Prof. José Luis Oreiro Departamento de Economia – UnB

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Transcrição da apresentação:

Liberalização do Mercado de Capitais e Performance Macroeconômica da América Latina Prof. José Luis Oreiro Departamento de Economia – UnB Pesquisador Nível I do CNPq.

Referência Frenkel, R. (2002). “Capital Market Liberalization and Economic Performance in Latin America”

Idéias Fundamentais As reformas financeiras da América Latina não foram iniciativas isoladas de política, mas foram implementadas como componentes do Consenso de Washington e em concomitância aos programadas de estabilização macroeconômica. Regimes de câmbio fixo foram um ingrediente importante dos programas de estabilização. As reformas financeiras coincidiram com períodos de boom nos mercados internacionais de capitais. Desde a primeira metade da década de 1970 tem ocorrido uma tendência global à liberalização financeira e um crescimento paralelo dos fluxos internacionais de capitais para a América Latina e demais países em desenvolvimento. Essas duas tendências foram interrompidas na década de 1980 pela crise da dívida externa. Ao longo dessa década os mercados de capitais da América Latina ficaram isolados do resto do mundo. Crise da dívida: o controle sobre o “peso da dívida” e as crises financeiras assumem prioridade absoluta e o desenho dos mercados financeiros é subordinado à esse objetivo (nacionalização do sistema bancário no México, refinanciamento dos débitos privados na Argentina, bailout do sistema financeiro no Chile). Reintrodução dos controles cambiais para impedir a fuga de capitais, regulação da taxa de juros para facilitar a gestão da crise financeira.

Idéias ... Nas maiores economias da região a performance macroeconômica se caracterizou por uma sequência de tentativas e fracassos para a estabilização macroeconômica. Os planos de estabilização procuravam atender três objetivos conflitivos: atender aos serviços da dívida externa, reduzir a taxa de inflação e recuperar a taxa de crescimento. Com o “plano Brady” a restrição externa deixou de ser “binding” e os países da América Latina puderam fazer uma segunda onda de liberalização financeira na década de 1990. Essa onda atingiu os países da América Latina num contexto em que havia um pequeno grau de monetização e de aprofundamento financeiro dessas economias, o sistema bancário era pouco desenvolvido e o crédito para o setor privado era escasso.

Idéias ... Três condições fizeram com que o sistema financeiro da América Latina fosse incapaz de alocar de forma eficiente essa grande injeção de recursos : Pressão para a apreciação da taxa de câmbio. Altas taxas de expansão do crédito durante a fase de ingresso de capitais. Bolhas nos preços dos ativos reais; efeitos esses que foram amplificados em função dos regimes de câmbio fixo.

Objetivos Avaliar a sustentabilidade do crescimento dos países da América Latina após a liberalização do mercado de capitais nos anos 1990. Avaliar a qualidade do seu padrão de crescimento, a qual é definida em termos de suas características de emprego e de distribuição de renda.

A experiência de liberalização da década de 1970 Esta análise está centrada no estudo de caso das economias do Chile e da Argentina na década de 1970. As ditaduras militares do Chile e da Argentina adotam planos de estabilização similares. Eliminação dos controles de preços, arrocho salarial e desvalorização da taxa de câmbio. Adoção de um regime cambial do tipo “crawling-peg”. Ajuste fiscal baseado na contração dos gastos salariais do setor público. No início da década de 1970 os mercados financeiros de ambas as economias estavam isolados do resto do mundo, a dívida externa era baixa e o balanço de pagamentos estava equilibrado. Na segunda metade dessa década esses países adotam liberalização dos mercados de câmbio, desregulamentação dos fluxos de capitais, liberalização comercial e política anti-inflacionária baseadas na taxa de câmbio (tablitas)

Efeitos da Liberalização Fluxos maciços de capitais e acumulação de reservas, taxas elevadas de expansão da moeda e do crédito. Forte expansão da demanda doméstica, liderada pelo consumo, e emergência de bolhas nos mercados financeiros e reais. Apreciação contínua da taxa real de câmbio levando ao aumento sistemático dos déficits em conta corrente e da dívida externa. O regime cambial entra em colapso na Argentina em 1981 e no Chile em 1982. Isso ocorreu antes da moratória do México em 1982.

