Caso Clínico de Cardiologia Tetralogia de Fallot Escola Suerior de Ciências da Saúde-Internato-Saúde da Criança-HRAS/HMIB Rafael Pacelli Samy Sardinha Coordenação: Antonella A. Nascimento www.paulomargotto.com.br Brasília, 25 de abril de 2013 Ddos Pacelli e Samy
Identificação Nome: AGS, Idade: 8 meses, Peso: 5,7kg, Nascida em Brasília, procedente de Santo Antônio do Descoberto.
HDA Mãe refere que há 5 dias da admissão abriu quadro de tosse cheia, dispnéia, sibilância e febre não aferida; Chegou ao PS - HMIB apresentando dispnéia moderada, cianose labial e de extremidades, sibilância e tosse com expectoração hialina; Mãe nega febre, náuseas, vômitos e diarréia. Aceitando parcialmente a dieta oral para idade;
Exame Físico REG, taquidispnéica, cianose labial e de extremidades, hidratada, corada, anictérica, afebril, ativa; FC: 138 bpm, FR: 78 irpm. SO2: 78% em ar ambiente; AR: MVF + em AHT, presença de roncos, creptos e sibilos difusos. Apresentando sinais de desconforto respiratório; ACV: RCR, ausculta de 2°bulha única, sopro sistólico 3+/4+ na borda esternal esquerda, na altura do 3° e 4° espaço intercostal; Sopro contínuo em HTD;
Exame Físico ABD: semigloboso, normotenso, RHA +, indolor à palpação, sem massas ou visceromegalias palpáveis. Traube livre; Ext: regular perfusão de extremidades, sem edemas. Presença de discreto baqueteamento digital; SNC: sem sinais de irritação meníngeos; Bom turgor de pele, olhos brilhantes e saliva fluida; Hipodesenvolvimento pôndero-estatural;
Antecedentes Gestacionais Mãe realizou pré-natal, iniciado no 1º trimestre: 10 consultas; Refere ITU no 1º e 3º Trimestre; Fez uso de álcool no final da gestação e 6 cigarros/dia; Sorologias da gestação: HIV negativo 1°, 3°T e pós parto; VDRL NR 1° e 3°T; Hep B negativo 1º T; Toxo negativo 1º T.
Antecedentes Neonatais Nascida de parto normal, a termo (39semanas) Peso ao nascimento: 2940g Comprimento: 48,5 cm PC: 32cm Apgar: 8/9 Alta com 24h de vida Evoluiu com cianose após 1 mês de vida;
Antecedentes Fisiológicos Vacinação atualizada; DNPM adequado. Segue em aleitamento materno artificial, em uso de NAN 1 - 80 ml de 3/3h;
Antecedentes Patológicos Recebeu diagnóstico com 1 mês de idade, de cardiopatia cianótica: Tetralogia de Fallot + CIA tipo ostium secundum ( Pentalogia de Fallot); Realizou correção cirúrgica paliativa no ICDF com 3 meses de idade, procedimento Blalock- Taussig; Recebeu alta com AAS, espironolactona e furosemida medicações que faz uso no momento; Saturação basal: 84% em ar ambiente;
Antecedentes familiares Mãe, 16 anos, tabagista; Pai, 18 anos, mãe não sabe informar antecedentes; Na família materna há história de vitiligo, PNM, Diabetes Mellitus e cardiopatia (não sabe informar qual);
Hábitos de vida Reside em casa de alvenaria com 5 cômodos, onde moram 7 pessoas, em local com água de poço e esgoto encanado; Tabagismo passivo (mãe tabagista); Refere cães no quintal da residência; Não frequenta creche;
Hipóteses Diagnósticas
Hipótese Diagnóstica Crise hipóxica da Tetralogia de Fallot, por obstrução do BT? ICC por BT hiperfuncionante? Pneumonia? Sibilância? Miocardite viral?
Exames complementares ?
