Piaget: linguagem e as operações intelectuais Inicialmente Piaget acreditava numa relação estreita entre linguagem e pensamento, e portanto só estudava o pensamento verbal; Posteriormente ao estudo dos vários estágios de desenvolvimento, acredita que existe uma lógica da coordenação das ações mais profunda do que a lógica ligada à linguagem; A linguagem é condição necessária na consecução das estruturas lógicas, mas não é condição suficiente na sua formação e no que respeita às estruturas lógico-matemáticas elementares; Este fato constitui uma insuficiência da linguagem compensado pela participação das ações e da inteligência sensório-motora.
É na linguagem que estão inscritas as primeiras estruturas operatórias; Em primeiro lugar, nas operações concretas que se relacionam com os objetos (classes, números); Em segundo lugar, o sentido atribuído aos diferentes substantivos; As operações formais com a possibilidade de raciocinar a partir de simples hipóteses, são asseguradas pelo manejo da linguagem.
Pressupostos: A linguagem pode ser condição necessária à consecução das operações lógico-matemáticas sem com isso ser condição suficiente à sua formação; 1. Será que as raízes destas operações são anteriores à linguagem ou devem procurar-se nas condutas verbais? No nível sensório-motor verifica-se já a elaboração de um sistema de esquemas que prefiguram certos aspectos das estruturas de classes e relações; O esquema torna-se uma espécie de conceito prático, e na presença de um objeto novo para ele procura assimilá-lo generalizando-o;
A generalização dos esquemas é como que uma classificação em «compreensão» (qualidades comuns à generalização) e em «extensão» (situações à qual se aplica) mas sem que o indivíduo seja capaz de representar; A coordenação dos esquemas conduz a inferências práticas e principalmente a prefigurações das futuras noções de conservação e de reversibilidade operatória; Um exemplo destas prefigurações é o esquema de objeto permanente que constitui uma espécie de invariante do grupo.
Desta forma, anteriormente às operações formuladas pela linguagem existe uma espécie de lógica de coordenação das ações que manifestam relações de ordem e ligações de da parte ao todo (encaixe); Considerando que as operações resultam da interiorização das ações e das suas coordenações, permanecem independentes da linguagem; Antes da constituição das operações hipotético-dedutivas estreitamente solidárias com a palavra, observa-se o período das operações concretas ligadas à manipulação dos objetos.
2. A formação do pensamento está ligada à aquisição da linguagem ou à função simbólica geral? A formação do pensamento enquanto representação conceitual é seguramente correlativa da aquisição da linguagem pela criança; No entanto, o primeiro processo não é um resultado causal simples do segundo, pois ambos são solidários de um outro mais geral, a constituição da função simbólica. A linguagem surge no mesmo nível de desenvolvimento que o jogo simbólico, a imitação diferida e a imagem mental enquanto imitação interiorizada.
A transição entre as condutas sensório-motoras e as condutas simbólicas é assegurada pela imitação, cujos prolongamentos diferidos e a sua interiorização asseguram a diferenciação dos significantes e significados; É neste contexto de imitação que se adquire a linguagem, e este fato imitativo constitui um auxiliar essencial uma vez que se a aprendizagem da linguagem dependesse apenas de condicionamentos deveria ser muito mais precoce; É legitimo considerar a linguagem como desempenhando um papel central na formação do pensamento na medida em que constitui uma das manifestações da função simbólica, cujo desenvolvimento é dominado pela inteligência no seu funcionamento total.
3. Para se constituir no espírito da criança as estruturas operatórias é suficiente a transmissão verbal? A linguagem é condição necessária (mas não suficiente) à constituição das operações porque: * Apesar das classificações inscritas na linguagem, só no nível das operações concretas (7-8 anos) é que domina o manejo das definições inclusivas e das classificações em geral; * As expressões verbais que implicam uma conotação na inclusão duma subclasse numa classe (“algumas das minhas flores são amarelas”), só são dominadas graças ao jogo das operações aditivas e multiplicativas de classe, no nível em que a própria inclusão é assegurada; * A prática da numeração falada não basta para assegurar a conservação dos conjuntos numéricos, etc. A linguagem favorece a interiorização das ações e operações mas não cria nem transmite as estruturas já feitas por via exclusivamente linguística.
Através da análise prosseguida das relações entre o nível linguístico e o nível operatório a propósito de perturbações do desenvolvimento nestes domínios, autores evidenciam que um forte atraso linguístico não é acompanhado de nenhuma perturbação das operações intelectuais, e vice-versa. A análise das operações intelectuais nos surdos mostrou que estes possuem função simbólica sem conseguirem só por si chegar à linguagem articulada e que não são menos aptos em dominar as operações essenciais (ex.: seriação, classificação, perspectiva).