Comparação entre os casos Argentino e Chileno Comparação da performance desses países com os países que entraram em crise tendo adotado outro arcabouço de política econômica. Na primeira metade dos anos 1980 o PIB do Chile e da Argentina se contraiu mais do que o do México e do Brasil e mais do que a média da América Latina. O crescimento anterior ao choque externo era sustentável ou a dinâmica macroeconômica local já mostrava sinais de instabilidade? “In fact, both countries show strong evidence of na endogenous cycle with a turning point and contraction phase that emerged independently of the evolution of the international rate of interest” (p.262)

Fatos Estilizados do Ciclo Financeiro do Cone Sul Abertura da conta de capitais e liberalização comercial seguida por pré-determinação da taxa nominal de câmbio: apreciação do câmbio real. Entrada de capitais externos induzindo a expansão da moeda e do crédito. Surgem bolhas nos ativos reais. O incremento das importações gerado pela expansão da demanda doméstica, apreciação do câmbio e abertura comercial aumenta o déficit comercial. Como no início as entradas de capitais superam os déficits em conta corrente, ocorre acumulação de reservas o que induz a nova expansão monetária. Em algum momento, o déficit em conta-corrente supera a entrada de capitais e as reservas começam a cair. Ocorre um aumento do risco cambial e do risco financeiro, levando a um aumento da taxa de juros doméstica. Alguns episódios de iliquidez e insolvência começam a aparecer, aumentando o risco financeiro Em algum momento, ocorre uma corrida contra as reservas do banco central, levando ao colapso do regime de câmbio.

Lições da Crise O aumento da taxa internacional de juros teve um impacto relativamente pequeno na dinâmico macroeconômica do cone sul. O déficit fiscal e o risco moral tiveram um impacto relativamente pequeno na crise. O Chile tinha superávit fiscal e as garantias de depósito tinham sido eliminadas. O fator desestabilizador mais importante era a natureza rudimentar do sistema financeiro e a fraqueza da supervisão bancária.

A experiência da década de 1990 Na década de 1980, a América Latina foi confrontada com a tarefa de conciliar os pagamentos devidos ao serviço da dívida externa com a preservação do equilíbrio macroeconômico, tanto externo como fiscal. Ajuste impossível: fazer frente aos serviços da dívida exigiriam depreciação cambial para estimular as exportações, mas isso aumentaria o valor em moeda doméstica dos serviços da dívida externa e aumentaria a taxa de inflação, o que aprofundava o desajuste fiscal tanto pelo lado das receitas como pelo lado das despesas. Na década de 1990, o relaxamento da restrição externa permitiu não só o aumento da absorção doméstica como uma rápida acumulação de reservas. Aceleração do crescimento e apreciação do câmbio levaram a redução da inflação e melhoria do déficit fiscal

Fluxos de capital, apreciação do câmbio e fragilidade externa No período 1991-1993 o fluxo líquido de entrada de capitais para a América Latina foi de US$ 166 bilhões ao passo que os déficits em conta corrente somaram 98 bilhões. Distribuição de recursos: México: 75 bi Argentina: 29 bi Brasil: 20 bi Chile: 8 bi

Fluxos ... Todos esses países tiveram apreciação da taxa real de câmbio, mas a magnitude da mesma diferiu entre eles. Maiores apreciações: México e Argentina Menores apreciações: Colômbia e Chile. Evolução diferenciada das taxas de câmbio estava associada às diferentes políticas macroeconômicas adotadas por cada país. México e Argentina implementaram políticas de estabilização baseadas em mercados de capitais desregulados (CK aberta); taxa de câmbio fixa e atitude passiva com relação aos fluxos de capitais. Colômbia, Chile e Brasil (até 1994) incluiram metas de taxa de câmbio para as suas políticas cambial, monetária e fiscal. A região observou uma tendência ao crescimento do déficit em conta corrente, em função da aceleração da taxa de crescimento das importações (que passou de 10.3% na segunda metade da década de 1980 para 16.1% a.a. nos anos 1990) e uma redução da taxa de crescimento das importações. Em 1993 a relação déficit em conta-corrente/exportações era de 27,5%, viesada, contudo, pelo resultado brasileiro, praticamente equilibrado.