HEMOGRAMA COMPLETO Material: Sangue ***** Eritrograma ***** Hemácias: 4,64 x106/uL (3,90 - 5,30) VCM: 87,7 fl (75,0 - 80,0) Hemoglobina: 13,1 g/dL (11,5 - 13,5) HCM: 28,2 pg (28,0 - 30,0) Hematócrito: 40,7 % (28,0 - 40,0) CHCM: 32,2 g/dL (33,0 - 37,0) RDW: 17,1 % (12,0 - 17,0) ***** Leucograma ***** Leucócitos: 9,8 x103/uL 103/uL (6,5 - 18,0) Neutrófilos Totais: 36,0 % (25,0 - 45,0) 3,5 (1,6 - 8,5) Promielócitos: 0,0 % 0,0 Mielócitos: 0,0 % (0,0 - 0,0) 0,0 (0,0 - 0,0) Metamielócitos: 0,0 % (0,0 - 0,0) 0,0 (0,0 - 0,0) Bastonetes: 3,0 % (0,0 - 5,0) 0,3 (0,0 - 0,9) Segmentados: 33,0 % (25,0 - 40,0) 3,2 (1,6 - 7,6) Eosinófilos: 0,0 % (1,0 - 5,0) 0,0 (0,0 - 0,9) Basofilos: 0,0 % (0,0 - 3,0) 0,0 (0,0 - 0,4) Monocitos: 11,0 % (2,0 - 10,0) 1,1 (0,1 - 1,8) Linfocitos: 53,0 % (50,0 - 80,0) 5,2 (3,0 - 14,0) Plaquetas: 332 x103/uL (150 - 450) Método: Automatizado e Análise Microscópica
Bioquímica CREATININA: 0,40 mg/dL POTÁSSIO: 6,00 mEq/L SÓDIO: 136,0 mEq/L URÉIA: 26,0 mg/dL VHS: 17 mm/hora
Sorologias Parvovirus B19 - Anticorpos IgG ------------------ NR Rubeola, Anticorpos IgG ------------------ NR Rubeola, Anticorpos IgM ------------------ NR Sarampo - Anticorpos IgG ------------------ NR Sarampo - Anticorpos IgM ------------------ NR
Radiografia de Tórax
Ecocardiograma Figura 1. Ecocardiograma mostra imagem TF, com CIV e obstrução subvalvar pulmonar.
Prescrição Dieta oral para a idade HV Holliday 60% O2 sob cateter nasal 2L/min Penicilina Cristalina 210.000UI/Kg/dia EV 4/4h Salbutamol 3 jatos 6/6h Predinisolona 1,5mg/kg/dia Espironolactona 1,75mg/kg/dia 12/12h Furosemida 2,8mg/kg/dia 12/12 h AAS 5,3mg/kg/dia Dipirona SOS Apresentou melhora parcial do quadro agudo e foi internada na ala A.
Tetralogia de Fallot
Epidemiologia Foi descrita por Etienne-Louis Fallot em 1888; tem etiologia desconhecida, mas possui frequência igual em ambos os sexos; A T4F representa cerca de 10% de todas as cardiopatias congênitas, sendo a mais frequente na infância; É a cardiopatia cianótica que permite maior sobrevivência até a idade adulta e, portanto, a mais encontrada nessa população; Nos dias de hoje, contrariando os altos índices de mortalidade dos anos 1950, apresenta bons resultados cirúrgicos, permitindo ao paciente uma qualidade de vida social e laborativa ativas;
Anatomia CIV Dextroposição aórtica Hipertrofia de VD Estenose pulmonar infundíbulo – ânulo-valvar. Valva Pulmonar Bicúspide. Estenose supra-valvar * CIA – Pentalogia de Fallot Obs: 25% das T4F tem arco aórtico à direita 23
Etiofisiopatogenia Durante o desenvolvimento embriológico, ocorre uma anteriorização do septo infundibular, levando a um estreitamento do infundíbulo do VD e consequente obstrução subvalvar pulmonar. Daí se forma uma comunicação interventricular de mal alinhamento (CIV), com acavalgamento da aorta sobre o septo, e o desenvolvimento de hipertrofia ventricular direita. Como a CIV é ampla, as pressões à direita e esquerda são iguais e ambos os ventrículos esvaziam na aorta simultaneamente.
