concepção de pobreza (típica da Europa nos séculos XVI a XIX), o tratamento e o enfrentamento da mesma desenvolve-se fundamentalmente a partir da organização de ações filantrópicas.

“questões sociais” passa ser segmentado Assim, o tratamento das chamadas "questões sociais" passa a ser: segmentado: separado por tipo de problemas, por grupo populacional, por território filantrópico: orientado segundo os valores da filantropia burguesa moralizador: procurando alterar os aspectos morais do indivíduo comportamental: considerando a pobreza e as manifestações da "questão social" como um problema que se expressa em comportamentos, a solução passa por alterar tais comportamentos

Na Inglaterra, promulga-se a Lei dos Pobres (Poor Law), em 1601, que "instituía um aparato oficial, centrado nas paróquias, destinado a amparar trabalhadores pobres, sob o auspício da taxa dos pobres" (cf. Duayer e Medeiros, 2003, p. 241; também Martinelli, 1991, p. 33 e 55). Isto é, "durante os dois séculos de vigência dessa legislação, a Inglaterra cuidou do pauperismo através da 'beneficência' pelo caminho burocrático" (Duayer e Medeiros, ibidem). Footer Text 3/25/2017

A diferente forma de ver os pobres Em 1834, justamente no contexto de expressivas lutas de classes trabalhistas, o Parlamento inglês começa a entender a própria Lei dos Pobres como "a fonte principal da situação extrema do pauperismo inglês“. A partir do pensamento de Malthus, a beneficência "representaria um estímulo à miséria". Assim, a ação filantrópica estaria reforçando e estimulando os costumes e hábitos dos pobres, isto é, as (supostas) causas da pobreza. O sujeito que recebe assistência, beneficiário, acomodar-se-ia a tal situação, tendendo a reproduzir sua condição, sua pobreza. A assistência seria a verdadeira causa da ociosidade, da acomodação, do conformismo, enfim, da ­pobreza (cf. Martinelli, 1991, p. 58).

A diferente forma de ver os pobres Desta forma, em vez de tratar da pobreza com ações filantrópicas/assistenciais (como sendo um problema de déficit ou carência dos pobres), ela passa a ser reprimida e castigada (como sendo uma questão delitiva ou criminal dos pobres). A beneficência e os abrigos passam a ser substituídos pela repressão e reclusão dos pobres. A ideológica expressão de "marginal" começa a adquirir uma conotação de "criminalidade". O pobre, aqui identificado com "marginal", passa a ser visto como ameaça à ordem.

A separação do pobre e do trabalhador Aqui produz-se a separação entre: "pobre" (objeto de ações assistenciais, por mendicância e vadiagem) e "trabalhador" (objeto de serviços de Saúde e Previdência Social).

Diferentes concepções de "questão social", pobreza 1) A "questão social" é separada dos seus fundamentos: econômicos (a contradição capital/trabalho, baseada na relação de exploração do trabalho pelo capital, que encontra na indústria moderna seu ápice) e políticos (as lutas de classes). A "questão social" considerada como problemas sociais, cujas causas estariam vinculadas a questões culturais, morais e comportamentais dos próprios indivíduos que os padecem.

Diferentes concepções de "questão social", pobreza 2) A pobreza é atribuída a causas individuais e psicológicas, jamais a aspectos estruturais do sistema social.

Diferentes concepções de enfrentamento da pobreza A pobreza considerada como carência ou déficit: a resposta são ações filantrópicas e beneficência social Quando entendida como mendicância e vadiagem: a resposta é a criminalização da pobreza, enfrentada com repressão/reclusão) O enfrentamento, nessas concepções, sempre remete à consideração de que as causas da "questão social" e da pobreza encontram-se no próprio indivíduo, e a uma intervenção psicologizante, moralizadora e contenedora desses indivíduos. Trata-se das manifestações da "questão social" no espaço de quem os padece, no interior dos limites do indivíduo, e não como questão do sistema social.

E no contexto atual quais são as concepções da pobreza e suas formas de enfrentamentos?

A pobreza no contexto e no pensamento neoliberal No atual contexto, a programática neoliberal supõe a manutenção de um mínimo acionar estatal na área social: focalizado e precário, com programas de combate à fome e à miséria, financiados em parte por doações da "sociedade civil“ com retiros das classes trabalhadoras (rendas obtidas a partir do arrocho salarial, das reformas previdenciárias, da "flexibilização" das leis trabalhistas etc.).

Concepção neoliberal Neste quadro, o pensamento neoliberal concebe o pauperismo mais uma vez como um problema individual-pessoal e, portanto "devolve" à filantropia (individual ou organizacional) a responsabilidade pela intervenção social. Surge o debate do: "terceiro setor" (cf. Montaño, 2002), da filantropia empresarial (ou "responsabilidade social"), do voluntariado. A autoajuda, a solidariedade local, o benefício, a filantropia substituem o direito constitucional do cidadão de resposta estatal.

Enfrentamento da pobreza – concepção neoliberal A estratégia neoliberal orienta-se numa tripla ação: 1) Por um lado, a ação estatal, as políticas sociais do Estado, orientadas para a população mais pobre (cidadão usuário); ações focalizadas, precarizadas, regionalizadas e passíveis de clientelismo. 2) A ação mercantil, desenvolvida pela empresa capitalista, dirigida à população consumidora, com capacidade de compra (cidadão cliente), tornando os serviços sociais mercadorias lucrativas. 3)Finalmente, a ação do chamado "terceiro setor", ou da chamada sociedade civil (organizada ou não), orientada para a população não atendida nos casos anteriores, desenvolvendo uma intervenção filantrópica.

Referência Bibliográfica Martinelli, Maria Lúcia. Serviço social: identidade e alienação. São Paulo: Cortez, 1991. Lukács, Georg. Sociologia. In: NETTO, José Paulo (Org.). Grandes cientistas sociais, São Paulo: Ática, n. 20, 1992. Montano, Carlos. Pobreza, e questão social, Revista Serv. Soc. Soc. no.110 São Paulo, junho 2012.