Imprensa e alimentos transgênicos Conflitos informativos e valores de argumentação Uma análise do período 1999-2000 Francisco Rolfsen Belda Jornal.

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Transcrição da apresentação:

Imprensa e alimentos transgênicos Conflitos informativos e valores de argumentação Uma análise do período 1999-2000 Francisco Rolfsen Belda Jornal Tribuna Impressa, Araraquara IEASC – USP, São Carlos LECOTEC – FAAC Unesp, em Bauru Instituto Agronômico de Campinas (IAC) Seminários I - Pós-Graduação Março/2010

Jornalismo científico Parte 1 Jornalismo científico

Comunicação da ciência Disseminação científica Difusão científica Divulgação científica Jornalismo científico Mediação crítica dos discursos sobre saberes e acontecimentos que atualizam a realidade

Mediação crítica da ciência Funções de selecionar, informar, interpretar, analisar, contrapor, avaliar, opinar. Interesse público Interesse do público Interesse do publicador Interesse do governo Interesse de pesquisa Interesse de empresa Interesse de ONG

Informação é poder “Se a população não compreende ciência, será pouco capaz de participar dos debates relativos às decisões que lhes dizem respeito. “ “Se a divulgação científica der às pessoas conhecimentos para que elas possam ponderar sobre as decisões, ou pelo menos saber em que especialistas confiar, essa divulgação é uma transmissão de poder” Gerard Fourez “A construção das ciências: introdução à Filosofia e à Ética das ciências” Ed. Unesp, 1995. p.221-2

Ciência é marketing? “Science (is) a marketing of ideas. (…) Scientists could make good use of basic marketing principles to develop effective strategies for promoting their theories.” Paul Peter & Jerry C. Olson “Is Science Marketing?”, 1983 Charge de Sidney Harris Tradução livre: “Não sinta-se mal por falsificar a solução. Eu falsifiquei o problema.”

Interesse do público No Brasil, as pessoas dizem ter muito interesse por (MCT, 2006): Esportes, 47% Ciência, 41% Moda, 28% Política, 20% Em SP, 35% das pessoas dizem não compreender textos científicos (RICT, 2007)

Circulação de revistas no Brasil Título Editora Tiragem Semanais Veja Abril 1 milhão Época Globo 420 mil Istoé Três 340 mil Caras 280 mil Mensais Nova Escola FVC 413 mil Cláudia 403 mil Seleções Reader´s Digest 397 mil Superinteressante 343 mil (ANER, 2008)

Audiência de televisão no Brasil Programa Pontos Participação Divulgação científica (sábado de manhã) Globo Educação 3 32% Globo Ciência 5 38% Globo Ecologia 5,5 Globo Universidade 7 Líderes de audiência no dia Caldeirão do Huck 19 41% Jornal Nacional 31 52% Duas Caras 40 63% Zorra Total 28 47% (Ibope, 2008)

Revistas de divulgação científica Título Ano Tiragem Distribuição Superinteressante 1987 343 mil Venda / Assinatura Ciência Hoje Crianças 2000 200 mil Venda / Institucional Galileu 1993 165 mil Venda / Assinatura National Geographic Brasil 2003 68 mil Venda / Assinatura Scientific American 2002 60 mil Venda / Assinatura Mundo Estranho 2001 50 mil Venda / Assinatura Pesquisa Fapesp 1999 44 mil Venda / Assin / Instit. Ciência e Cultura 1949 25 mil Venda / Institucional Ciência Hoje 1982 15 mil Venda / Institucional (ANER, 2008)

Dinâmica de público no JC Pesquisa Eventos Correspondência Promoções Público Cativo Segmento do Público Efetivo que colabora, comenta, critica, sugere e participa da publicação Dinâmica de público no JC Pesquisa Eventos Correspondência Promoções Serviços Público Efetivo Grupo de leitores, espectadores e ‘usuários’ que freqüentam a publicação Público Alvo Segmento do Público Atento conhecido, visado e tomado por referência Público Atento Estudantes de pós-graduação Professores e pesquisadores Gestores de ciência e educação Profissionais especializados Público Interssado Estudantes e curiosos Profissionais da educação Profissionais de nível superior (Adaptado: MILLER, John, 1986)

Alimentos transgênicos Parte 2 Alimentos transgênicos Folha de S. Paulo, Mais!, 08/08/1999

Pesquisa aplicada Instituição Método Semântica e Retórica ECA USP, São Paulo, Jornalismo Programa de Mestrado, 2000-2003 Método Mensuração estatística Análise de discurso Semântica e Retórica

Amostra Jornais Folha de S. Paulo O Estado de S. Paulo Período Corpus 718 textos

Mensuração estatística Parâmetros de aferição Ocorrência de matérias e termo-pivô Distribuição cronológica e editorial Número de fontes de informação Especialidade das fontes citadas Abrangência temática do noticiário Enfoques temáticos preferenciais

SBPC. Reunião Anual

Análise do discurso Reformulação terminológica Transposição narrativa Substituição vocabular Definições e paráfrases Transposição narrativa Caracterização de processos Referência da informação Retórica de argumentação Concepções de valor Posicionamento opinativo

Recursos de reformulação terminológica Dupla denominação: substituição de termos científicos por expressões popularizadas, com denominação correlata na linguagem comum (de sinônimos a metáforas).