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Etiofisiopatogenia O fluxo pulmonar tende a ser menor, de acordo com o desvio, variando em diferentes graus e, por este motivo, o paciente vai se apresentar mais ou menos sintomático; Com o crescimento e a realização de atividade física, a saturação de O2 tende a cair, podendo ocorrer crises cianóticas por hipóxia; Os níveis de Hb e de Ht tendem a subir como mecanismo de compensação, causando aumento da viscosidade sanguínea e alteração dos fatores de coagulação; Podem ocorrer eventos isquêmicos cerebrais, ou em outros sítios, levando a sequelas indesejáveis;
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Exame físico Cianose variável. Pink Fallot (estenose infundibular leve e predomina shunt Esquerda Direita pela CIV) Baqueteamento digital Posição de cócoras Frêmito sistólico Impulsão de VD 2º Bulha cardíaca única Sopro sistólico na borda esternal esquerda, na altura do 3° e 4° espaço intercostal 29
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Descrita em 1888 por Etienne Louis Arthur Fallot Descrita em 1888 por Etienne Louis Arthur Fallot. O epônimo foi proposto em 1924 por Maude Abbot.Cardiopatia Congênita Cianótica HFP. É a CCC mais comum após o 1 ano de vida. 20 a 30% apresentam anomalia extracardíaca. 2 a 3% apresentam DSAV 31
Sinais de gravidade Grau de Cianose; Crise hipoxêmica frequentes: desaparecimento do sopro durante a crise; Aorta grande; 32
Eletrocardiograma Desvio do eixo qrs para direita; BDAS(bloqueio divisional antero-superior)- Associação com DSAV( defeito de septo AV); Onda R proeminente nas derivações precordiais direitas; Sobrecarga de VD e AD; Transição rápida V1-V2; 33
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Radiografia de tórax Diminuição da Circulação Pulmonar; Área cardíaca normal, ou aumentado às custas de VD, (Ponta levantada); Arco médio escavado; Arco Aórtico à direita em 25%; Coeur em Sabot: coração em bota. Taco de Golfe, tamanco holandês; 35
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Complicações Crise hipoxêmica – mais comum dos 3 meses aos 3 anos Endocardite Infecciosa Trombose Cerebral < 2 anos Abscesso Cerebral > 2 anos Hemoptises Gota úrica Calculose de Vesícula Acne 38
Crise hipóxica da Tetralogia de Fallot
Fatores desencadeantes da crise hipoxêmica Anemia – HT < 45% Policitemia – HT > 70% Anestesia Drogas hipotensoras Infecções Contrastes iodados Exercício físico > Temperatura Altas altitudes Choro 40
Fisiopatologia: 2 teorias Espasmo do músculo infundibular Aumento na obstrução do trato de saída do VD Diminuição súbita do fluxo pulmonar Cianose 41
Fisiopatologia: teoria 2 Diminuição da Resistência Vascular Sistêmica Aumento do “shunt” direita-esquerda pela CIV Cianose
Fisiopatologia Em ambos os casos ocorre: Aumento do “shunt” D-E hipoxemia, acidose metabólica e acidose respiratória estímulo ao centro respiratório hiperpnéia aumento do retorno venoso sistêmico pela diminuição da pressão intra-torácica aumento do “shunt” D-E CICLO VICIOSO
Tratamento 1. Colocar a criança em posição genupeitoral ou lateral com os joelhos flexionados sobre o tronco, com o objetivo de aumentar a resistência vascular periférica e diminuir o retorno venoso do segmento inferior (de maior insaturação), para favorecer o redirecionamento do sangue para o território pulmonar e o segmento cefálico.