O Turning point em 1994 No final de 1993, o México e a Argentina eram as economias da região que possuiam os piores indicadores de fragilidade externa. Fevereiro de 1994: o Fed começa um ciclo de elevação das taxas de juros de curto-termo, o qual derruba os preços dos títulos de longo-prazo e aumenta a taxa de juros de longo-prazo. O aumento das taxas de juros de longo-prazo produziu um aumento do prêmio de risco sobre os títulos emitidos por esses países, principalmente os do México e da Argentina. Os investidores internacionais perceberam um aumento da fragilidade externa como resultado do aumento da taxa de juros internacional. O aumento dos prêmios de risco foi seguido por uma redução dos fluxos de capitais para a região, principalmente para a Argentina e para o México.

O turning point México: Argentina: 1993: 1994: Déficit em conta-corrente: 23.5 bi Fluxo líquido de capitais: 30 bi 1994: Déficit em conta-corrente: 30.6 bi Fluxo líquido de capitais: 10 bi Argentina: Déficit em conta-corrente: 7.5 bi Déficit em conta-corrente: 11 bi

O Turning point Em 1994 ambos os países começaram a ter perdas de reservas. Na Argentina, devido ao currency board, a perda de reservas levou a contração monetária. A desvalorização cambial do México gerou uma forte saída de capitais da Argentina (efeito Tequila). Ambos os países enfrentaram uma queda acentuada de PIB : 6,6% no México (1995) e 4,6% na Argentina.

Comparação das Experiências das décadas de 1970 e 1990 A experiência latino-americana dos anos 90 foi muito parecida com a dos anos 70: os efeitos combinados da liberalização dos mercados financeiros, entrada maciça de capitais, abertura econômica e comercial e apreciação cambial geraram fragilidade financeira (interna e externa) crescente. Na análise da experiência dos anos 90 ficou claro o papel da elevação das taxas internacionais de juros como o fator que determinou a crise no México e na Argentina. Esse incremento não é, contudo, comparável em magnitude e duração ao de 1979. A incidência sobre a fragilidade financeira assumiu formas diferenciadas devido a existência de mecanismos de financiamento externo distintos. Nos anos 70 o financiamento externo se dava por intermédio de empréstimos à taxas de juros livres, de forma que um choque de juros gerava imediatamente um aumento do déficit em conta corrente. Já na década de 1990, o financiamento externo se dava por intermédio da venda de títulos nos mercados internacionais, logo um choque de juros levaria a uma redução dos fluxos de capitais e um aumento do prêmio de risco.

Comparação ... Por que razão o México e a Argentina tiveram uma performance macroeconômica pior do que a dos demais países da América Latina? Diferenças importantes no “modelo macroeconômico”, principalmente no que se refere a política cambial. Diferenças importantes quanto ao grau de abertura da conta de capitais.

Diagnósticos e Remédios Há um grande consenso entre os economistas de que a abertura irrestrita da conta de capitais em conjunto com a perda de “metas reais” para a política macroeconômica geraram perda de competitividade, fragilidade externa e redução do crescimento na América Latina nos anos 1990. A visão dominante, contudo, atribuiu esses problemas ao estado incompleto das reformas liberalizantes. Mais reformas são necessárias, notadamente na legislação trabalhista (redução da rigidez institucional do mercado de trabalho). Visão alternativa: política macroeconômica com foco em “metas reais”.