Recursos de reformulação terminológica Co-referência: emprego de uma expressão equivalente ao termo-pivô para evitar repetições

Recursos de reformulação terminológica Paráfrase: explicação do termo-pivô por meio do emprego imediato de uma sentença que lhe seja semanticamente equivalente ou similar

Recursos de reformulação terminológica Definição: expressão do significado do termo-pivô

Signo versus significado Reformulação terminológica pressupõe concepção sobre o significado do termo-pivô Dupla-denominação e co-referência: no máximo, relação de similitude semântica Definições e paráfrases: similaridade ou até equivalência, em determinados contextos Sua aplicação não garante a transposição do obstáculo lingüístico da divulgação científica Contraste entre referência científica e enunciado jornalístico para avaliar o rigor conceitual

O que é um transgênico? Fontes consultadas: Dicionários científicos Legislação brasileira Pesquisadores especialistas Propriedade necessária: ter em seu genoma um fragmento de DNA manipulado por técnicas de recombinação Pressuposto: Todo transgênico é um OGM, mas nem todo OGM é, necessariamente, transgênico (hiperônimos)

Confusão?

Contradição?

Categorias de definições encontradas Expressões que enfatizam o método de modificação genética, ainda que tal método não seja satisfatoriamente definido

Categorias de definições encontradas 2. Expressões referentes aos resultados ou efeitos visados pelo processo de modificação genética. Propriedades suficientes, mas não necessárias para definir transgênicos

Categorias de definições encontradas 3. Expressões que enfatizam a possibilidade de intercâmbio genético entre espécies distintas por meio de transgênese. Propriedades suficientes, mas não necessárias para definir transgênicos

Categorias de definições encontradas 4. Expressões que enfatizam a natureza dos produtos – o fato de serem geneticamente modificados – e não o método ou os efeitos específicos da modificação. Propriedade insuficiente para definir transgênicos

Resultado da análise semântica

Alimento o quê? Produto derivado de transgênico, mas isento de gene modificado. Exemplo: óleo, margarina ou frutose produzidos a partir de milho transgênico. Alimento formulado com ingrediente transgênico. Exemplo: salsicha de soja transgênica. (Ver percentual do ingrediente na composição). Organismo vivo ou morto geneticamente modificado ou que contenha derivado de transgênico em escala de até 100%. Exemplo: grãos, farinha, fubá ou pipoca de milho transgênico. Organismo vivo transgênico. Exemplo: batata transgênica crua, semente de milho ou soja transgênicos Fonte: Palestra de CARVALHO, L.E. (UFRJ) durante a 49a Jornada Farmacêutica da Unesp em Araraquara

Transposição narrativa

Elementos narrativos Referenciar processos, resultados e desdobramentos da atividade científica Caracterização de contexto, personagens, tempo, espaço e ações (clímax e desfecho) Menos formalismo e abstração (distanciamento); mais concretude e observação (aproximação) Condicionamento pelo estilo de edição, perfil do público-alvo e habilidade editorial

Pirâmide invertida Estrutura textual em ordem decrescente de importância das informações Resultado ou clímax Referência ou fonte Detalhes e circunstâncias Críticas e implicações

Uso de estereótipos Apelo ou atração sensacional que cria, de modo mais ou menos arbitrário, uma imagem simbólica caricata de elementos associados à atividade científica ou aos seus resultados Tradução livre: “Espero que não tenha nada geneticamente modificado nisso”

Uso de infográficos

Uso de analogias Superposição de processos científicos com fatos comuns

Dramatização

Confiabilidade e referenciação Confiabilidade de enunciados científicos não é dada a priori por seu status ou autoridade Considerar as condições e circunstâncias específicas de aquisição de informações científicas. Explicitar os processos de pesquisa vinculados aos resultados divulgados Explicitar as variáveis sociológicas e metodológicas que fundamentam esse conhecimento

Carl Sagan, “O mundo assombrado pelos demônios”, p.37

Argumentos de autoridade Recurso de personalização desloca a referência para a credibilidade individual do sujeito, restando em plano secundário as variáveis metodológicas especificamente ligadas ao experimento ou tema em questão

Resultado da análise narrativa

Retórica de argumentação

Concepções valorativas Progresso Aumento de produtividade das lavouras Enriquecimento nutricional dos alimentos Redução no uso de agrotóxicos Avanço tecnológico Combate à fome Precaução Concentração e domínio empresarial Possibilidade de aplicações indesejáveis Inconclusividade dos testes de biossegurança Perda de biodiversidade Riscos desconhecidos ao meio ambiente e à saúde

Hugh Lacey. “Valores e atividade científica”, p.13, 14.

A racionalidade de cada um...

Síntese dos resultados Contradições na caracterização dos transgênicos, com formas conflitantes de definir esses produtos a partir de suas propriedades características. Falta de referência narrativas sobre os aspectos sociais e metodológicos que condicionam a confiabilidade do conhecimento Permanência do desafio de mediação crítica em relação às estratégias de comunicação tecnocrática e militante ideológica

O que houve, afinal? Na informação: transgênicos são freqüentemente caracterizados de forma genérica, sem as especificidades de cada variedade ou dos interesses associados a suas aplicações Na opinião: tendência a privilegiar embates especulativos dos agentes interessados no tema, em detrimento de exame crítico e interpretativo de suas questões mais complexas

E ainda... Imprensa refletiu uma polêmica que tende a levar a opinião pública a adotar posições absolutas – contra ou a favor. Tais posições apreciam a tecnologia em si mesma e não os propósitos e riscos de cada programa de emprego da tecnologia Informações científicas e contextuais devem ser associadas para que o leitor entenda o que são transgênicos e possa avaliar suas implicações

Obrigado! Francisco R. Belda belda@usp.br (16) 3303.3345 (16) 8116.3160