Medidas gerais na crise hipoxêmica Fletir as pernas Correção da acidose 1 MEQ/KG Bicarbonato 8,4% Oxigênioterapia 45
Terapêutica medicamentosa Morfina(vasodilatador pulmonar) 1 CC = 10 mg 0,1 mg/kg – IM; Cetamina 2mg/kg IM, aumenta a resistência vascular sistêmica Propranolol 0,05 a 1 mg/kg – EV 46
ALGORITMO DA ABORDAGEM DA CRISE DE HIPÓXIA AUMENTO SÚBITO DA CIANOSE E HIPERPNÉIA POSICIONAR O PACIENTE COM OS JOELHOS FLEXIONADOS SOBRE O TRONCO ADMINISTRAR OXIGÊNIO Se não houver melhora Revertida a crise ADMINISTRAR MORFINA OU CETAMINA (pose-se repetir a dose se necessário) Persistindo a crise CORRIGIR FATORES DESENCADEANTES E INICIAR OU AUMENTAR A DOSE DO BETABLOQUEADOR VIA ORAL ADMINISTRAR BETABLOQUEADOR ENDOVENOSO* Doses das medicações: - Morfina: 0,1 a 0,2 mg/kg SC ou IM - Cetamina: 2 mg/kg IM - Propanolol IV: dose máxima 0,1 mg/kg, fazer metade da dose em bolus e o restante em 10 a 15 minutos se a crise persistir - Propranolol VO: dose inicial de 1 a 2 mg/kg/dia, dose máxima 6 mg/kg/dia 2 ou 3 doses - Bicarbonato: dose empírica 1 a 2 mEq/kg (1:1 em água destilada) em bolus Crise muito prolongada FAZER CORREÇÃO EMPÍRICA DA ACIDOSE METABÓLICA COM BICARBONATO DE SÓDIO Sem melhora USAR VASOCONSTRICTOR ENDOVENOSO PENSAR NA NECESSIDADE DE INTUBAÇÃO OROTRAQUEAL E VENTILAÇÃO MECÂNICA ENCAMINHAR PARA CIRURGIA * Na ausência da droga EV, utilizar VO se quadro clínico permitir
Prevenção Uso de medicamentos preventivos de crise: O mais utilizado é o propanolol. A dose inicial é de 1 a 2 mg/kg/dia, administrada em duas ou três tomadas por via oral, podendo-se contudo, de acordo com a necessidade, aumentar até 6 mg/kg/dia. Evitar exercícios físicos extenuantes, febre, choro prolongado, desidratação e constipação intestinal. Combate precoce à infecções que acometem as vias aéreas superiores e às broncopneumonias, assim como otites e infecções urinárias. Prevenção e correção da anemia. O hematócrito no grupo de cardiopatias cianóticas deve ser mantido em torno de 45%.
Tratamento cirúrgico Paliativo: menores de 6 meses ou má anatomia Potts Blalock Taussig Waterson Cooley Definitivo: após 6 meses - pode ser feita em adultos; boa evolução a longo prazo; - Complicações Tardias: Disfunção da Valva Pulmonar Disfunção do VD Arritmias 49
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BT modificado TBC-APD 53
Cirurgia Definitiva 54
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Obrigado!
Bibliografia Iwahashi ER, Cavalini JF. Capítulo 9 – Crise Hipoxêmica ou de Cianose. Em Cardiologia em Pediatria: Temas Fundamentais. Editora Roca LTDA, 1ª Edição: 213 - 221; 2000. Riemenschneider TA, Gutgesell HP. Chapter 21 – Tetralogy of Fallot. Em Clinical Synopsis of Moss and Adams´ Heart Disease in Infants, Children, and Adolescents Including the Fetus and Young Adult. Williams and Wilkins 1st Edition: 409 - 434; 1998. Park MK. Chapter 14 – Cyanotic Congenital Heart Defects. Em Pediatric Cardiology for Practitioners. Mosby 4rd Edition: 193-194; 2002. Santana MVT. Chapter 10 – Crises Hipoxêmicas. Em Cardipatias Congênitas do Recém-nascido. Editora Atheneu, 1ª Edição.: 115 - 122; 2000. Garson A. Chapter 60 – The Science and Practice of Pediatric Cardiology. Williams and Wilkins. 2nd Edition: 1389 -1390, 1400; 1998.
Ddo Samy Sardinha, Dra. Antonella A. Nascimento, Ddo Rafael Pacelli OBRIGADO! Ddo Samy Sardinha, Dra. Antonella A. Nascimento, Ddo Rafael Pacelli e Dr.Paulo R. Margotto
Nota do Editor do site, Dr. Paulo R. Margotto Consultem também: Distúrbios cardiológicos Autor(es): Elysio Moraes Garcia Propanolol endovenoso: Em situações emergenciais, usar endo venoso: Metroprolol (SelokenR):0,1-0,2mg/kg e 2x com aumento progressivo até 0,9mg/kg/dia. Apresentação: ampola de 5 ml com 5mg.